O salto do dólar nas últimas semanas traz motivos de preocupação aos consumidores. A moeda, que chegou a custar R$ 3,66 no dia 1º de fevereiro, passou a subir com o acirramento de conflitos entre o governo Jair Bolsonaro e o Congresso. Nesta terça-feira (21), o dólar finalmente cedeu um pouco, pela primeira vez desde sexta-feira passada. Recuou 1,3%, mas ainda ficou acima de R$ 4, fechando a R$ 4,048. Em um ano, o pulo foi de 11,38%, e, apenas em 2019, de mais de 6%. A disparada já aproxima o câmbio do valor mais alto dos últimos 12 meses, R$ 4,20 no dia 13 de setembro de 2018.
Mais do que estatística, esta elevação pesa diretamente no bolso do consumidor. A escalada da moeda por longo período interfere no preço do combustível, do pãozinho, do arroz, de objetos importados e até da produção da indústria nacional, que muitas vezes utiliza insumos importados.
— O dólar acaba afetando o preço de tudo, seja em razão das importações, seja pelo efeito indireto da alta de combustíveis, que influencia o frete — explica o diretor de câmbio da Ourominas, Mauriciano Cavalcante.
O primeiro impacto já chegou: a gasolina tem sofrido uma sucessão de aumentos definidos pela Petrobras, que leva em conta cotação internacional do barril do petróleo e flutuação do dólar. Nos últimos três meses, a alta nas bombas na Capital acumula 7%, conforme pesquisa da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Quem pretende viajar para o Exterior também precisa reprogramar o orçamento, uma vez que as passagens aéreas, os preços de hotéis e os pacotes vendidos nas agências reagem rapidamente à moeda. Nas casas de câmbio de Porto Alegre, o dólar turismo custa a partir de R$ 4,27 no dinheiro e R$ 4,48 no cartão pré-pago.
— Muitas pessoas que ainda não tinham fechado os pacotes para as férias de inverno têm aguardado um pouco para ver se o dólar baixa ou trocado destinos mais caros por outros mais em conta — explica Rita Vasconcelos, diretora institucional da Associação Brasileira das Agências de Viagem no Estado (Abav-RS).
Efeito nos supermercados
Os alimentos também tendem a ficar mais caros. Muitas matérias-primas usadas pela indústria alimentícia vêm do Exterior, como o trigo, que terá neste ano um índice de importação próximo de 70%, conforme a Câmara Setorial das Culturas de Inverno do Ministério da Agricultura. Isto eleva os custos de produção e interfere no preço da farinha, da massa e do pãozinho, por exemplo.
— Como a economia está em recessão e os supermercados e indústrias mantêm estoques, o repasse do dólar aos preços dos alimentos ainda não aconteceu. No caso do pãozinho, os supermercados têm trabalhado com congelados, o que ajuda a evitar reajustes — explica o presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antônio Cesa Longo.
Pesquisa de preços da Agas, realizada com dados do Índice de Preços ao Consumidor do Instituto de Estudos e Pesquisas Econômicas da UFRGS (IPC/Iepe), mostra que o valor do pão francês caiu em vez de subir em maio, enquanto o valor do pacote de massa com ovos permaneceu igual, e o quilo da farinha de trigo subiu apenas um centavo.
— Mas não vai dar para segurar por muito mais tempo, talvez mais uns 20 dias se o dólar continuar subindo — projeta Longo.
Cavalcante, da Ourominas, avalia que a reaproximação de Bolsonaro com o Congresso nesta semana e o arrefecimento da guerra de palavras e tarifas alfandegárias entre Estados Unidos e China abrem fôlego para que o dólar caia abaixo de R$ 4 nos próximos dias. Se a reforma da Previdência for aprovada, o câmbio poderá cair até R$ 3,60, afirma.
Veja como a alta do dólar impacta as suas contas
Gasolina
O litro é reajustado pela Petrobras conforme a variação internacional do preço do petróleo e a cotação do dólar, já que a estatal importa boa parte do combustível. Atualmente, com a trajetória do barril em alta e o dólar sob pressão, reajustes têm sido constantes: conforme a pesquisa de preços da ANP, o preço médio do litro na Capital passou de R$ 4,45 em março para R$ 4,78 em maio.
Viagens
Os preços dos pacotes turísticos ao Exterior sobem na mesma proporção do dólar, já que as cotações de passagens e hotéis são atreladas à moeda americana. O impacto se estende à compra do dólar nas casas de câmbio, que trabalham com a cotação "turismo", que é mais alta do que a "comercial". Conforme o portal Melhor Câmbio, em Porto Alegre, o dólar turismo custa a partir de R$ 4,27 em dinheiro ou R$ 4,48 no cartão pré-pago.
Alimentos
Apesar da pressão cambial e do preço dos combustíveis, que interfere no frete, o preço dos alimentos têm se mantido estável. Isso é atribuído à concorrência da indústria e aos estoques elevados. Entretanto, a projeção da Agas é que, caso o dólar continue subindo nos próximos 20 dias, o impacto será sentido pelo consumidor, a começar pelo pão, a farinha de trigo, a massa e o arroz.
Itens de higiene e limpeza
Vale a mesma regra dos alimentos: a concorrência e as baixas vendas ainda têm segurado os preços. Entretanto, como a importação de itens como xampus, perfumes e desodorantes é alta, a tendência é que o atual patamar do dólar pressione por uma correção nas próximas semanas.