- Quando Senna compartilhou com o amigo Galvão Bueno uma experiência com Deus;
- O narrador fala em vídeo sobre como surgiu a famosa expressão "Ayrton Senna do Brasil";
- Qual é, para Galvão, a "obra-prima" do piloto brasileiro na Fórmula 1;
- Áudio-documentário relembra momentos históricos de Ayrton Senna.
A carreira de Ayrton Senna na Fórmula 1 foi repleta de momentos marcantes e que entraram para a história do esporte. O piloto se tornou tricampeão mundial, alimentou uma rivalidade com o francês Alain Prost e se tornou o principal nome do Brasil no automobilismo, entre os anos de 1984 e 1994.
Quando ainda vivia o auge da carreira e tinha um carro competitivo para buscar o quarto título mundial, Senna sofreu um acidente com sua Williams e perdeu a vida. Ele passou reto pela curva Tamburello, no Circuito de Ímola, na Itália, após perder o controle do carro. Na batida, a barra de suspensão acabou entrando na viseira do capacete dele, perfurou o crânio e atingiu o cérebro.
Antes desse triste acontecimento para o automobilismo mundial, Senna trouxe muitas alegrias, não só para os brasileiros, mas para os amantes da velocidade espalhados pelo mundo todo. Foram 41 vitórias na F1, fora outras corridas marcantes nas quais ele mostrou toda sua genialidade.
— Ele era fixado na vitória. A competitividade dele é definida em uma frase que me falava: "Na curva só tem lugar para um carro, então é o meu. Dividiu, eu fico e o cara vai". A competitividade dele era absoluta e era muito focado — conta Galvão Bueno, em entrevista exclusiva ao programa Show dos Esportes, da Rádio Gaúcha, nesta segunda-feira (29).
O foco de Senna era nítido. O narrador, que era grande amigo do piloto, conta que em momentos de descontração, como um jantar entre amigos, Ayrton estava estudando a telemetria dos principais adversários, para saber em qual curva exatamente ele conseguiria fazer a ultrapassagem. No fim das contas, esse foco nas vitórias deu muitos resultados.
O primeiro grande momento na Toleman
A primeira equipe de Senna na Fórmula foi a Toleman — que existiu de 1981 até 1985. A escuderia britânica deu a primeira oportunidade para o jovem prodígio brasileiro. Até então sem momentos de relevância na categoria, a chegada de Senna foi de extrema importância para a equipe.
No entanto, o brasileiro não estava tão feliz: "Com esse carro eu não vou a lugar nenhum", relembra o narrador Galvão Bueno. Essa conversa entre os amigos aconteceu em 1984 ainda no início da temporada, em um momento no qual os resultados não estavam aparecendo.
— Eu falava para ele: tem que começar de algum lugar, mas ele pensava na vitória sempre. Foi com a Toleman, eu falei que tem um novo gênio na Fórmula 1. Um gigante — relembra.
No Grande Prêmio de Mônaco de 1984, abaixo de muita chuva, Senna mostrou todo seu talento em climas adversos. Ele começou a passar todo mundo.
— Passava o Lauda, o Alan Jones, não sei mais quem que era importante na época. Foi chegando no Prost, era uma questão de uma ou duas voltas, e ele conquistaria a primeira vitória dele — relata Galvão Bueno.
Foi então que entrou em cena o francês Jean-Marie Balestre, o presidente da Federação Internacional de Automobilismo (Fia) da época.
— Esse cara roubou o Ayrton duas vezes, tirou o título mundial dele e deu para o Prost em 1989. Mandou acabar a corrida (de 1984, em Mônaco) por conta da chuva. Prost em primeiro e Senna em segundo — relata.
A prova não teve 75% da sua distância completada, portanto, de acordo com as regras, a pontuação valeu pela metade. O vencedor ganhava 9 e Prost acabou ficando com 4,5 pontos. O segundo colocado recebia 6 e Senna ficou com 3.
— Se ele deixasse a corrida seguir, o Senna passaria e o Prost terminaria em segundo, ganhando 6 pontos. No fim do ano de 1984, o Prost seria campeão, porque ficou meio ponto atrás do Niki Lauda. Ele pagou o pecado do outro francês. Mas, ali eu vi, temos o cara (Senna) que vai ser o novo gênio da Fórmula 1 — relembra Galvão.
O surgimento de "Ayrton Senna do Brasil"
Em 1988, quando Senna ainda não havia vencido nenhum título. Na penúltima etapa daquela temporada, o brasileiro tinha a chance de conquistar o campeonato com uma prova de antecedência. No Circuito de Suzuka, no Japão, ele precisava terminar em primeiro para superar seu maior rival na carreira, Alain Prost.
Os dois largaram na primeira fila, com Senna em primeiro e o francês em segundo. A McLaren dominou aquele campeonato, com vitória em todas as etapas, menos no GP da Itália, em que o brasileiro acabou errando e perdeu posições, enquanto Prost não terminou a corrida.
— Eles estavam ali naquele momento com o mesmo número de vitórias. Ayrton fez a pole e na hora da largada, tem um termo que eu falo, "engasopou" o carro. Na época, não havia os computadores de hoje, então os carros iam passando embaixo na cabine de transmissão e eu tive que contar em qual posição ele estava na primeira volta. Era 17º ou 19º, não sei ao certo. Só sei que ele passou todo mundo, ganhou a corrida e o campeonato. Uma coisa inacreditável — conta Galvão Bueno.
Um dos diferenciais dessa prova foi a chuva que apareceu quando Senna mais precisava. Ainda faltava passar Prost, mas em condições normais de pista seria difícil de fazer a ultrapassagem.
— Foi nesse dia que ele disse sobre o contato direto com Deus. Foi passando todo mundo, mas ia ser muito difícil chegar no Prost para passar. Deus mandou um pouco de chuva, e a diferença no molhado entre eles era gigantesca. Senna falou que viu a imagem de Deus, sentiu a força, meteu o pé no acelerador, passou o Prost e foi campeão do mundo — relembra.
Na narração da vitória, Galvão Bueno, muito emocionado, modificou o nome de Ayrton Senna da Silva, para "Ayrton Senna do Brasil". Portanto, para o narrador, essa é a principal vitória do piloto brasileiro na carreira.
Outras vitórias marcantes para o narrador
Das 41 vitórias de Senna na F1, o narrador esteve presente em 35. A primeira delas, no Circuito de Estoril, em Portugal, foi uma das mais especiais. Em 1985, o piloto brasileiro assinou contrato com a Lotus e pretendia brigar por algumas vitórias na temporada. Na primeira etapa, no Brasil, Senna não conseguiu terminar a prova e ficou decepcionado.
No entanto, sua vontade de vencer era capaz de superar adversidades. Foi sob chuva, mais uma vez, que Senna brilhou e subiu no lugar mais alto do pódio. Após a corrida, Galvão comemorou com o amigo e falou:
— Você impossível, você não erra — disse o narrador.
— É porque você não estava dentro do meu carro, por várias vezes eu quase saí da pista — respondeu Senna.
Naquela temporada, o brasileiro ainda venceu mais uma etapa, na Bélgica, e terminou o campeonato na quarta posição.
A obra-prima de Senna
Anos depois, na McLaren e já com três títulos na carreira, Senna teve duas corridas especiais. Seu carro não era o melhor do grid em 1993, uma vez que a Williams tinha o melhor conjunto e venceu o campeonato com Prost. Mesmo assim, o brasileiro mostrou sua genialidade e conquistou cinco triunfos naquela temporada.
Uma delas foi quando subiu no lugar mais alto do pódio em Interlagos – repetindo 1991. Contudo, no GP da Europa, em Donnigton Park, na Inglaterra, o piloto realizou a obra-prima da sua carreira.
— Ele fez uma volta que não é deste planeta — afirma Galvão Bueno, narrador naquele dia. Foi a primeira melhor da história. Senna ultrapassou Michael Schumacher (Benetton), Karl Wendlinger (Sauber), Damon Hill (Williams) e Alain Prost (Williams) debaixo de chuva e em um intervalo de um minuto e meio. O triunfo foi mais marcante pelo fato dele ter dado pelo menos uma volta em todos os adversários, com exceção do segundo colocado.