Por onde passam, os javalis destroem plantações, devorando lavouras inteiras na Serra. A situação fez com que muitos produtores deixassem de plantar milho, por não conseguirem evitar a presença dos predadores.
É o caso do agricultor Aparício da Silva Machado, 57 anos, de Criúva, em Caxias do Sul. Ele substituiu o grão pelo pasto na alimentação do gado.
— No ano passado, não colhi quase nada, perdi mais de cem sacas. Os javalis comeram tudo — conta.
Leonardo Alves Ramos, 20 anos, do interior do município serrano, também desistiu da cultura:
— Já não planto mais milho para não me incomodar com os javalis.
Não é de hoje que os chamados porcos bravos causam danos para a agricultura. Eles comem desde milho, batata, aipim, pinhão e amendoim até pequenos animais.
Abate é autorizado
Não há estimativa do número de javalis no Estado. Segundo o Clube Caxiense de Caça e Tiro, 10 fêmeas podem originar 3,5 mil animais em seis anos. E um único exemplar consegue derrubar mais de 50 pés de milho por dia.
Para controlar a superpopulação, produtores buscaram ajuda para o abate em Caxias e nos Campos de Cima de Serra, autorizando a atuação de caçadores profissionais nas propriedades. No Brasil, a caça foi liberada pelo Ibama em 2013. No RS, o abate está autorizado desde 2001.
O agricultor Nestor Juarez dos Passos, 54 anos, também de Caxias do Sul, assegura que o número de predadores cresce a cada ano.
— Em uma noite, eles podem destruir um hectare de milho — revela.
Na plantação, as clareiras abertas pelos animais são fáceis de ver.
— Eles não têm medo dos cachorros e nem dos tiros que dou para o alto para assustá-los. Chega a ser uma afronta — diz o produtor.
Passos deixou de plantar o cereal como fonte de renda, cultiva uma área de milho apenas para alimentar os animais. Hoje, trabalha com produção de leite e queijo. Os três hectares de grãos cultivados são para alimentar as vacas de leite.
Cerco ao animal inclui cães, fuzis e armadilhas
Ninguém discute a relevância dos caçadores no controle do javali para a agricultura. Atual presidente do Clube Caxiense de Caça e Tiro, Cassiano Bochese atua nas regiões de Caxias do Sul e dos Campos de Cima da Serra e já conseguiu abater 15 animais em uma caçada.
— É a única forma de tentar controlar a população, pois o javali é um predador sem controle ambiental — aponta Bochese.
A estratégia adotada na caça é ir atrás dos animais durante o dia, com o auxílio de cães farejadores. Outra forma são as armadilhas, montadas nas lavouras à noite, quando o javali se movimenta.
Originário da Europa, o javali entrou no RS pela fronteira com Uruguai e Argentina. Ainda nos anos 1980 começaram os cruzamentos com o suíno doméstico.
Plano de controle estadual deve entrar em vigor neste ano
O Plano Estadual de Controle do Javali, criado em 2017, deve passar a valer neste ano. A expectativa é do técnico ambiental da Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Sema) Dênis Patrocínio, que coordena o Programa Estadual de Controle de Espécies Exóticas. Em dezembro do ano passado, foi aprovada a resolução que estabelece as regras de controle de cada espécie.
O programa em nível local só pode ser colocado em prática a partir da adoção do Plano Nacional de Controle da espécie, que ocorreu no segundo semestre de 2017. Agora, a Sema, a Secretaria de Agricultura, o Ibama e a Equipe Javali do Pampa, entre outras instituições, estão debatendo o assunto.
— Sabemos que a questão do javali atingiu grandes proporções — reconhece Patrocínio, ressaltando que há registro da presença desses animais também em unidades de preservação ambiental do Estado.
Desde o ano passado, a Secretaria de Agricultura capacita agentes de manejo populacional do javali (os caçadores licenciados pelo Ibama). A coordenadora do Programa de Sanidade Suína, Juliane Webster, conta que já foram treinados 70 caçadores na região da Serra.