Meio ano foi suficiente para Victor Cuesta conhecer a montanha-russa do Inter 2017. Da chegada aclamada, como costuma ocorrer com jogadores que "hablam", à consolidação na liderança da Série B, o zagueiro argentino viveu a esperança (ao chegar à final do Gauchão), a frustração (ao perdê-la para o Novo Hamburgo), a revolta (nas primeiras rodadas da Segunda Divisão) e o desafogo (com o iminente retorno à elite). E passou por tudo praticamente incólume aos problemas e consagrado na reviravolta.
Como é frequente com os argentinos que vêm para o Rio Grande do Sul, o primeiro sentimento é de que Porto Alegre é parecida com Buenos Aires. Clima, culinária, hábito e trânsito aproximam as capitais. Para facilitar a adaptação, foi ser vizinho de D'Alessandro em um condomínio fechado. O capitão, aliás, é o centro do time, segundo o próprio Cuesta.
— D'Alessandro é fundamental no grupo. Ele contribuiu muito em campo, como vocês podem ver, mas é um agregador fora, internamente. Resolve problemas e só nos traz coisas positivas — diz o zagueiro, em um portunhol que tem mais portu do que nhol, em sua definição, às gargalhadas, "pior do que o de D'Alessandro, mas melhor do que o de Nico".
Foi graças a essa união promovida por D'Alessandro que Cuesta se juntou a um grupo de amigos do Inter. São jogadores que interagem, conversam, integram as famílias e cozinham. O zagueiro é quem assa o churrasco. Prefere preparar do que ir a restaurantes. Há alta rotatividade de presentes, mas os frequentadores assíduos são D'Alessandro, Nico, Uendel, Danilo Fernandes e Edenilson.
É importante mencionar Edenilson. Porque no episódio mais polêmico envolvendo Cuesta em sua aventura brasileira, o volante foi seu principal defensor. Na vitória por 2 a 0 sobre o Ceará fora de casa, o argentino foi acusado de insultar o atacante Elton com motivações racistas. Seu companheiro, negro, correu em sua defesa.
— Edenilson é meu grande amigo, é um irmão para mim. Ainda acho que foi um mal-entendido com o rapaz. Nunca tive qualquer tipo de problema — comenta Cuesta, 28 anos de idade, oito de carreira.
Naquele momento, aliás, sua frase sobre o lance viralizou: "nos xingamos, mas com respeito". Febre na Internet, a declaração deu fama ao zagueiro nas redes sociais. O bom momento do time na Série B serviu de incentivador para alimentar seus perfis, interagir com seguidores e brincar com a torcida.
E o bom momento na Série B também lhe dá esperança de retornar à seleção argentina em convocações futuras. Mas não agora. Reconhece que estar na segunda divisão dificulta.
— No ano que vem vai ser outra coisa — avisa, como quem dá um recado a Jorge Sampaoli, um fanático observador de futebol ao longo do mundo.
A seleção pode ser um desejo, mas Cuesta garante que, ao menos por agora, não pensa nela ou na Europa. Afirma estar tão feliz em Porto Alegre que "não vê seu futuro longe do Inter". Ter sido fixado entre os titulares ajuda neste aspecto. A seu lado passaram Paulão, Léo Ortiz, Danilo Silva e o mais repetido, Klaus. Com a lesão do companheiro, quem voltou (e, aparentemente, para ficar) foi Ernando. Nos bons e nos maus momentos, porém, Cuesta foi intocável.
Ainda que seja forte fisicamente e alto, 1m87cm, não faz o estilo xerifão. Tem ascendência na defesa, mas prefere o passe ao chutão, o drible ao bico para fora. Reflexo de algumas atuações como volante e, principalmente, de suas referências na defesa: Gabriel Milito, Walter Samuel e Ramiro Funes Mori.
— Gosto dos zagueiros técnicos, que tentam jogar com a bola no chão, como pede o futebol de hoje.
Essa habilidade contribui para começar os lances ofensivos e também para concluir lá na frente. Cuesta já tem três gols pelo Inter, em 32 jogos. Só não fez no sábado passado porque seu chute acertou a trave. O posicionamento na área oposta traz incômodo aos adversários.
E apesar da recente "facilidade" encontrada na Série B, acredita que seu estilo vai casar melhor no ano que vem, quando o Inter deverá estar na Primeira Divisão. A base para este raciocínio está nos exemplos que teve em 2017, na Copa do Brasil, quando enfrentou contra Corinthians e Palmeiras, duas equipes que ocupam a parte de cima da tabela do Brasileirão. Para ele, foram alguns dos melhores jogos da temporada.
Foram jogos que o Inter, segunda melhor defesa da Série B, levou gol. Mas Cuesta também costuma aparecer nos placares. Por isso, chega a hora daquela pergunta inevitável: o que é melhor, ganhar fazendo gol ou ganhar sem levar gol?
— Ganhar sem levar gol. É isso que dá confiança para a defesa.
Palavra de quem viveu a esperança e a crise, a frustração e o triunfo. Em meio ano, definitivamente, Cuesta conheceu o Inter. E foi o esteio defensivo para acabar com os substantivos negativos. Em um portunhol pior do que o de D'Alessandro, mas melhor do que o de Nico.