Por Amanda Munhoz, José Luis Costa e Leonardo Oliveira
As passagens de Ariel, Cláudio Winck e Réver causaram bem mais do que dor de cabeça aos colorados. E a de Alisson, muito mais do que saudade. As investigações do Ministério Público (MP) apontam para pagamentos de propinas pelos empresários envolvidos nas transações desses jogadores ao então vice de futebol Carlos Pellegrini, em valores que, somados, chegam a R$ 94 mil.
Segundo o MP apurou, os gaúchos Rogério Braun e Fernando Otto e o paulista Giuliano Bertolucci teriam abastecido a conta de Pellegrini com depósitos e transferências bancárias que variavam de R$ 5 mil a R$ 20 mil e ocorreriam dias depois de as transações serem definidas. Em um caso apurado, o pagamento ao dirigente do que é conhecido no mercado do futebol como "pedágio" foi feito antes mesmo de a negociação ser concluída.
O relatório do MP aponta que Pellegrini recebeu R$ 19 mil pela contratação do zagueiro Réver junto ao Atlético-MG em março de 2015. A transação envolveu a empresa Atividade Empreendimentos Ltda., do empresário Fernando Otto e de acordo com a investigação teve participação de Giuliano Bertolucci.
Uma relação mais estreita foi detectada, pelo MP, entre Pellegrini e Rogério Braun, intermediário na venda de Alisson para a Roma, na renovação de contrato do lateral-direito Cláudio Winck e na contratação do centroavante argentino Ariel Nahuelpán. De acordo com a apuração do MP, não há indícios de que o goleiro da Seleção Brasileira e os demais jogadores citados tenham relação com as supostas negociatas entre agentes e o dirigente.
Carlos Pellegrini assumiu como vice de futebol do Inter em janeiro de 2015, após a morte de Luiz Fernando Costa. Em 31 de julho de 2016, em meio à má campanha que resultou no rebaixamento do clube no Brasileirão, deixou o cargo. Mesmo assim, não teria parado de receber propina, conforme o MP. O esquema revelado pela investigação tem depósitos feitos nas contas do ex-dirigente colorado entre fevereiro de 2015 e dezembro de 2016.
A reportagem de GaúchaZH teve acesso a parte da investigação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MP que embasou, em 21 de dezembro, mandados de busca e apreensão em residências e empresas na Capital, em Eldorado do Sul e Viamão no âmbito da Operação Rebote, que apura os crimes de apropriação indébita, estelionato, organização criminosa, falsidade documental e lavagem de dinheiro na gestão 2016/2017 de Vitorio Piffero no Inter. Os principais alvos dos mandados foram Piffero, Pellegrini e os ex-vice-presidentes Pedro Affatato (finanças), Emídio Ferreira (patrimônio), Marcelo Castro ( jurídico) e Alexandre Limeira (administração).
Também são investigados o escritório Análise Assessoria Contábil, empresários de futebol e outras pessoas ligadas a empreiteiras que seriam empresas de fachada. Em entrevista no dia da operação, o subprocurador do MP para Assuntos Institucionais, Marcelo Dornelles, disse que a gestão do Inter em 2015 e 2016 foi praticamente uma "organização criminosa".
Entenda os casos
Segundo a investigação, em março de 2015, a empresa Atividade Empreendimentos Ltda., pertencente a Fernando Otto, recebeu R$ 266,7 mil do Inter a título de comissão por intermediar a contratação do zagueiro Réver, então no Atlético-MG. Em meio à negociação, conforme o MP, a Atividade transferiu R$ 19 mil para a conta bancária do então vice-presidente de futebol do clube, Carlos Pellegrini. Seriam três repasses, R$ 5 mil (5 de março), R$ 4 mil (25 de março) e R$ 10 mil (12 de junho). Pellegrini recebeu a primeira parcela 11 dias antes da assinatura do termo de compromisso do Inter com o atleta, firmado em 16 de março daquele ano. Leia mais.
Em fevereiro de 2016, o Inter se comprometeu em pagar R$ 666,3 mil à empresa R. Braun Esportes, Entretenimento e Marketing Eireli, de Rogério Luiz Braun, por atuar na negociação da venda do goleiro Alisson para a Roma. De acordo com o Ministério Público, seriam dois pagamentos, R$ 372,6 mil, em 26 de fevereiro, em R$ 293,7 mil, em 31 de outubro. Pellegrini teria lucrado R$ 20 mil com a transação do goleiro. Foram identificados duas transferências bancárias da R. Braun para o ex-dirigente: R$ 15 mil em 9 de novembro e R$ 5 mil um dia depois. Leia mais.
A renovação de contrato do lateral Cláudio Winck rendeu R$ 98,5 mil para a R.Braun, pagas em duas parcelas iguais entre 15 de abril e 2 de maio de 2016. Dois dias depois de receber a segunda parte do dinheiro, a R. Braun teria transferido R$ 30 mil para a conta bancária pessoal do dono da empresa, Rogério Luiz Braun. Em 5 de maio, ele teria repassado R$ 20 mil para a conta de Pellegrini. Leia mais.
A contratação do atacante argentino do Portland Timbers (EUA) para o Inter não teria participação de empresários, segundo apurou o MP. Em 20 de junho de 2016, foi assinado termo de compromisso do clube com o atleta e, uma semana depois, firmado o contrato definitivo, sem envolvimento de intermediários. Entretanto, em 22 de julho, o Inter se comprometeu a pagar comissão a R. Braun. Ficou acertado que a empresa receberia R$ 495 mil em duas parcelas, entre agosto e setembro. Mas nem os valores nem as datas se confirmaram, de acordo com o MP. Em 19 de dezembro, o Inter pagou R$ 243,7 mil para a R. Braun, que teria repassado R$ 35 mil para Pellegrini. A primeira parte, R$ 15 mil, ocorreu em 23 de dezembro, e a segunda, de R$ 20 mil, em 27 de dezembro. Leia mais.
CONTRAPONTOS
O que diz Jorge Otávio Teixeira, advogado de Carlos Pellegrini
"Afirmar que o Pellegrini recebeu valores indevidos por contratações não é verdade. Ainda estamos analisando todo o inquérito. Tudo será explicado ao MP. Estamos ao lado da investigação e queremos que tudo seja apurado. Por que não falam das boas contratações da gestão, como Marcelo Lomba, Nico López, Danilo Fernandes? Ou destes, Pellegrini não recebeu valor nenhum?"
O que diz Rogério Braun
A assessoria do empresário informou que Braun se manifestará sobre o assunto apenas perante as autoridades competentes. Em nota oficial de 28 de dezembro, afirmou que está auxiliando o MP na operação. "Ratificamos que todos os negócios realizados pela BS foram feitos dentro da mais estrita legalidade e que seus dirigentes estão à disposição para todos os esclarecimentos que se façam necessários", diz o texto.
O que diz Alexandre Wunderlich, advogado de Fernando Otto
"Todas as operações realizadas foram absolutamente regulares e todas as explicações serão fornecidas ao Ministério Público no momento oportuno."
Giuliano Bertolucci não foi localizado pela reportagem para comentar a investigação do Ministério Público.