Atingidos pelo parcelamento salarial desde 2015, servidores estaduais enfrentam em setembro o mais angustiante mês desde que a crise instalou-se nas finanças do governo do Estado. Com R$ 350 depositados na quinta-feira (31) e sem perspectiva de quando ocorrerá o pagamento integral dos vencimentos, funcionários públicos desdobram-se, sem sucesso, para vencer as contas.
Na manhã desta segunda-feira (4), em Porto Alegre, professores protestaram contra o menor depósito recebido desde o início do fatiamento dos contra-cheques – até então, era de R$ 450. Há relatos de docentes que se ausentaram porque sequer tinham dinheiro para a passagem de ônibus.
Leia mais:
Rosane de Oliveira: depósito de R$ 350 retrata caos nas finanças do Estado
Estado e duas prefeituras da Grande Porto Alegre parcelam salários de agosto
– Se a pessoa trabalha, ao fim do mês quer receber seu salário. É uma situação humilhante – desabafou Klymeia Nobre, 45 anos, agente educacional da escola José do Patrocínio, na Restinga.
Mais de 70 servidores de 36 colégios estaduais participaram da manifestação. O grupo reuniu-se em frente ao Júlio de Castilhos e seguiu em direção ao Palácio da Polícia. Na 2ª Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), registrou boletim de ocorrência contra o governador José Ivo Sartori por desobediência, ao descumprir a Constituição do Estado e parcelar a folha de pagamento.
No grupo, os relatos dimensionavam o impacto do repasse à conta-gotas. Entre eles, o de Alexandra Amarante, 31 anos, professora na escola Professores Langendonck, no bairro Guarujá, que começou a trabalhar como manicure aos finais de semana para pagar a gasolina gasta para chegar ao trabalho. Com o serviço, diz garantir um extra de R$ 50 por semana.
– Nunca fui profissional, mas estou atendendo algumas clientes. É o que está me ajudando ao menos no transporte para ir até a escola trabalhar – contou Alexandra.
Com a primeira parcela do salário, a professora mal conseguiu liquidar as contas de luz, água e medicação. No dia 4 do mês, a conta bancária está zerada.
A vice-diretora do colégio Emílio Massot, na Cidade Baixa, Neiva Lazzarotto, 53 anos, enfrenta um cenário ainda mais crítico. Ela chegou ao limite do crédito, parcelou a conta do condomínio e, nos últimos meses, precisou pedir dinheiro emprestado para familiares em quatro ocasiões.
– Meus pais, aposentados, estão me ajudando. É uma solidariedade, mas também uma situação muito cruel comigo e com eles – disse Neiva.
O boletim de ocorrência registrado contra o governo cita a decisão judicial que determina o pagamento integral dos salários dos professores da rede estadual. "Embora a decisão judicial, reiteradamente o Estado do Rio Grande do Sul vem descumprindo a ordem judicial", sublinha a queixa.
O documento policial foi encaminhado para o Departamento Judicial Operacional (DJO) da Polícia Civil, responsável pela distribuição dos casos que chegam à delegacia. Segundo o Cpers, professores de outras localidades repetiram o gesto simbólico – mas não há um levantamento.
Na terça-feira (5), o sindicato realiza assembleia geral no Largo Glênio Peres, no centro de Porto Alegre. Os dirigentes devem reunir as ocorrências contra Sartori e discutir se a entidade ingressa com ação contra o governo. Também será debatida a possibilidade de greve.