Andrés D'Alessandro previu o futuro.
Há exatos 3.652 dias, nos primeiros momentos sob contrato com o Inter, incrivelmente, o argentino acertou o que viria pela frente. Talvez ele não pensasse que teria tanta emoção, é claro. Mas cumpriu o que falou naquela coletiva de apresentação na antiga sala de conferências do Beira-Rio, em 31 de julho de 2008.
E fez até mais: em 10 anos, passou de contratação badalada a ídolo; de argentino a gaúcho; de Cabezón a D'Ale; de estrela a capitão. Algumas frases deixam isso bastante evidente. Ainda tateando o ambiente, medindo palavras, prometeu ao microfone:
— O certo é que vou dar o máximo para ajudar o Inter a conquistar títulos.
D'Alessandro entrou em campo 411 vezes pelo Inter. Participou diretamente de 189 gols, colocando a bola na rede 88 vezes e deixando o companheiro em condições 101. Beijou 12 troféus. Foi o Rei da América. Fez parte da seleção de seis Gauchões. De duas Libertadores. Do Brasileirão.
— Ele é um obstinado em vencer. Não se contenta enquanto não está vencendo. Isso contagia os companheiros — atesta o técnico Dunga, que lhe transformou em capitão, em 2013.
Antes de ostentar a braçadeira, D'Alessandro era um meia inteligente. O capitão do Tetra lembra que não bastava dar uma instrução ao camisa 10. Era preciso explicar, mostrar a razão. Então, ele repassava as informações aos companheiros com mais inteligência. Era um meia inteligente e habilidoso. Seu pé esquerdo arredondava bolas e acertava passes, lançamentos e chutes.
Dele, saiu o escanteio que se transformou no gol do título da Sul-Americana de 2008, marcado por Nilmar. Dele, saíram gols e assistências na primeira goleada do Gre-Nal, do título gaúcho de 2009. E, por fim, na Libertadores de 2010. Seu desempenho nesse ano, aliás, foi tão brilhante que levou o prêmio Rei da América, homenagem do jornal El País, de Montevidéu, ao melhor jogador do continente.
D'Alessandro era um meia inteligente, cerebral e sanguíneo. Não se furtava de entrar num bate-boca com adversários, principalmente se vestissem azul, preto e branco. Sua estreia foi contra o Grêmio, em 13 de agosto de 2008, empate em 1 a 1 na Copa Sul-Americana (o 2 a 2 da volta classificou o Inter). Deu a última volta olímpica do Estádio Olímpico, em 2011. Entre os atletas ainda em atividade, é o maior goleador em Gre-Nal, com oito bolas nas redes. Nos clássicos e fora deles, comprou algumas brigas, levou alguns cartões vermelhos (pelo Inter, foram oito).
Inteligente, cerebral, sanguíneo e até exagerado. O excesso lhe fazia passar do limite. E a responsabilidade poderia vir com a braçadeira que Dunga lhe entregou. De fato, naquele 2013, ninguém jogou mais do que ele. Foram 58 partidas, 20 gols e 13 assistências. Nenhuma no Beira-Rio. Sua segunda casa em Porto Alegre estava em obras, e ele rodava o Estado como mandante, ora em Novo Hamburgo, ora em Caxias do Sul. Mas queria, mesmo, era reabrir o estádio remodelado.
Por isso, a história volta para aquele 31 de julho de 2008. Uma das frases de D'Alessandro:
— Me surpreendeu muito o carinho das pessoas no aeroporto e no campo também. Nunca vivi isso. Tenho muita vontade de que as coisas aconteçam bem.
Pois coube a ele ser um dos mestres de cerimônia da reinauguração do estádio. E, no dia seguinte, o autor do primeiro gol do novo Beira-Rio, na vitória sobre o Peñarol por 2 a 1.
Definitivamente, D'Alessandro já estava na história colorada. E do Rio Grande do Sul. Ganhou título de cidadão porto-alegrense. Seu filho Gonzalo, nascido na Capital, foi apresentado como "brasileiro, colorado e gaúcho".
E quando se encaminhava para mais uma temporada de disputas, desentendeu-se com dirigentes e aceitou, pela primeira vez, sair do Inter. Tentado pelo River Plate, D'Ale voltou a ser El Cabezón.
Enquanto isso, o Inter afundou. Uma campanha insegura não encontrou o líder de sempre. E sem ele por 10 meses, o time caiu.
Em 2017, D'Alessandro retornou. Rodou o país como talvez nenhum colorado tivesse pensado. Nos rincões mais afastados do Brasil, comandou a campanha de retorno do time da Série B. Agora, mesmo sem ser titular absoluto, é a primeira referência para qualquer nova contratação.
Por isso, a frase definitiva sobre D'Alessandro vem do atual técnico Odair Hellmann, outro que também recomeçou a vida no Inter em 2008:
— D'Ale é protagonista e sempre continuará sendo.