Claudia Gomes é autora e roteirista de TV, cinema e teatro. Também é autora da peça Mãe Fora da Caixa. Mas aqui a história começa quando ela engravidou, há 15 anos, depois de uma vida inteira idealizando a maternidade.
Se o desconforto com o corpo e os meses de repouso forçado haviam sido um incômodo, o mais complicado estava por vir. "O puerpério foi um inferno. Amamentar foi difícil no começo. Tive uma leve depressão pós-parto".
Os inúmeros textos e perfis sobre maternidade real ainda não existiam. E Claudia não se entendia. "Como eu não tinha ninguém para dividir meus perrengues, achava que aquilo só acontecia comigo. E me sentia terrivelmente culpada. Por que eu estava tão cansada e triste justamente quando realizava meu maior sonho, e era para estar tão feliz? Me sentia uma ET."
Claro que havia a explosão de amor e fofura. Mas de todo o resto, parecia quase proibido falar. "Era muito solitário passar por tudo sem compartilhar. As coisas ficaram mais fáceis com o passar dos anos, mas fui acumulando centenas de histórias que seriam trágicas, não fossem cômicas. Um dia escrevi uma delas no meu próprio Facebook. Para minha surpresa, em poucas horas tive mais de três mil curtidas. Veio da Pilar, a minha mais velha, a ideia de fazer uma fan page. Assim surgiu o Humor de Mãe, para fazer graça com a nossa desgraça. E lá se vão seis anos."
Claudia, que também é mãe de Vicente, nove anos, e "boadrasta" de Nina, de sete, tem uma relação próxima com as leitoras do Humor de Mãe, milhares no Instagram e Facebook. "Sinto que, falando as minhas bobeiras, chego em lugares muito profundos e delicados. Através do humor, criou-se uma rede de apoio. Todas as vezes que uma leitora me diz que eu tirei um peso das suas costas, respondo que sou eu quem mais recebo ali. Por causa delas, eu fiz as pazes com a maternidade. Eu não sou uma ET."
A seguir, uma amostra do Humor de Mãe, de Claudia Gomes, para abraçar todas as mães sempre. Textos completos no Instagram @humor_de_mae.
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Hoje a Jurupoca vai piar. Algumas amigas já me perguntaram, tímidas, se de vez em quando eu perco a cabeça com meus filhos. Se dou uns gritos, seguro com mais força, se fico bem loucona. Veja, eu era do tipo que via crianças se jogando no chão num ataque histérico e torcia o nariz.
Ja-ma-is um troço daquele aconteceria comigo. Coisa de gente que não sabia dar educação. Eu não. Eu seria aquele tipo de mãe que bastaria um olhar, para ser prontamente obedecida. Aham. Medalha de ouro em cuspida pro alto. Meus filhos são até educados, nem posso reclamar. Mas são crianças. Já se jogaram muito no chão. Porque criança, às vezes, acorda e pensa: que lindo dia pra fornicar com o juízo da minha mãe. E há também os dias em que o nosso juízo se autofornica sozinho. Seja por cansaço, estresse ou a lista com 72 coisas para fazer antes do meio-dia. Ou tudo isso junto.
Em momentos assim, minha querida, eu grito. Grito, sim. E estou vivendo.
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Mulheres gostosas logo depois de parir – quem são, onde vivem, do que (não) se alimentam. Você quer me ver espumando de raiva, cruze comigo numa banca de jornal vendo alguma revista com famosa na capa e a seguinte manchete: "Fulana mostra a boa forma, 20 dias depois de dar à luz". Tenho vontade de juntar umas mães e fazer um esguichaço de leite materno na porta da editora, seguido de um campeonato de arremesso de fraldas sujas. Mas prefiro canalizar minhas energias para alguma ação positiva. Por isso, limito-me a escrever. E amaldiçoar todas as famosas que se prestam a esse papel, porque eu não sou um espírito tão evoluído assim. Que ardam no mármore do inferno, por prestarem esse desserviço à humanidade.
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Uma mãe lava a outra. Essa semana uma mãe de um amiguinho do meu filho me mandou uma mensagem pedindo ajuda. O marido não conseguiu chegar de viagem a tempo, ela tinha um curso e não tinha com quem deixar o menino. Socorrooooo!!! Mana, nem que eu não pudesse, eu ia dar meu jeito. Sabe quando ia negar um pedido desses? Jamais. Nem é porque eu sou a alma mais pura que já habitou essa Terra, não. (...) Separada duas vezes desde que os dois são bem pequenos (nunca disse que eu era facinha), mãe de dois (com diferença entre eles de cinco anos que conste nos autos!) e raladora profissional de fiofó na ostra, tem noção de quantas vezes fui eu que já gritei socorro?
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A culpa que pariu. Mulher entra em sala de parto carregada na maca. Respira, respira, puf, puf. Cercada de um bando de pessoas vestidas como se fossem dissecar o ET naquele inflável branco. Incluindo o marido. Começou. Um tempo depois, finalmente o bebê é postado no mundo.
– Tá tudo bem com ele, doutor? Qual o Apgar?
(Antigamente perguntávamos se tinham todos os dedos. Ficamos tão bestas!)
– Com ele tá tudo ótimo. A outra é que não tá muito bem.
– A outra?
– Ninguém te falou?
O médico traz um pacotinho.
– A culpa. Nasce junto de cada bebê. Parabéns, agora você é mãe.