Vislumbrar o futuro profissional talvez seja o maior dilema do jovem que concluiu o Ensino Médio. Idealiza-se a escolha de uma carreira permanente, o que preocupa, frustra e causa ansiedade, a ponto de ser comum e aceitável interromper um curso ou seguir outra profissão. Nesse processo, o autoconhecimento deve falar mais alto, e a orientação vocacional ajuda a compreendê-lo.
Ainda pouco difundido no Brasil, esse serviço conta com um leque de profissionais aconselhadores, em especial da Psicologia. Não é uma atividade objetiva, justamente porque tem como base o autoconhecimento da pessoa que está recebendo a orientação, sua percepção das próprias capacidades e do mercado de trabalho.
— O que gera a ligação do indivíduo com determinadas tarefas, áreas e profissões é sua construção ao longo da vida e como ele interpreta informações suas e do mundo — afirma a psicóloga orientadora de carreira Maria Célia Pacheco Lassance, fundadora da Associação Brasileira de Orientação Profissional e que trouxe a área para o Rio Grande do Sul, em especial, para a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em 1979.
Ou seja, um teste vocacional é ilusório (e defasado), já que é impossível garantir que um perfil combine com uma carreira específica. Por isso, o objetivo da orientação vocacional é mais ajudar as pessoas a tomarem decisões sobre seu futuro profissional, com autonomia, do que contribuir para a escolha do curso A ou B, conforme o psicólogo Marco Antonio Teixeira Pereira, professor e coordenador adjunto do serviço de orientação profissional da UFRGS.
Durante esse processo, a indecisão é um grande impedimento. Não há uma resolução para isso mas, sim, métodos que podem ser seguidos para facilitar a compreensão de quais são as próprias áreas de interesse: conhecer suas forças e delimitar quais quer utilizar no trabalho, pensar em possíveis profissões, conversar com profissionais das áreas e, por fim, decidir por um ou mais cursos — é interessante buscar informações sobre eles em diferentes universidades e com graduandos.
Todos esses passos são importantes, mas o contato com profissionais que atuam em áreas de interesse do estudante merece destaque, porque evidencia as práticas e desmistifica os estereótipos das carreiras, segundo a psicóloga Maria Célia Pacheco Lassance.
O que gera a ligação do indivíduo com determinadas tarefas, áreas e profissões é sua construção ao longo da vida e como ele interpreta informações suas e do mundo.
MARIA CÉLIA PACHECO LASSANCE
Fundadora da Associação Brasileira de Orientação Profissional
— O conhecimento do mercado de trabalho que o jovem tem é o de carga afetiva dos modelos que conhece e de como ele avalia esses profissionais. Quer status, quer ser a pessoa que admira — comenta.
E essa visão, geralmente, é de uma profissão convencional: psicólogo clínico, professor de física, advogado. O jovem não enxerga as inúmeras possibilidades existentes e que surgem de tempos em tempos. Por esse motivo, a conversa profunda com um profissional da sua área de interesse é tão importante: conhecer o processo de escolha de curso, como foi a faculdade, o primeiro emprego, quais tarefas da profissão gosta ou não de fazer. Portanto, caso o estudante ingresse em um curso ou almeje uma profissão somente por inspiração, pode ter um problema: não concluí-lo, justamente pela falta de reflexão e pesquisa sobre o assunto.
Fatores a considerar ao compreender os próprios interesses
- Apoio dos responsáveis
- Reconhecer quais são suas forças
- Pensar em possíveis áreas/profissões
- Conversar com alunos e profissionais das áreas de interesse
- Buscar informações junto a universidades
- Consultar um orientador vocacional
Dilema: a opção foi correta ou não?
Maria Lassance explica que, na maioria das vezes, a troca de curso é intempestiva (e um aprendizado). A reflexão — e o aconselhamento — nesse processo também são importantes, porque a falta de experiências do jovem, inclusive em relação à profissão que busca seguir, o faz acreditar que o curso não atende às expectativas. Porém, nem todas as profissões estão contempladas nos currículos.
— Na Psicologia, atendi muitos alunos que chegavam na minha sala desesperados. Gostavam do curso mas não aguentavam a parte mais filosófica e psicanalítica. Alguns foram trabalhar com estatística e outros com neuropsicologia, ou seja, atividades dentro da área mas que contemplam as forças que eles têm – conta Maria.
O mesmo problema pode surgir ao exercer uma profissão: acreditar que está na carreira errada porque não gosta de alguma tarefa. É uma questão de adaptar-se aos altos e baixos do curso ou da profissão. E as transições provavelmente vão acontecer.
Suporte na primeira grande decisão
A orientação profissional não atende apenas a estudantes do ensino regular, mas também adultos que buscam recolocação no mercado de trabalho. Experiência de vida nem sempre garante autonomia, um dos pilares do serviço de orientação. Tratando-se de jovens que estão no Ensino Médio, então, a problemática é ainda maior, levando em conta que a transição para a faculdade é, geralmente, a primeira grande decisão que precisa tomar.
Nesse processo, trabalhamos questões como “o que é o mundo profissional” e “como se preparar para uma profissão”. A intenção é fazer com que os jovens se deem conta de que escolher o curso não é escolher a profissão.
MARCO ANTONIO TEIXEIRA PEREIRA
Coordenador adjunto do serviço de orientação profissional da UFRGS
Conforme especialistas, a orientação vocacional é importante e única no que se propõe. Sites, testes, pessoas desqualificadas não cumprem esse papel. As metodologias são diversas e escolhidas pelos profissionais que as aplicam, e o trabalho de um especialista — que é bastante complexo — não pode ser substituído.
— O profissional da orientação oportuniza a informação mais viva, verdadeira, que não é aquela burocrática do currículo — destaca a psicóloga Maria Lassance.
Conforme Marco Antonio Teixeira Pereira, coordenador adjunto do serviço de orientação profissional da UFRGS, na universidade utilizam uma abordagem qualitativa — também adotada por outras instituições do país. A orientação é feita por meio de diálogo e atividades de papel e caneta, e tem como foco proporcionar reflexão.
— Nesse processo, trabalhamos questões como “o que é o mundo profissional” e “como se preparar para uma profissão”. A intenção é fazer com que os jovens se deem conta de que escolher o curso não é escolher a profissão — explica.
Onde procurar orientação vocacional
UFRGS
- Compreende as dificuldades e informa o estudante para facilitar sua escolha, focando em atividades exploratórias que promovem o autoconhecimento.
- Encontros: três em grupo, com duração de duas horas, cada. Para o atendimento individual (neste momento, com lista de espera), são de quatro a oito, dependendo da demanda do aluno, com duração de 45 minutos. Durante a pandemia, ocorrem online.
- Quanto custa: gratuito.
- Inscrição e informações no Instagram do Serviço de Orientação Profissional (SOP) UFRGS: @sopufrgs.
PUCRS
- Trabalha autoconhecimento, desenvolvimento de competências, marca pessoal, motivações e interesses. São estimulados o comportamento exploratório e a busca da compreensão acerca de diferentes carreiras.
- Consultoria: são seis encontros presenciais ou online (única modalidade disponível durante a pandemia) com psicólogo especializado. Duração de 45 minutos cada.
- A triagem (etapa prévia de seleção) é gratuita. Após isso, aluno da PUC não paga. Egresso PUC, formado há mais de dois anos, e estudante de outra instituição desembolsam R$ 650. Para profissional sem vínculo com a universidade, R$ 1 mil.
- Agendamento via WhatsApp (51) 99984-1653, das 9h às 18h.
UNISINOS
- Destina-se a explorar interesses e alternativas profissionais, com o objetivo de passar segurança ao estudante na tomada de decisão de curso/carreira.
- Orientação com quatro encontros presenciais ou online com psicólogas especializadas. Uma hora cada.
- Aluno ou egresso da Unisinos paga R$ 39. Sem vínculo com a universidade, R$ 154.
- Inscrição neste site.
*Reportagem de Igor Morandi