Após o Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS) suspender o projeto de parceria público-privada (PPP) que engloba 99 escolas da rede estadual, o governo do Estado precisa responder a questionamentos. A conclusão da auditoria mostrou pontos a serem revisados no projeto antes da publicação do edital. A decisão valerá até a apreciação do mérito da ação.
A PPP do governo do Estado pretende estabelecer parcerias com a iniciativa privada para a execução de obras. Além disso, visa reformas, ampliações, manutenções e outros serviços não pedagógicos nas unidades de ensino.
A secretária de Educação, Raquel Teixeira, já foi notificada a adotar as providências solicitadas e a prestar esclarecimentos ao Tribunal dentro de um prazo de 30 dias. Por meio de nota, o governo do Estado informou que o edital "está em fase de estruturação" e que "todos os questionamentos do TCE serão devidamente esclarecidos" (confira, abaixo, o posicionamento).
Nesta terça-feira (17), a reportagem de Zero Hora buscou detalhamento dos pontos sinalizados pelo Serviço de Auditoria de Engenharia e Desestatizações do Estado do TCE-RS (Saede). A assessoria do gabinete do relator do processo, Estilac Xavier, explicou sobre os itens observados.
Entenda os pontos que motivaram a suspensão:
Insuficiência de comprovação da Vantajosidade
A Vantajosidade é o estudo técnico que envolve questões econômicas e sociais, no qual ficará caracterizado que a opção pela contratação da parceria público-privada é mais vantajosa do que se o Estado fizesse uma contratação tradicional. Em vez de o Estado contratar diretamente os prestadores de serviço para aquela demanda pública, os custos dessa hipótese são comparados com os custos dessa PPP, em que ele vai fazer uma concessão para que um parceiro privado administre essas questões.
Para fazer esse estudo há uma metodologia. A mais aceita é o Value For Money, que é uma comparação desses custos da contratação tradicional com a PPP. A equipe de auditoria apontou que a taxa de juros utilizada para trazer a valor presente foi a taxa que o Estado paga hoje nos empréstimos junto ao Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird). Foi isso que o Executivo utilizou. A questão é que essa taxa é pouco representativa do perfil da dívida do Estado. A taxa mais adequada seria a utilizada no contrato da dívida com a União, que é menor.
Apropriação indevida de custos de financiamento para as Despesas Operacionais no custo-benefício
Quando se compara a contratação tradicional com a da PPP, o projeto pressupõe que o Estado vai precisar ter um custo de captação de recurso para tudo aquilo que necessita ser executado, como despesas com zeladora, vigilância, entre outras.
Parte disso já é pago com recursos próprios vindos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), da Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE) e do Salário Educação. No projeto se apropriou como se o Estado tivesse que captar tudo. E não precisa para tudo, apenas para uma parte. Não foi evidenciado para que parte é necessário.
Ausência de prestação de informações necessárias ao controle externo
Há uma série de elementos que a lei das PPPs estabelece e que devem ser evidenciadas em um projeto desses. Por exemplo: a demonstração do impacto orçamentário financeiro que deve vigorar durante o período do contrato, a adequação da PPP às metas dos resultados fiscais da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), entre outras. A lei estabelece uma série de itens que devem ser demonstrados e não foram sob a justificativa de que, oportunamente, seriam alcançados até o lançamento do edital.
Violação à lei que prevê autonomia pedagógica das escolas estaduais
A autonomia administrativa das unidades escolares pressupõe que a direção da escola participe da administração em conjunto com a comunidade escolar. Um exemplo: no projeto existe uma ideia de ampliação dos espaços escolares visando o turno integral. Só que não fica evidenciado no processo que a comunidade escolar foi ouvida para ver se existe a demanda em cada uma dessas escolas.
Há o risco de se fazer uma operação de um espaço escolar sem que isso seja utilizado depois. Inclusive, em algumas audiências públicas, houve manifestações dizendo justamente que se aquela escola passasse a ter turno integral poderia haver uma evasão de alunos, que iriam buscar outras escolas porque precisam trabalhar.
Falta de regularização fundiária das unidades educacionais
Tem casos de escolas que funcionam em terrenos privados, outras em espaços do município. É preciso fazer essa regularização da posse dos terrenos. Há terrenos que a questão da escritura necessita ser reavaliada. Se o Estado, eventualmente, vir a fazer alguma ampliação em uma escola com terreno irregular, corre-se o risco de a obra virar desperdício de recursos.
Falta de fiscalização permanente da execução contratual
O contrato prevê uma prestação de serviço pelo prestador no projeto de PPP. Essa prestação está condicionada até o limite de 20%. O prestador tem prazo para atender as demandas. Se ele não atender nenhuma, ele perde, no máximo, 20%. Essa fiscalização, na forma como está no contrato, se dará por uma amostragem. Não serão todas as 99 escolas.
O relatório menciona ainda que o controle da Administração sobre a execução dos serviços públicos concedidos é contínuo e deve ser exercido pelo órgão técnico do poder concedente ou mediante convênio com outro ente público. Não pode ser executado por particular.
Confira o que diz o governo estadual
A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Educação do RS (Seduc) e com a Secretaria de Parcerias e Concessões em busca de entrevistas com os titulares para obter respostas sobre os pontos não contemplados no projeto. Porém, o posicionamento do governo estadual sobre o tema foi encaminhado pela Secretaria da Reconstrução Gaúcha. Veja a nota:
"A Secretaria da Reconstrução Gaúcha informa que o edital da PPP das Escolas Estaduais, que vai qualificar a gestão, administração e infraestrutura de 99 instituições de ensino ainda está em fase de estruturação e não foi publicado. A parceria não prevê qualquer tipo de intervenção pedagógica. Essa responsabilidade seguirá sendo da Secretaria da Educação.
Entre as ações tomadas nessa etapa do processo estão a revisão do modelo econômico-financeiro e do levantamento da estimativa dos valores de investimento em reformas, entre outros pontos. A pasta ressalta que todos os questionamentos do TCE serão devidamente esclarecidos."