A exposição de animais na Expointer sempre teve caráter de elite em razão da qualidade genética dos exemplares levados às pistas. Diante dos custos de logística e de permanência no parque Assis Brasil por no mínimo uma semana, a seleção tornou-se mais apurada, com critérios seletivos na escolha de quem irá brilhar em Esteio. A mudança de perfil da mais tradicional feira agropecuária do Brasil fez com que o número de inscritos caísse 35% em uma década – ficando em 3.975 neste ano.
— É uma mudança muito difícil de se opor, porque está baseada em questões econômicas e também em formas alternativas de divulgação, em redes sociais, por exemplo — considera Leonardo Lamachia, presidente da Federação Brasileira das Associações de Criadores de Animais de Raça (Febrac).
Por conta disso, a cifra total de comercialização também não é mais um ponto-chave para a Expointer, que no ano passado alcançou R$ 10,27 milhões em negócios com animais.
— O mais importante é a vitrine da genética. Um produtor que consegue chegar a Esteio tem um cartão de visita importante, que reverbera para muito além dos dias da feira — acrescenta Lamachia.
Com 103 animais inscritos na Expointer, a raça angus teve redução de 18,9% em relação ao ano passado.
— O animal de argola, que participa de julgamento em exposições, exige um manejo diferenciado em relação ao rústico, criado solto no campo. E isso representa custos maiores de mão de obra e alimentação – compara Nivaldo Dzyekanski, presidente da Associação Brasileira de Angus.
O rigor para criar um animal em cabanha está maior também nas propriedades, acrescenta o dirigente.
— Perdemos em quantidade para ganhar em qualidade, é uma tendência. Por isso não falamos mais em criar tantas cabeças de gado por hectare, mas sim produzir tantos quilos de carne por hectare — exemplifica Dzyekanski.
Todo o trabalho feito na Reconquista Agropecuária, em Alegrete, na Fronteira Oeste, procura justamente a produção de bovinos de qualidade – que resultem na carne buscada pelo consumidor, cada vez mais exigente.
– A primeira seleção começa ao pé da mãe, quando o animal nasce. No desmame é feito outro crivo e, na evolução, o animal vai sendo selecionado – explica o produtor José Paulo Dornelles Cairoli.
A propriedade leva 20 bovinos da raça angus à Expointer: sete reprodutores e 13 fêmeas, dos quais oito irão a leilão durante a feira. Os critérios para escolha dos exemplares levaram em conta características como musculatura, formato de cabeça, acabamento de gordura, profundidade de costela e perímetro escrotal.
– Temos de ser assertivos, a competição está cada vez maior. Precisamos de consistência genética para produzir animais harmônicos e uniformes – acrescenta Cairoli.
Expositora em Esteio desde 1996 de forma ininterrupta, a Reconquista Agropecuária acumula dezenas de rosetas de grandes campeões e reservados de grandes campeões.
– Acredito na produção de animais. E é na feira que valorizamos a genética, com julgamento técnico de profissionais respeitados – conclui Cairoli.
Escolha criteriosa dos ovinos
Com um rebanho de cem ovinos texel, o criador Luiz Fernando Nunes escolheu criteriosamente quatro animais para participar da Expointer deste ano. As ovelhas selecionadas têm traseira volumosa, o que significa boa quantidade de carne – aptidão da raça. Olhadas de frente, são largas, com peito avantajado. Com ossos estruturados, os exemplares demonstram capacidade para suportar ganho de peso. Para completar, características estéticas: lombo reto e orelhas sem manchas, demonstrando pureza racial. Tudo para produzir carne de melhor qualidade.
– Escolhi o filé do filé – conta Nunes, proprietário da Cabanha Janda, em Viamão.
Na última hora, o criador acabou desistindo de levar três carneiros:
– Seria um custo desnecessário, pois dificilmente eles se destacariam nos julgamentos.
No ano passado, participou com sete borregas. Expositor há mais de 20 anos, Nunes começou a criação após comprar uma fêmea na Expointer, em 1991.
– Segui a vocação do meu pai, que também era criador de texel e fez grandes campeões em Esteio na década de 1990 – lembra o criador, bancário aposentado.
Com 185 animais inscritos, a raça texel levará o maior número de exemplares entre os ovinos. Serão 37 expositores do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Os julgamentos ocorrem no domingo (25) e na segunda-feira (26), e o leilão é na terça-feira (27) – incluindo o grande campeão e a grande campeã, se o proprietário assim quiser.
– Concentramos as atividades em três dias, justamente para liberar os criadores, muitos profissionais liberais com outras atividades – afirma Enio Müller, presidente da Associação Brasileira de Criadores de Ovinos Texel (Brastexel).
Segundo o dirigente, a feira é importante para dar visibilidade e contribuir com a profissionalização da pecuária, incluindo criadores do Mercosul, mas deveria ser mais curta:
– As pessoas têm cada vez menos tempo. O mundo mudou, está mais dinâmico.
Vacas jovens são priorizadas
Com produção de leite em Anta Gorda, no Vale do Taquari, a Granja Alba leva seis animais da raça holandesa a Esteio. Foram priorizadas vacas jovens, que não estão em lactação, para reduzir o custo com transporte e com mão de obra durante os dias da feira.
– Ainda assim, contratamos seis pessoas para se revezarem e cuidarem dos animais no parque, dia e noite – conta o produtor Maciel Alba, 31 anos.
As vacas selecionadas são filhas de mãe de elite, de linhagem premiada. Entre as fêmeas, duas já conquistaram prêmios recentemente em feiras regionais, em Ijuí e em Soledade.
– Escolhemos as vacas com mais chance de competir nos julgamentos – resume Alba, que trabalha ao lado dos pais, Leoni e Neiva Alba.
Separados do rebanho geral na propriedade, os exemplares recebem cuidados específicos, de manejo e nutrição. Confinadas, elas têm custo 50% superior aos demais animais. Com 36 vacas em lactação, todas criadas a pasto, a propriedade alcança média diária de 28 litros de leite por animal – um pouco abaixo da média estadual da raça em razão de não serem confinadas.
Em mais de 10 anos de participação na Expointer, a granja alcançou o melhor resultado em 2016, com o 3º lugar na categoria fêmea jovem.
Apesar da tendência geral de redução de animais, a raça holandesa aumentou em 50% o número de exemplares inscritos na feira deste ano. Para incentivar a participação de expositores, a Associação dos Criadores de Gado Holandês do Rio Grande do Sul (Gadolando) ficou responsável pela silagem para alimentação dos animais.
– A feira é uma forma de incentivar o produtor, que já enfrenta muitas dificuldades e, mesmo assim, é esperançoso – destaca Marcos Tang, presidente da Gadolando.
O dirigente alerta que a simples participação, embora muito bem-vinda, tornou-se muito cara. Além dos custos com frete, preparação técnica e contratação de tratadores, há também os animais que ficam na propriedade – que precisam ser ordenhados diariamente. Em contrapartida, os produtores ganham em visibilidade genética, negócios e na oportunidade de trocar experiência com outros criadores, acrescenta Tang.
Longo caminho para chegar a Esteio
A participação da raça crioula na Expointer passa por crivos que vão além da seleção de seus criadores. Para chegar a Esteio, os equinos precisam passar por passaportes de morfologia e por classificatórias para a final do Freio de Ouro – realizadas ao longo do ano.
– É tão disputada a seleção que quem consegue não pensa duas vezes na hora de vir, mesmo com os custos elevados – afirma Francisco Kessler Fleck, presidente da Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulos (ABCCC).
De acordo com o dirigente, trazer um exemplar à Expointer custa de R$ 2 mil a R$ 3 mil – dependendo da distância das cabanhas. Com 227 animais inscritos no julgamento de morfologia e 98 cavalos finalistas do Freio de Ouro, além de 88 nas provas jovens e 130 na paleteada, a raça terá mais de 200 expositores de nove Estados brasileiros.
– Tivemos quase mil animais que participaram das seletivas e ficaram de fora – destaca Fleck.
Com quase 20 anos de trajetória na raça crioula, a Cabanha Santa Fé levará um dos maiores números individuais de animais a Esteio – serão 11 na morfologia, dois no Freio de Ouro e três no Freio Jovem. Para participar das competições, os animais foram selecionados levando em conta os critérios valorizados pela raça – como estrutura óssea, pescoço leve, cabeça pequena, bom tórax, formato retangular e cerdas bem cuidadas.
– Chegar a Expointer custa em média R$ 20 mil por ano, para cada animal, somando todas as despesas com a criação e treinamento – revela Gilberto Freitas, proprietário da cabanha com sede em Aceguá, na fronteira com o Uruguai.
Dos 16 animais levados à feira, 12 são descendentes do cavalo JA Impulso, comprado por R$ 1,5 milhão da Cabanha Santa Edwiges, em 2011.
– O investimento nesse cavalo já se pagou, com folga. Seus herdeiros são animais com muita valorização em leilões – afirma o criador.
Advogado, Freitas começou a ter contato com a raça crioula no começo dos anos 2000. De lá para cá, com a ajuda da esposa, Keila Freitas, vem apostando em cruzamentos genéticos que resultem em cavalos e éguas diferenciados – com liquidez e valorização de mercado.
– Fazer investimento na genética certa é a chave do retorno – afirma Freitas, que, além de participar das provas da raça, colocará à venda 21 animais em remate durante a feira.