O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, nesta quarta-feira (26), que devem incidir impostos sobre determinados incentivos fiscais dados por Estados a empresas. A decisão é considerada uma vitória para o sucesso da nova regra fiscal proposta pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, porque permite a arrecadação de R$ 90 bilhões para os cofres públicos.
A decisão do STJ, porém, não terá eficácia por enquanto. Isso porque o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), havia determinado a suspensão do julgamento a pedido de uma associação do agronegócio. Os ministros do STJ afirmaram que não receberam o comunicado oficial e continuaram com a ação.
Em sua decisão, André Mendonça afirmou que “na eventualidade de o julgamento dos recursos especiais (no STJ) em questão ter se iniciado ou mesmo concluído, desde já, fica suspensa a eficácia desse ato processual”.
A análise da liminar de Mendonça no plenário virtual do STF será do dia 5 a 12 de maio. Se a ordem do ministro não for corroborada pelos colegas, fica valendo a decisão do STJ.
O STJ decidiu que as empresas não podem continuar abatendo do Imposto de Renda e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), impostos federais e benefícios dados pelos Estados.
Ao iniciar o julgamento, o presidente da Primeira Seção do STJ, Sérgio Kukina, afirmou que ainda não havia sido notificado oficialmente sobre a liminar do STF, por isso, seguiu normalmente o julgamento.
— No curso dos trabalhos, se a comunicação chegar por via oficial, o relator adotará as medidas que julgar convenientes — afirmou Kukina.
Entenda o que está em discussão
O ICMS, imposto cobrado pelos Estados, tem uma alíquota nominal e outra efetiva. Por exemplo, a venda de mercadorias é tributada com uma alíquota de 18%. Mas devido a vários artifícios, que fomentaram a guerra fiscal entre os Estados, na prática essas alíquotas são menores por meio da diminuição da base de cálculo do imposto, isenção e crédito presumido (que reduz o imposto a pagar por meio de uma compensação).
Além desses artifícios, existe um benefício fiscal que os Estados concedem para atrair empresas. É a chamada "subvenção de investimento" que nada mais é que trocar o valor que determinada empresa investiu pelo valor do ICMS que ela pagará quando a sua fábrica, por exemplo, ficar pronta e as mercadorias começarem a ser vendidas.
Mas existe outro benefício aplicado que é chamado de "subvenção para custeio". Basicamente é a redução da alíquota ou do valor que a empresa tem a recolher do ICMS, sem nenhuma contrapartida para o governo estadual. Muitos desses benefícios são conseguidos por pressão de empresas e grandes lobbies.
Devido a um "jabuti" (medida diferente do teor da proposta original) incluído na Lei de Complementar 160, de 2017, as empresas passaram a abater dos impostos federais esses incentivos que foram dados pelos Estados. Essa lei validou os incentivos concedidos no passado pelos Estados e com o "jabuti" equiparou todos os incentivos fiscais às "subvenções para investimentos".
Os dois incentivos começaram a ser usados para deduzir o valor a recolher de IRPJ e CSLL. Só que há uma grande diferença entre eles. Na subvenção de investimento, a empresa realmente desembolsa dinheiro para fazer a fábrica. O segundo é apenas redução de imposto.
No incentivo de custeio, as empresas registram na contabilidade a despesa total do ICMS da alíquota. Por exemplo, a alíquota é de 18%. Só que geralmente há um benefício de 20% de redução ou mais do imposto. Dos R$ 18 registrados como despesa, por exemplo, a empresa acaba pagando, na prática, R$ 14. Os R$ 4 seriam a "despesa fictícia".
Na segunda-feira (24), Haddad se reuniu com o ministro do STJ Benedito Gonçalves, relator do processo, para discutir o assunto.
— É óbvio que o STJ é um tribunal superior da maior respeitabilidade. Certamente vai acabar no Supremo, mas eu tenho certeza que é uma sinalização importante se vamos ter ou não um país transparente do ponto de vista do gasto tributário — declarou o ministro após a reunião com o relator.
Segundo ele, o Brasil é o único país do mundo que faz subvenção de custeio, ou seja, benefícios concedidos para pagar os custos correntes da empresa e não investimentos. O Estadão ouviu tributaristas que conhecem o teor do julgamento para entender como esse benefício foi criado.
Argumentos de Mendonça
Ao mandar suspender o julgamento, Mendonça atendeu a pedido da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), que alegou que "a eventual inclusão do crédito presumido de ICMS e/ou de demais benefícios fiscais nas bases de cálculo do PIS/COFINS (em lógica eventualmente aplicável a outros tributos, como o IRPJ e a CSLL) elevaria, sobremaneira, a carga tributária incidente sobre o consumo".
A Abag também sustentou que há uma ação com "matéria constitucional de fundo seria idêntica" em tramitação no no STF.
"Permitir que seja iniciado o julgamento do Tema 1182, pelo E. STJ, antes que se finalize a análise do Tema 843 por esse E. STF, pode aumentar a insegurança jurídica", destacou, em nota, a entidade.
Mendonça, ao acolher o pedido, ressaltou que já haviam sido proferidos todos os onze votos possíveis no plenário virtual do STF a respeito do tema. A maioria formada era no sentido de proibir a inclusão de créditos presumidos do ICMS na base de cálculo do Pis/Cofins. O julgamento no Supremo foi suspenso por pedido de destaque do ministro Gilmar Mendes.