Na casa de Michele Lincke, a greve dos professores estaduais afetou a rotina de todos. Enquanto o filho mais novo, Arthur, 11 anos, tem aulas normalmente no Colégio Estadual Marechal Rondon, em Canoas, a turma do irmão dele, Matheus, 12 anos, está completamente sem aulas. Arthur está no 5º ano do Ensino Fundamental; Matheus, no 7º ano. Nessa escola, os estudantes dos anos iniciais estão com as lições em dia, mas do 6º ano em diante praticamente não há aulas desde setembro.
Com isso, o cotidiano de Michele mudou. Nas manhãs dos dias úteis, quando ela sai para trabalhar e leva o filho mais novo para a escola, Matheus fica em casa. Para não deixar o garoto sozinho, a mãe procurou um espaço alternativo — uma espécie de "creche" para crianças maiores. Mas o local custa R$ 70 por dia, o que, para Michele, torna inviável a presença frequente do filho por lá. Quando possível, ela tenta ainda levá-lo para ficar com a avó, mas nem sempre consegue.
— O Rondon está há dois meses e meio sem aula. Não tenho como arcar com esses custos, nem posso ficar em casa cuidando dele, tenho que trabalhar. Mas o pior é que isso gera dificuldade de aprendizado para o Matheus. O tempo se torna ocioso, não produtivo, e ele se esquece do conteúdo. É um atraso. Vou ter que acabar pagando uma professora particular além da de Matemática, com quem ele já tem aulas pois o ensino da escola está péssimo — relata a mãe.
A paralisação dos professores também prejudicou a família profissionalmente. Michele é motorista de van escolar, e conta que viu o número de alunos que transportava cair cerca de 40% nos últimos meses por conta da greve.
— Perdi ainda vários clientes porque muitas escolas estaduais estão paradas. Ficamos muito prejudicados nessa história, eu e meu filho.
O QUE DIZ A SEDUC
Atraso no ano letivo
"Como os períodos de greve não são os mesmos, cada escola tem o compromisso de integralizar os seus dias letivos, nos anos que tiveram greve e nas turmas individualmente", explicou, por e-mail, a diretora pedagógica da Secretaria Estadual da Educação, Sônia da Rosa. Isso significa que ficará a cargo de cada instituição definir como vai recuperar as aulas de forma a cumprir o mínimo de 200 dias letivos exigido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
Reflexos em 2018 e 2019
"O calendário escolar para as escolas que estão totalmente paradas refletirá no início do ano letivo de 2018", afirmou a diretora pedagógica da Seduc. Ela estima, porém, que a reorganização escolar dos dias letivos de 2018 — incluindo aulas nos sábados — pode normalizar o ano letivo, evitando reflexos em 2019. Ainda assim, eles podem acontecer: "há um entendimento de que teremos diferentes calendários escolares em 2018, tendo em vista o número de dias de greve de cada unidade escolar", garantiu Sônia.
Alunos concluindo o Ensino Médio
A secretaria não deu uma resposta clara sobre o que poderão fazer alunos que precisam do certificado de conclusão do Ensino Médio e ainda não têm sequer previsão para o encerramento do ano letivo. Além do prejuízo aos alunos do 3º ano do Ensino Médio que buscam o ingresso em uma instituição de Ensino Superior, também os alunos matriculados no 9º ano do Ensino Fundamental podem ter problemas para ingressar nas escolas técnicas de qualquer esfera.
Como alternativa, Sônia explica que "uma das orientações às famílias foi a possibilidade de transferência dos alunos que estavam matriculados nas escolas em greve para escolas que estavam em funcionamento". Em alguns casos, também seria recomendado procurar o Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos (NEEJA), que fornece um certificado, mas só para estudantes que tenham pelo menos 18 anos.