Criados no interior de Sarandi, no norte do Estado, os irmãos Guilherme e Luis Gustavo Carlot cresceram vendo o pai Altair Carlot trabalhando na lavoura de soja, milho e trigo. Embora já ajudassem nas atividades a campo, planejavam assumir de fato a propriedade após se formarem e acumularem experiência. Mas os planos tiveram de ser antecipados após a morte precoce do patriarca, aos 53 anos, vítima de um infarto.
Três anos se passaram desde a perda inesperada, e Guilherme, hoje com 24 anos, e Luis Gustavo, 21 anos, tomaram as rédeas do negócio — com a mãe, Zilce Martinazzo Carlot, professora aposentada que também precisou aprender a lidar com números, contabilidade e gestão.
— Quando tudo aconteceu, ficamos sem chão. A cooperativa foi nosso alicerce. Foi lá que buscamos orientação para grande parte das nossas dúvidas — conta Guilherme.
O jovem refere-se à relação de confiança criada com a Cotrisal, cooperativa da qual o pai era sócio desde 1990 e que forneceu o suporte para gestão de 210 hectares cultivados com grãos — em área própria e arrendada.
— Logo que perdemos o pai, o técnico da cooperativa vinha todos os dias aqui em casa. Não tínhamos ideia de muitas decisões que eram tomadas no dia a dia, como compra de insumos, venda de grãos e conserto de máquinas — lembra Guilherme.
A vontade de continuar o negócio cultivado pelo pai levou os irmãos a iniciarem juntos a Faculdade de Agronomia, no Centro de Ensino Superior Riograndense (Cesurg), em Sarandi. No 7º semestre, estudam à noite e nos sábados pela manhã. Durante o dia, se dividem nas atividades da lavoura.
— Na faculdade, estamos aprendendo a teoria e, aqui na propriedade, a prática — resume Luis Gustavo.
Essa combinação vem trazendo resultados. Na última safra de soja, os irmãos colheram média de 4.320 quilos por hectare (equivalente a 72 sacas por hectare) — 30% acima da média estadual medida pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Produtividade dos associados acima da média estadual
Com 112 especialistas a campo, entre agrônomos, veterinários, zootecnistas e técnicos agropecuários, a Cotrisal fechou a última safra de soja com produtividade média de 3.320 quilos por hectare (55 sacas por hectare) — 16% superior ao rendimento estadual. Gerente técnico da cooperativa, Márcio Witter explica que a tradicional assistência deu lugar nos últimos anos ao conceito de transferência de conhecimento.
— Hoje, o produtor rural tem acesso a muitas informações. Nosso papel é justamente filtrar tudo o que ele recebe para orientá-lo da forma mais assertiva possível — explica.
Em campos experimentais, a cooperativa testa tecnologias como variedades, fertilizantes e defensivos antes de fazer qualquer recomendação aos mais de 9 mil associados.
— Para a maioria dos produtores, somos a única referência técnica. Por isso, não podemos errar — resume Witter.
Presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Rio Grande do Sul (Fecoagro), Paulo Pires destaca que não há mais espaço para amadorismo em um mercado globalizado cada vez mais competitivo:
— Os números altos que vemos nos resultados das cooperativas são fruto de um profissionalismo crescente.
Segundo o dirigente, a capacitação de todos os setores, da gestão, parte técnica aos produtores, vem sendo intensificada em diversas cooperativas.
— E quem não seguir nesse propósito, ficará pelo caminho — resume Pires.
Capacidade maior para sementes
As estruturas que darão suporte à nova unidade de beneficiamento de sementes da Cotrisal já estão erguidas às margens do km 138 da BR-386, em Sarandi. A obra, com investimento de R$ 20 milhões, quase duplicará a atual capacidade de produção — de 250 mil para 400 mil sacas. Os trabalhos devem ser finalizados até o fim do ano.
— Estamos investindo em processos automatizados e robotizados, aumentando a eficiência — explica Walter Vontobel, presidente da Cotrisal.
Há um ano, a cooperativa concluiu a ampliação da fábrica de ração, onde foram aplicados R$ 8 milhões. A capacidade de investimento vem dos resultados registrados em caixa. Em 2018, a organização alcançou faturamento recorde de R$ 1,9 bilhão — cifra 47% superior ao ano anterior. As sobras (lucro dividido entre os associados) chegaram a R$ 37 milhões.
Embora boa parte do dinheiro venha da venda de grãos, os números foram aumentados também com a captação de leite de 800 produtores e moinho de trigo, além de dezenas de lojas de supermercados, de insumos e de varejo.
— Em boa parte desses municípios, a cooperativa é o principal empregador e gerador de receita fiscal — destaca.
Mas Vontobel reconhece o desafio de aumentar a industrialização, possivelmente por meio de parcerias:
– A dependência de commodities é um risco, por isso buscamos a diversificação das atividades dos associados.
Oportunidade de negócio
Natural de Teutônia, no Vale do Taquari, Niuton Gilberto Dammann mudou-se para Sarandi, no Norte, no final da década de 1980 a convite do então presidente da Cotrisal. Na época, a cooperativa precisava de um profissional para o desenvolvimento de sistemas de informática. A oportunidade de emprego ao jovem de 21 anos transformou-se mais tarde em um negócio, a Tchê Informática.
Trinta anos depois, a empresa com sede em Sarandi e filial em Passo Fundo tem 23 funcionários e outros 15 temporários que prestam serviços de tecnologia da informação a cerca de 15 cooperativas agropecuárias, além de dezenas de prefeituras gaúchas.
— O nosso primeiro impulso veio das cooperativas. Crescemos junto com elas — conta Dammann, 56 anos, sócio-diretor da Tchê Informática, que está preparando agora um sistema voltado à nota fiscal eletrônica do produtor rural.