O abismo entre ricos e pobres ficou maior durante a pandemia na região metropolitana de Porto Alegre. Isso ocorreu porque, no segundo trimestre, houve alta de 5,5% no indicador que mede a diferença de renda do trabalho entre as camadas da sociedade. Na comparação com Florianópolis e Curitiba, a Grande Porto Alegre apresenta a maior desigualdade entre as metrópoles da Região Sul, embora ainda esteja abaixo da média nacional.
As conclusões integram o Boletim Desigualdade nas Metrópoles. Com base em microdados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a pesquisa analisa as variações na renda do trabalho em 22 regiões metropolitanas do país. O estudo é uma parceria entre a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), o Observatório das Metrópoles e o Observatório da Dívida Social na América Latina (RedODSAL).
O indicador que mede a desigualdade é o coeficiente de Gini, com escala de zero a um. Quanto mais próximo de zero, maior o nível de igualdade na região pesquisada. No sentido contrário, quanto mais perto de um, maior a diferença nos ganhos da sociedade.
A alta de 5,5% na região metropolitana de Porto Alegre ocorreu porque o indicador subiu de 0,603 para 0,636 no segundo trimestre de 2020, em relação a igual período de 2019. O aumento não é exclusividade da capital gaúcha.
Houve elevação em 21 dos 22 locais pesquisados — a exceção foi Maceió. No mesmo intervalo, a desigualdade nacional, superior à gaúcha, avançou 4,9%, de 0,610 para 0,640.
Os dados contemplam apenas recursos obtidos com o trabalho – formal ou informal. Logo, transferências de programas como o auxílio emergencial não entram nos cálculos.
— A desigualdade teve boom de crescimento em razão da pandemia. Isso mostra o quão necessárias são as políticas sociais — frisa André Salata, professor do programa de pós-graduação em Ciências Sociais da PUCRS e um dos coordenadores do boletim.
Média móvel
Na média móvel de quatro trimestres, até o segundo deste ano, o coeficiente de Gini ficou em 0,609 na região metropolitana de Porto Alegre. É o décimo menor do país, mas o maior da Região Sul.
Florianópolis (0,546) tem a marca mais baixa entre as metrópoles pesquisadas. Curitiba (0,565) é a terceira menos desigual do Brasil. Já a média nacional ficou em 0,615, acima da registrada na capital gaúcha.
— Porto Alegre já era a mais desigual das metrópoles do Sul. É mais complexa do que as demais, com uma economia mais diversificada. Esse fator pode gerar mais desigualdade, as pessoas que estão mais embaixo na pirâmide social têm ocupações menos protegidas — afirma Salata.
Pobres sofrem mais
Segundo o boletim, houve queda generalizada nos rendimentos do trabalho durante a pandemia. O que chama atenção é que, percentualmente, a baixa foi maior entre os mais desfavorecidos.
No segundo trimestre, a renda dos 40% mais pobres encolheu 41,7% na região metropolitana de Porto Alegre. Na outra ponta da pirâmide, os 10% mais ricos amargaram recuo de 12,9% nos ganhos. Na faixa dos 50% intermediários, a perda foi de 11,7%.
Salata lembra que o avanço de programas sociais no país ainda esbarra na discussão sobre fontes de financiamento para a área. O governo Jair Bolsonaro chegou a anunciar proposta de criação do Renda Cidadã, que substituiria o Bolsa Família a partir do próximo ano. Entretanto, ainda não houve consenso sobre a origem dos recursos para bancar o novo programa, que contemplaria beneficiários do auxílio emergencial.
Para o professor da PUCRS, uma das possíveis saídas para o impasse seria uma reforma tributária que taxasse mais os grandes patrimônios e menos o consumo:
— A grande questão é como financiar programas sociais. O que me surpreende é que, em um país desigual, não se fale tanto em taxar mais quem está na ponta de cima. Nosso sistema tributário atinge muito o consumo e menos a renda.