As amarras que impedem o prolongamento da pista de pousos e decolagens do Aeroporto Internacional Salgado Filho começaram a ser desfeitas com a emissão da licença de instalação, documento concedido pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) em 11 de janeiro. Pelo documento, o órgão permite a execução da obra independentemente da remoção das 360 famílias que moram próximo à cabeceira leste da pista, em meio à Vila Nazaré.
Outro passo foi dado na terça-feira da semana passada, quando a Fraport Brasil – Porto Alegre, administradora do aeroporto, assinou com um consórcio de construtoras – HTB, Tedesco e Barbosa Mello – o contrato para início dos trabalhos de extensão da pista e, também, de expansão do Terminal 1.
Secretária estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e diretora-presidente da Fepam, Ana Pellini considera não haver impedimento para o início das obras na pista, já que os trabalhos não interferem no cotidiano dos moradores, separados da cabeceira por um descampado. É nesse ponto que parte dos 700 trabalhadores destacados para os serviços se concentrará. Se todas as exigências forem cumpridas, a obra poderá ser concluída mesmo que as famílias ainda estejam ali instaladas. Mas a secretária adverte:
– Nesse caso, a licença que permite a operação não será emitida. A menos que a Fraport nos prove que a permanência das pessoas não significa riscos, o que ninguém conseguiu sinalizar até agora – disse, salientando que o documento só foi expedido após laudos da prefeitura garantindo a existência de local apropriado para o reassentamento.
Ou seja, o início da ampliação está garantido. Usar o novo espaço, porém, só com nova autorização, a licença de operação. A dirigente da Fepam lembrou que essa não foi a primeira vez que o documento foi concedido. Em 2010, a Infraero obteve a liberação, mas os cinco anos de validade se passaram sem que as obras começassem. A Fraport solicitou a renovação da licença, que agora ganhou novo prazo de vencimento: 11 de janeiro de 2023.
Serão 920 metros a mais de asfalto, totalizando 3,2 quilômetros de pista, o que possibilitará o recebimento de aeronaves de maior porte. As obras estão planejadas para terem início em março e custarão R$ 1,5 bilhão, valor acima dos R$ 600 milhões anunciados inicialmente. O novo montante contempla contratação do consórcio, compra de equipamentos, desenvolvimento e gestão do projeto. A expectativa é concluir a expansão do terminal até outubro do próximo ano e a pista, até 2021.
– Nossa meta é criar um portal aeroportuário moderno, eficiente e focado no cliente – afirmou Andreea Pal, CEO da Fraport Brasil – Porto Alegre.
Invasores precisam sair antes da mudança
As 360 famílias que moram na área de alinhamento com a pista e que terão como destino o Loteamento Senhor do Bonfim, conjunto habitacional construído pela Caixa Econômica Federal no bairro Sarandi, aguardam a retirada das pessoas que invadiram os imóveis em novembro de 2016. Conforme a Caixa e a Brigada Militar (BM), duas ordens judiciais de reintegração de posse foram emitidas entre agosto e novembro do ano passado. Nenhuma foi cumprida.
Em uma das vezes, foi acatado pelas partes o pedido das famílias para que o despejo não acontecesse em período escolar. Conforme o diretor-geral do Departamento Municipal de Habitação (Dehmab) de Porto Alegre, Mário Marchesan, a segunda ordem de reintegração de posse ainda não foi concretizada por falta de efetivo da BM:
– A Brigada Militar diz que não tem pessoal porque os policiais estão na Operação Golfinho.
Chefe da sessão de Operações do Comando de Policiamento da Capital (CPC), o major Rodrigo Schoenfeldt afirma que a “Brigada Militar tratou de fazer reuniões com todas as partes envolvidas para que o impasse fosse resolvido com celeridade”.
A corporação pontuou que a reintegração não aconteceu em razão de ofício que chegou para a BM informando que a Caixa não havia se manifestado em relação aos “meios para cumprir o mandado”, como caminhões de mudança, ambulâncias e banheiros químicos, o que se configurava em um impeditivo.
Em nota, o banco informou que a data da reintegração de posse expedida em novembro de 2017 “será definida pelos órgãos executores da operação e a Caixa disponibilizará os meios necessários ao cumprimento da decisão judicial”.
Expectativa é de retirar invasores em março
Mesmo sem a confirmação da Caixa e da Brigada Militar, Mário Marchesan, diretor-geral do Departamento Municipal de Habitação de Porto Alegre, projeta para março a reintegração de posse do Loteamento Senhor do Bonfim.
– Se depender da prefeitura e da Fraport, em março será feita a reintegração e, em mais três ou quatro meses, toda a remoção das 360 famílias – estimou, ressaltando que será necessário revalidar o cadastro das pessoas.
Esse serviço, em parceria com a empresa alemã, se faz necessário pela rotatividade de moradores. Levantamento da prefeitura, em 2010, apontava existência de 1.291 famílias na Vila Nazaré, das quais 360 precisavam ser retiradas urgentemente pelo conflito com a pista.
O estudo serviu de base para quantificar os imóveis necessários para as realocações. Em 2 de abril de 2012,
foram iniciadas as obras no Loteamento Senhor do Bonfim. A previsão de conclusão era dezembro de 2013, mas, conforme Marchesan, quando estava 97% pronto, em 2016, foi invadido.
Mesmo que a reintegração de posse ocorra em março, Marchesan joga para julho a entrada das 360 famílias no Senhor do Bonfim porque a Caixa terá de fazer reformas antes da ocupação legal e definitiva dos imóveis.
A estimativa da prefeitura é de que, com os custos de reparos, seria possível construir, no mínimo, outras 50 unidades avaliadas em R$ 110 mil cada.
Por nota, a Caixa informou que, após a reintegração, “serão realizados estudos técnicos para identificação de possíveis danos nos imóveis e estabelecimento de um cronograma de obras”.
Transferência para dois bairros
O restante das famílias na Vila Nazaré, cerca de 1 mil, será removido para o Condomínio Residencial Loteamento Irmãos Maristas, no bairro Mário Quintana. A ordem para início da construção do empreendimento com 1,2 mil apartamentos e 98 casas foi dada em maio do ano passado. O valor do investimento é de R$ 112,47 milhões do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR).
Outro empreendimento erguido para retirar moradores do entorno do aeroporto Salgado Filho foi o Conjunto Habitacional Porto Novo, no bairro Rubem Berta. Novecentas e vinte e duas famílias já foram removidas. Ainda há em torno de 500 esperando que a Caixa faça os reparos nas 340 unidades que, assim como as do Senhor do Bonfim, foram invadidas em 2016. A reintegração de posse se deu em dezembro de 2017.
– Esses serviços de reparo custam o equivalente a cem unidades habitacionais iguais àquelas – sublinha o diretor-geral do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), Mário Marchesan, citando a necessidade de reposição de vasos sanitários, fiação elétrica, recolocação de piso e consertos internos e externos em geral.
A Caixa informou, por meio de nota, que, “após ação de reintegração de posse realizada em dezembro de 2017, a empresa responsável pela execução do empreendimento Porto Novo realizou a reconstituição do canteiro de obras e a limpeza da área”.
Também esclareceu, no comunicado, que “o levantamento dos danos das unidades habitacionais indica que o prazo para conclusão das obras e legalização dos imóveis é de 12 meses”.
Como a Fraport conseguiu a licença da Fepam
O projeto de extensão da pista, proposto pela empresa alemã, modifica conceitos construtivos apresentados pela Infraero e prevê a realização de drenagem menos impactante e mais eficiente para evitar acidentes. Na licença, a Fepam determina o monitoramento da fauna da região durante a construção da nova pista e também o gerenciamento dos resíduos produzidos.
Para obtê-la, a Fraport apresentou, também, um programa de desapropriação, realocação e reassentamento de famílias que ainda residem na Vila Dique, outra área ocupada irregularmente, mas que não interfere na operação do aeroporto. Além disso, a concessionária firmou termo de compromisso de compensação ambiental com a Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Sema), cujo objetivo é aportar 0,6% do valor investido no empreendimento em duas unidades de conservação - o Parque Estadual de Itapuã e o Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos.
Três licenças da Fepam que a Fraport precisa ter para usar a pista ampliada
Licença prévia (LP): concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção. Atesta a viabilidade ambiental e estabelece requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação.
Licença de instalação (LI): autoriza a obra ou atividade de acordo com as especificações constantes nos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes.
Licença de operação (LO): permite a operação da atividade ou do empreendimento após a verificação do efetivo cumprimento do que consta nas licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.
Cronograma da Fraport
Fase 1B (prazo é de 26 meses a partir de agosto de 2017)
- reforma e ampliação do Terminal 1;
- construção de novo edifício garagem e bolsões de estacionamento, totalizando 4.300 vagas;
- construção de nova subestação de energia elétrica;
- adequação das pistas de taxiamento;
- adequação do sistema de drenagem;
- implantação de novas zonas de segurança de pista.
Fase Runway (prazo é de 52 meses a partir de agosto de 2017)
- ampliação da pista de pouso e decolagem e adequação dos auxílios de navegação.