O projeto de lei complementar da nova regra fiscal que deve substituir o teto de gastos deve ser apresentado oficialmente ao Congresso nesta terça-feira (18). Segundo o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, a entrega da proposta deve ser feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em reunião no Palácio do Planalto que irá reunir chefes dos poderes para tratar da violência nas escolas, às 9h30min.
Líder do governo na Câmara, o deputado José Guimarães (PT-CE) avaliou, em entrevista à Globonews, que essa reunião é "o melhor momento" para o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entregar o projeto aos parlamentares. A expectativa é de que a tramitação ocorra de maneira célere. Em entrevista ao programa Canal Livre, da Band TV, no domingo (16), Lira sinalizou que a análise será rápida:
— A nossa expectativa é que o texto, chegando, designaremos o relator rapidamente, e que duas ou três semanas, no máximo, estaremos votando o texto em Plenário.
O sistema que pode substituir o teto de gastos, implementado em 2017 e que limitava o crescimento das despesas à inflação oficial, tem como principal referência o resultado da arrecadação. Se aprovado o projeto, a alta dos gastos no ano será restrita a 70% do crescimento da receita nos 12 meses anteriores. Com as despesas crescendo sempre menos que a arrecadação, o governo federal prevê alcançar superávit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2025.
— (O modelo vai) traçar uma trajetória consistente de resultado primário em que, necessariamente, a despesa vai crescer atrás da receita, a receita vai crescer a uma taxa e a despesa vai crescer a uma taxa menor. Portanto, você vai ampliar o espaço de economia, justamente para dar sustentabilidade para as contas públicas, mas você não tem uma rigidez absoluta, porque as demandas sociais estão aí e precisam ser atendidas, mas de maneira responsável — defendeu o ministro da Fazenda, em 30 de março, quando apresentou a proposta.
Conforme o Estadão, o texto final da nova regra pode conter mudanças de última hora para reforçar o compromisso do governo federal com as contas públicas. A proposta pode já fixar os valores das metas e parâmetros na lei complementar para os próximos quatro anos, mas deixando a possibilidade de mudança por lei ordinária para o governo seguinte.
A ideia inicial era incluir os conceitos do chamado arcabouço fiscal na lei complementar e os valores dos parâmetros em lei ordinária. Com essa alteração, pode se tornar mais difícil a mudança dos parâmetros apresentados no projeto.
Ainda no fim de março, a proposta foi apresentada aos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado. A porta de entrada do projeto será a Câmara dos Deputados, onde são protocolados os PLCs que têm origem na Presidência.
Isto significa que, mesmo que haja alterações subsequentes no Senado, serão os deputados federais que darão o voto final sobre o tema. Mas, antes de ser apreciada em plenário, a proposta tem uma série de outras etapas a percorrer.
Entenda o passo a passo
1 – Apresentação
Um projeto de lei complementar (PLC) pode ser apresentado por qualquer deputado ou senador, comissão da Câmara ou do Senado, pelo presidente da República, pelo procurador-geral da República, pelo Supremo Tribunal Federal, por tribunais superiores e cidadãos. Esse tipo de projeto estipula regras para cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios, em temas especificados pela Constituição Federal.
2 – Entrada
Via de regra, a tramitação começa pela Câmara. A exceção é para os PLCs apresentados por senadores. O Senado funciona como a Casa revisora para os projetos iniciados na Câmara e vice-versa. Se o projeto da Câmara for alterado no Senado, volta para a Câmara. Da mesma forma, se for alterado pelos deputados, volta ao Senado. Ou seja, a Casa onde o projeto se iniciou tem a palavra final sobre seu conteúdo, podendo aceitar ou não as alterações feitas na outra Casa.
3 – Comissões
Após protocolados, os projetos são distribuídos nas comissões temáticas. Além das que avaliam o mérito, existem duas que podem analisar outros aspectos, a de Finanças e de tributação (análise de adequação financeira e orçamentária) e de Constituição e Justiça (análise de constitucionalidade). Só então o PLC estará habilitado a ser votado em Plenário.
4 – Comissão especial
Os projetos que tratarem de assuntos relativos a mais de três comissões de mérito são enviadas para uma comissão especial criada especificamente para analisá-los. Essa comissão substitui todas as outras e dará o parecer final para que a proposta vá à Plenário.
5 – Urgência
O projeto de lei complementar pode tramitar em regime de urgência se o Plenário aprovar requerimento com esse fim. Geralmente, a urgência depende de acordo de líderes, o que permite que seja votado rapidamente no Plenário, sem necessidade de passar pelas comissões. Os relatores da proposta nas comissões dão parecer oral durante a sessão, permitindo a votação imediata.
6 – Presidência
O presidente da República também pode solicitar urgência para votação de projeto de sua iniciativa. Nesse caso, a proposta tem de ser votada em 45 dias ou passará a bloquear a pauta da Câmara ou do Senado (onde estiver no momento).
7 – Aprovação
Os projetos de lei complementar exigem quórum diferenciado para a sua aprovação, que é, no mínimo, a maioria absoluta de votos favoráveis, ou seja, 257 votos dos 513 deputados federais. No Senado são necessários 41 dos 81 senadores com cadeira na Casa.
8 – Sanção e veto
Quando aprovados no Congresso, os PLCs são enviados ao presidente da República, que terá prazo fixado em 15 dias úteis para a sanção ou veto. Os vetos, que podem ser totais ou parciais, têm de retornar ao Congresso para serem votados. Para rejeitar um veto, também é preciso o voto da maioria absoluta dos deputados (257) e dos senadores (41).
Como é e como ficaria com a proposta aprovada
O que diz a proposta de nova regra fiscal
- A elevação das despesas (gastos) do governo fica condicionada ao equivalente a 70% de crescimento das receitas (arrecadação) consolidada no ano anterior
- Na prática, permite que o governo possa elevar gastos setoriais se tiver capacidade de elevar a arrecadação e potencializar os recursos para os serviços públicos e programas sociais
- A regra permite, mas estipula um teto em 2,5% do crescimento do PIB, que o governo reforce o orçamento de setores específicos em momento macroeconômicos considerados favoráveis
- Tem como meta zerar o déficit fiscal já em 2024, diminuir os encargos com a dívida pública e gerar superávit primário (resultado positivo de todas as receitas e despesas do governo, excetuando gastos com pagamento de juros) de 0,5% PIB em 2025 e de 1% do PIB em 2026
- Prevê que nos momentos de baixa atividade econômica haja um crescimento orgânico das despesas, assim como, caso ocorra o descumprimento das metas (entre 0,6% e 0,25% do PIB), as despesas possam ser elevadas em 50% da margem das receitas no primeiro ano e 30% no segundo
- Prevê um pequeno crescimento da dívida pública bruta até 2025 e a estabilização, em 2026, em 76,54% do PIB. Essas projeções, no entanto, ocorrem no cenário em que o resultado primário fique no centro dos limites previstos para as bandas, pois caso o governo economize menos do que o esperado, a dívida aumentará de 74,11% do PIB em 2023 para até 77,34% em 2026
- O foco do mecanismo fiscal está no nível das receitas para controlar o aumento de gastos.
Como era o teto de gastos
- O limite para a elevação dos gastos públicos setoriais era o avanço da inflação (medido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA) no ano anterior
- Na prática, o teto congelaria os gastos públicos por, pelo menos, 10 anos, já que as despesas só poderiam seguir o fluxo de altas da própria inflação
- A regra determinava que, mesmo em situações macroeconômicas favoráveis, ou seja, com crescimento exponencial do PIB, o governo teria o orçamento limitado
- A meta do teto era conter a expansão de gastos primários para preservar as contas públicas e, em última instância, garantir ao Estado a sua capacidade financeira para arcar com os serviços sociais
- Impedia que nos momentos de baixa atividade fossem realizadas ampliações das despesas públicas, inclusive as que eventualmente fossem necessárias de maneira orgânica, caso, por exemplo, de reposições salariais ou investimentos em infraestrutura
- O foco daquele mecanismo fiscal estava no nível das despesas, independentemente das receitas.