Luiz Carlos Silveira Martins, que morreu neste sábado (24), começou a prestar serviços ao Grêmio ainda jovem. Bem antes de ser Cacalo, o dirigente amado pelos gremistas. Entre os anos 1970 e 1980, passou pelas pastas de relações públicas e departamento jurídico. Porém, na década seguinte, um convite mudou sua vida para sempre.
No final de 1992, foi escolhido por Fábio Koff, presidente que havia levado o Tricolor ao título do Mundial de Clubes, para comandar o futebol em meio a uma até então inédita passagem pela Série B:
— Um homem de estrela, um abnegado que soube tecer relações inquebrantáveis entre jogadores, equipe técnica, dirigentes e torcedores que levaram o Grêmio a tantas e tão fantásticas conquistas — escreveu Koff sobre Cacalo em texto publicado no jornal Zero Hora na década de 1990.
A estreia de Cacalo como vice-presidente de futebol veio com o título do Gauchão de 1993, mas o melhor ainda estava por vir. Com um orçamento modesto e um comportamento sanguíneo, o dirigente montou um verdadeiro esquadrão que entrou para o imaginário do torcedor gremista. Chefiado por Felipão, o time incorporou o espírito das arquibancadas do Estádio Olímpico para enfileirar os títulos da Copa do Brasil de 1994, Libertadores de 1995, Recopa Sul-Americana e Brasileirão de 1996.
— Eu tenho, como poucas vezes se viu em futebol, uma relação de identificação muito próxima com o torcedor. Acredito na sua participação até porque o que é bom para o torcedor é bom para mim e para o clube — comentou o próprio Cacalo em uma das tantas entrevistas concedidas à época.
De fato, o comportamento do dirigente destoava dos demais no futebol brasileiro e até mesmo em Porto Alegre. Enquanto Koff aparecia como um diplomata em frente às câmeras e microfones, Cacalo assumiu para si a figura do torcedor. Eles se completavam. Entretanto, não foram poucas as vezes em que o vice-presidente de futebol mandou a liturgia do cargo para o espaço, afrontando os rivais.
— Quero agradecer ao torcedor do Inter, que gritava "fica, Cacalo". Fiquei para ver o Grêmio na frente deles! — vociferou após um clássico Gre-Nal.
A parceria rendeu tantas conquistas ao museu gremista que o destino não poderia ter sido diferente. Ao final do mandato, Fábio Koff elegeu Cacalo como seu herdeiro à cadeira presidencial: "Quem beijaria as taças com lágrimas nos olhos e amor pela camisa tricolor? Meu único e firme voto recaiu sobre um homem apenas — espero que os dos gremistas também. Vai firme, Cacalo", escreveu Koff.
Os conselheiros gremistas aceitaram a indicação. Com 177 votos, contra 109 do opositor José Alberto Guerreiro, Cacalo foi ungido como presidente para o biênio 1997-1998.
— Me surpreendi por ter enfrentado uma oposição depois do que fiz em quatro anos no Grêmio. Oposição que, imagino, tenha acabado no episódio eleitoral. Estou substituindo, quem sabe, o maior presidente da história do Grêmio, Fábio Koff — declarou Cacalo na época.
Em um misto de confiança e admiração recíproca, a parceria seguiu pelos anos seguintes. Mesmo sem cargos oficiais no clube, ambos seguiram de braços dados, em pequenas batalhas travadas no Conselho Deliberativo, bem longe dos holofotes. Em maio de 2018, quando o ídolo gremista partiu, Cacalo traduziu todo o sentimento de gratidão que sentia por aquele que lhe conduziu ao posto mais alto do clube do coração:
— Eu estou muito triste, porque eu tinha uma relação muito boa com ele. Tive, no período que estivemos juntos, uma convivência no mais alto nível. Participei de grandes conquistas e grandes vitórias. Como presidente, ele tinha uma virtude: dava autonomia para a gente trabalhar, apesar de a gente sempre prestar contas a ele. Ele sempre foi muito generoso, me tratando como um filho. É tão difícil falar numa hora dessas, porque sempre que se tem uma convivência seguida com uma pessoa como eu tive com ele, e de repente perder, é difícil.