Por Amanda Munhoz, José Luis Costa e Leonardo Oliveira
Viagens do Inter na gestão Vitorio Piffero estão na mira do Ministério Público. A investigação aponta depósitos da agência de viagens Piratini na conta do ex-vice de finanças Pedro Affatato entre agosto e dezembro de 2016, que somados chegam a R$ 169 mil. O primeiro, no dia 23 de agosto, foi o maior, de R$ 56 mil. Seguiram-se repasses mensais: R$ 29 mil em setembro, R$ 17 mil em outubro, R$ 17 mil e R$ 18 mil em novembro e um último de R$ 32 mil no dia 16 de dezembro, cinco dias depois do jogo que marcou a queda do Inter para a Segunda Divisão.
A Piratini passou a cuidar dos deslocamentos do clube em maio de 2015, cinco meses depois de os novos dirigentes assumirem a administração, e já mantinha uma relação comercial com a Rodoseg, empresa de Affatato.
A investigação aponta também valores "aparentemente superfaturados", conforme o MP, na compra de passagens aéreas. Duas delas, com destino para Xangai, na China, adquiridas em agosto de 2016, custaram cada uma R$ 47.293,14 (US$ 14.695,07 na cotação da época).
Orçamento feito nesta sexta-feira (19) por GaúchaZH, com a empresa aérea KLM, a mesma que emitiu as passagens citadas na investigação, indica que embarcar na segunda-feira (21) para o mesmo destino custaria R$ 33.954,13 (US$ 8.756). Em ambas, a cotação foi de assento na classe executiva e obedeceu ao mesmo roteiro, com conexões em Amsterdã, na ida, e em Paris, na volta.
Uma segunda cotação, feita diretamente com a Piratini, aponta valores abaixo dos pagos em agosto de 2016. Segundo a agência, cumprindo o mesmo roteiro e usando a mesma companhia aérea, sairia por R$ 29.662,52 (US$ 7.910).
As notas fiscais dessas passagens emitidas pela Piratini e anexadas pelo MP em sua investigação foram avalizadas com a assinatura de Affatato. Dias depois dessa viagem para a Europa, o MP detectou o início das transferências feitas pela agência para a conta pessoal do dirigente. Conforme o relatório dos promotores, as transferências configuram um acerto "delituoso" entre as partes: "Não haveria, pois, qualquer motivo, lícito pelo menos, que justificasse tais repasses realizados pela Piratini Agência de Viagens para Pedro Antônio Affatato, na forma como ocorreram, em franca relação com os pagamentos efetuados pelo Sport Club Internacional para a referida agência de turismo, a não ser o desfecho financeiro de um acerto delituoso entre dirigente e a agência, em detrimento do clube".
Procurado, um dos dirigentes do Inter que fez a viagem à China afirmou que ela foi motivada pelo interesse comercial de expandir a marca do clube no país. As paradas de dois dias em Amsterdã, na ida, e de mesma duração em Paris, na volta, foram justificadas pelo desgaste de se fazer uma viagem tão longa, ainda mais que haveria uma agenda a ser cumprida em Xangai.
Na investigação, o MP aponta a inexistência de contrato escrito de prestação de serviços da agência de viagens ao Inter — assim como os promotores já haviam identificado na relação entre Affatato e as empresas de construção civil que emitiram notas para justificar supostas obras no Complexo Beira-Rio. Ouvido, um integrante do Conselho Fiscal diz que não está no regimento do clube a obrigatoriedade de confecção de um contrato para prestação de serviços. Porém, trata-se de uma norma contábil, a qual o Conselho Fiscal exige dos gestores no Beira-Rio. Na época, o presidente Vitorio Piffero foi cobrado pelo órgão da falha nesses processos. A Piratini segue cuidando das viagens do Inter, mas com contrato formal, exigido pela gestão de Marcelo Medeiros.
O MP detectou que o Inter, a partir de maio de 2015, fez reiterados pagamentos por cheques para a empresa, em um total de R$ 2.129.276,99, conforme a análise na conta bancária do clube. Esse valor é referente ao período que se estendeu até o final da gestão Piffero, em dezembro de 2016. Consultada, a empresa que atendia ao clube antes da Piratini fez um rápido levantamento dos gastos do clube com viagens entre 2011 e 2014. Os valores ficam entre R$ 1,4 milhão e R$ 2,1 milhão por ano. O que o MP aponta, no entanto, é que a Piratini, a partir da relação com o Inter, fez depósitos nas contas de Affatato.
CONTRAPONTOS
O que diz o ex-vice de finanças do Inter Pedro Affatato:
O advogado Andrei Zenkner Schmidt, defensor do ex-dirigente do Inter, disse que a defesa de Affatato não irá se manifestar publicamente. Falará apenas nos autos do processo.
O que diz Luciana Scheeren, advogada da Piratini Agência de Viagens:
"Trabalho apenas com informações que foram repassadas no dia da busca e apreensão. Não tive acesso ainda à manifestação total do Ministério Público. Os serviços prestados ao Inter foram realizados sem nenhuma ilegalidade. Toda a movimentação contábil está com o Ministério Público, para ser comprovado que a empresa não realizou nenhum tipo de repasse visando o benefício ao Internacional."