Em um mundo corporativo invadido por mudanças tecnológicas, manter o emprego não é fácil. Além de atualizar o conhecimento técnico, os trabalhadores precisam desenvolver habilidades comportamentais para não terem sua vaga devorada por um software ou um robô. Nesta entrevista, Adriana Gomes, mestre em psicologia com especialização em orientação vocacional, palestrante e coach de carreira com 30 anos de experiência como caça-talentos e recrutadora para empresas como Basf, Gillette e Sodexo, explica por que os profissionais devem se manter atualizados para prosperar na carreira ou buscar novas vagas no mercado de trabalho.
Na atual situação da economia brasileira, que tem 13 milhões de desempregados, qual a maior dificuldade em se obter uma vaga?
É difícil uma resposta que abranja todos os públicos. Os jovens e seniores talvez sejam os que mais sofrem. Para os mais jovens, a barreira é a falta de experiência e de competências técnicas e comportamentais. Os mais velhos sofrem com falta de atualização e reciclagem. Muitas vezes, não percebem que o mercado de trabalho cada vez mais exige um aprendizado contínuo ao longo da carreira.
No caso dos jovens, como romper esta barreira da primeira experiência, que o jovem ainda não possui?
O nível de educação é muito ruim no Brasil, muito jovem sai da escola como analfabeto funcional. Isso dificulta a entrada no mercado e a conquista de vagas mais interessantes. Por outro lado, nunca se teve tanta diversidade de oportunidades no país, com facilidade para empreender, atuar como autônomo ou prestador de serviço. Então, às vezes, a forma de entrar no mercado de trabalho não é por meio de um emprego convencional, de carteira assinada.
Como se manter preparado, com a empregabilidade em dia, para uma eventual demissão?
Investindo em networking e relacionamento. As pessoas se afundam na realização da tarefa e esquecem que relacionamento é a grande base para a recolocação. Quem contrata quer indicações de profissional que seja confiável, competente, inovador, proativo. Quem tem estas competências e mantém vivos seus canais de relacionamento ganha um importante diferencial para se recolocar.
Como se faz um diagnóstico e se tira lições de uma demissão?
Nem toda demissão tem boa justificativa. Às vezes, pode ser aleatória, força de uma crise econômica ou fechamento de unidades. Mas quando uma demissão tem justificativa individual, o profissional tem que ser muito honesto consigo próprio, avaliar seu desempenho em termos de motivação, criação, o quanto realmente estava entregando e o que poderia ter feito melhor. Nesses 30 anos dando orientação, vejo que muitas pessoas incorrem nos mesmos erros quando conseguem um novo emprego.
É possível identificar sinais de que uma demissão está próxima?
Nem todas as empresas dão sinais, mas algumas dão. Pode ser no feedback, em cobranças frequentes com as mesmas tarefas, em sugestões de melhorias que não são cumpridas.
Manter-se sempre atualizado tornou-se uma regra do mercado de trabalho na atualidade?
Tenho dito em minhas palestras que as pessoas nunca vão poder parar de estudar. A atualização terá de ser contínua e constante. Quem não gosta de estudar está em maus lençóis. As tecnologias mudaram, assim como as relações das empresas com o trabalhador. Cada vez mais o profissional precisa evoluir suas habilidades técnicas e comportamentais.
Os aspectos comportamentais do profissional são tão importantes quanto a sua capacidade técnica?
Às vezes, até mais. Habilidades como relacionamento interpessoal, trabalho em grupo, poder de negociação e liderança são o caminho para profissionais se manterem necessários às empresas, não perderem seu trabalho para um computador. O computador é muito mais rápido do que o ser humano, então o trabalhador precisa desenvolver competências comportamentais para ganhar um diferencial. Isso é transversal, isto é, perpassa praticamente todas as profissões, da engenharia à medicina.
Mesmo profissionais qualificados reclamam das dificuldades em conseguir promoções ou reajustes onde trabalham. É fruto da crise?
A grande maioria das empresas não tem plano de carreira definido ou transparente. Isso é uma falha, temos passado por crises sucessivas e um plano de crescimento exige organização grande na gestão, na avaliação e no desenvolvimento. Nem sempre as organizações têm interesse ou estrutura para isso. Muitas vezes, uma promoção só acontece quando a pessoa muda de emprego.
Novas tecnologias e a necessidade de trabalhar por mais tempo, em razão de mudanças na Previdência Social, forçarão cada vez mais mudanças de carreira?
O conceito de carreira linear está sendo mudado, ou seja, dificilmente alguém começará e terminará a trajetória profissional em uma mesma atividade. Hoje, já estamos vendo engenheiros fazendo atendimento ao cliente e psicólogos trabalhando com análise de dados.
Qual o alerta de que é necessário mudar de carreira?
As pessoas estão frustradas de maneira geral. Ou querem progredir rápido ou ganhar mais ou ter mais tempo livre. A mudança vai ser sempre bem-vinda quando o profissional tomar consciência dos aspectos não satisfatórios. Por isso é importante ter autoconhecimento e procurar algo que atenda essa necessidade.