O aumento no preço da carne bovina que, em alguns cortes, chegou a 35% em apenas duas semanas, pegou de surpresa restaurantes e churrascarias de Porto Alegre. O custo mais alto pelo quilo da carne foi considerado um “banho de água fria” para o setor, que ainda tenta retomar o crescimento após a crise econômica de 2014.
Nas churrascarias pesquisadas por GaúchaZH nesta semana, a dose que salgou a carne também chegou ao bolso do cliente. A elevação nos valores cobrados pelas refeições variou, em média, entre 15% e 20%.
— Subimos três reais no valor do buffet, mas deveria ter sido pelo menos R$ 5. Só a maminha subiu R$ 15 o quilo — conta Edelar Gionavazi, 64 anos.
Gerente da churrascaria Dom Henrique, localizada no bairro Menino Deus, Giovanazi manteve o mesmo cardápio, mas precisou achatar o lucro.
— Se esse aumento fosse gradual, ao longo do ano, seria mais fácil de lidar. Mas foi inesperado — comenta o gerente, que trabalha há 22 anos no local e diz nunca ter vivenciado uma elevação tão abrupta.
A mesma sensação é compartilhada pelo empresário Roberto Majó de Oliveira, proprietário da Fazenda Barbanegra, no Mont’Serrat. Em 12 anos de restaurante, não lembra de outra mudança de preço tão rápida.
— Foi uma ducha de água fria. Estávamos tendo um ano muito bom, conseguindo deixar para trás a crise de 2014, mas perdemos a margem acumulada nos outros meses com esse aumento repentino — observa.
Segundo Oliveira, o quilo do entrecot, corte principal de vários pratos da casa, aumentou 35%.
— É a primeira vez, em 12 anos, que meu cardápio tem etiquetas coladas no local dos preços. Parece aquele tempo da inflação descontrolada, quando o valor das coisas mudava constantemente — recorda.
Mesmo assim, o empresário garante que, caso haja diminuição no valor da carne bovina, o preço das refeições também irá cair.
— Temos esperança de redução. Enquanto isso, já estamos analisando o cardápio e pensando em incluir outras opções — antecipa.
Os restaurantes Dado Garden Grill, que possuem unidades em shoppings da Capital, reajustaram os valores cobrados pelas refeições a partir desta sexta-feira (13), devido ao aumento de cerca de 30% nos custos. A supervisora de Suprimentos, Viviam Belmonte Conzatti, diz que o impacto final ao cliente será de aproximadamente 4,5% de alta.
— O impacto para nós foi bem grande. Como o nome do restaurante já diz (Dado Garden Grill), o setor que mais tem destaque é o das carnes, então não conseguimos variar muito o cardápio. Conseguimos variar nas demais ilhas que compõem o restaurante, como nos pratos quentes e saladas — destaca.
Churrasco mais caro, mas com a mesma qualidade
Na churrascaria Freio de Ouro, localizada no bairro Menino Deus, o preço do espeto corrido subiu 15%, mas não afastou a clientela. Conforme o gerente Marco Antônio Pereira, 35 anos, a qualidade e a diversidade de cortes segue a mesma.
— Não temos como mudar o cardápio, pelo contrário, temos sempre que melhorar. Temos que entregar um bom produto, uma boa experiência — defende, ao olhar para o lado e mostrar quase todas as mesas ocupadas em pleno dia de semana.
Conforme Pereira, o aumento foi sentido há 20 dias, exigindo o repasse para o consumidor, que ficou com 15% a mais na conta.
— Nossa expectativa é que o valor do quilo da carne volte a baixar no primeiro semestre de 2020, fazendo com que consigamos reduzir também o custo para nossos clientes — afirma.
Carne uruguaia para reduzir perdas
Um empresário do ramo, que preferiu não se identificar, afirmou que está comprando carne de um fornecedor do Uruguai para reduzir o impacto no preço. Mesmo assim, o buffet já foi reajustado em R$ 2. Segundo ele, se dependesse apenas dos frigoríficos brasileiros, seria melhor fechar as portas e antecipar as férias dos funcionários.
Hora de se reinventar
Para o presidente do Sindicato de Hospedagem e Alimentação de Porto Alegre e Região (Sindha), Henry Chmelnitsky, o mercado não está receptível para aumentos.
— Por isso a necessidade de ser criativo, falar com fornecedores e adaptar cardápios — observa.
De acordo com Chmelnitsky, as vendas do setor estão no mesmo patamar que em 2014, quando a crise atingiu em cheio a capacidade de compra dos brasileiros.
— O parcelamento dos salários dos servidores do Executivo gaúcho prejudica muito o setor de restaurantes. As pessoas não sabem quando vão receber e, por consequência, não gastam. E mesmo quem não é servidor público, acaba sendo influenciado por esse ambiente pessimista. Não existe uma alegria, uma vontade de consumir — considera.
A expectativa, para Chmelnitsky, é de que 2020 seja um ano mais promissor e que o preço da carne recue, mesmo que não ao patamar original.
— Esperamos que o governo do Estado consiga aprovar as reformas para que a população volte a ter dinheiro no bolso — finaliza.
Galeto ainda com o mesmo preço
Para quem gosta mais de frango, a boa notícia é que a disparada no preço da carne bovina ainda não refletiu nas galeterias. Segundo o empresário Paulo Geremia, sócio-fundador da Di Paolo, o valor segue o mesmo nos restaurantes da marca.
— Quem depende exclusivamente da carne vermelha é que sofre mais, não teve como segurar e evitar o aumento. Agora, no frango, ainda não tivemos reajuste — garante.
O problema para as galeterias é o combo de reajustes previsto para o início de 2020.
— Só os ovos tiveram 20% de aumento, o milho e o trigo são cotados em dólar. Além disso, temos o dissídio dos trabalhadores e o reajuste dos alugueis — comenta Geremia.
A rede de galeterias Mamma Mia disse à reportagem que não houve aumento no preço do frango, já que trabalha com contrato de um ano com o fornecedor, o que garante a manutenção dos valores cobrados. Por enquanto, não houve nenhum reajuste.