Basta dar uma rápida espiada na timeline do Instagram para deparar com uma influencer ou famosa que é a mais nova adepta da chamada harmonização facial. O termo, que ganhou força nos últimos anos, diz respeito a um conjunto de procedimentos estéticos que podem ser feitos no rosto. Os efeitos são muitos: podem auxiliar a minimizar aquelas ruguinhas incômodas, preencher olheiras ou até ajudar a prevenir o envelhecimento precoce.
Mas, nos últimos tempos, a harmonização facial virou febre. Para a dermatologista Fernanda Magagnin Freitag, o fenômeno tem ganhado força pela importância da imagem e da aparência em tempos de redes sociais.
— A busca por um padrão de beleza irreal e, muitas vezes, inatingível, estimula pacientes a procurarem toda sorte de profissionais, muitos sem a devida formação. Em muitos casos, a formação desses profissionais foi feita de uma maneira rápida, talvez não adequada — pondera.
Na prática, o que a médica começou a ver em seu consultório são pacientes que buscam tratamento para os efeitos negativos de um procedimento estético.
— Complicações, muitas oriundas de profissionais não médicos e que antes quase não víamos, hoje são uma constante nos consultórios de dermatologistas. Essas complicações podem ser muito graves, no caso, por exemplo, do preenchedor ser inadvertidamente injetado dentro de um vaso sanguíneo — explica a profissional, que é mestre em Ciências Médicas pela UFRGS e diretora científica da Sociedade Brasileira de Dermatologia do Rio Grande do Sul (SBD-RS).
Outra reclamação cada vez mais comum é de quem se mostra insatisfeito com o resultado dos procedimentos, acrescenta a dermatologista Analupe Webber. Foi o caso do cantor Lucas Lucco, que agora busca reverter os efeitos da harmonização facial a que se submeteu há cerca de um ano. Em entrevista ao Fantástico neste domingo (4), o artista conta que teve sua autoimagem afetada depois que se submeteu à técnica:
— Você se olha no espelho e não consegue enxergar seus traços. Isso é muito ruim. Abala muito nossa autoestima — afirmou ao programa da TV Globo. — Não gosto nem de ver fotos do meu noivado, e isso vai ficar para sempre.
Para ajudar a entender como funciona a harmonização facial - e em que casos promete, de fato, trazer benefícios -, Donna conversou com especialistas no assunto. Confira respostas às principais dúvidas sobre o tema a seguir:
Afinal, o que é harmonização facial?
Ao contrário do que muita gente imagina, não se trata de apenas um procedimento estético. Apesar de ficar conhecido popularmente pelo termo harmonização facial, estamos falando de uma série de técnicas. Com a toxina botulínica, por exemplo, é possível relaxar a musculatura facial. Já com o ácido hialurônico, uma das substâncias mais usadas nos consultórios para a chamada harmonização, é possível restaurar o volume da face perdido com o passar dos anos, preencher vincos e sulcos, modificar o contorno facial ou reduzir a flacidez. O procedimento a ser utilizado varia de acordo com cada caso, explica Analupe.
— Tudo parte de algo que incomoda aquele paciente, independentemente da idade — diz a médica.
Ainda há situações, por exemplo, em que os procedimentos estéticos auxiliam na prevenção dos danos do tempo, acrescenta Fernanda:
— Isso tudo tem o intuito de deixar o paciente mais bonito, se sentindo melhor.
Em que casos a harmonização é indicada?
Quando há necessidade de corrigir questões como falta de simetria na face, por exemplo. Ou para minimizar incômodos como as olheiras, que podem ser amenizadas com preenchimento de acido hialurônico. E, claro, para atender a questões de autoestima do paciente. Mas é justamente nesses casos que é preciso mais atenção, ressalta Analupe:
— Esse tipo de procedimento começou a ser realizado por jovens que querem mudar o rosto. Nos últimos anos, houve uma popularização, e vemos isso com preocupação — pondera.
Fernanda ressalta que é papel do profissional, também, alertar o paciente sobre quando o tratamento não é tão necessário - ou que ele está passando da conta:
— Alguns pacientes nunca estarão satisfeitos com a própria imagem ou tem uma expectativa irreal de resultado. Um profissional ético e experiente não injetará além do necessário. Infelizmente, nem sempre é o que vemos acontecer — ressalta.
Para a dermatologista Analupe, é preciso estar atento justamente à banalização dos procedimentos estéticos - sobretudo, quando se fala de um público mais jovem.
— Parece que todo mundo está ficando com o rosto igual. Se você olhar o Instagram por 15 minutos, há uma tendência à massificação das mulheres. Estão com a região malar bem pronunciada, a sobrancelha arqueada, o rosto mais quadradinho. Você acaba padronizando e criando um problema na cabeça da pessoa, como se fosse uma obrigação (fazer harmonização) — reflete ela, que é diretora da SBD-RS.
Quais são os riscos?
Há chance de você não gostar do resultado, como Lucas Lucco - principalmente, se o procedimento não é feito por um profissional capacitado. Mas há também possíveis riscos para a saúde se a técnica escolhida não for colocada em prática da maneira correta.
Finalizando, Fernanda explica que procedimentos estéticos são uma área de atuação da Dermatologia e da Cirurgia Plástica há décadas. Para tal formação , são necessários 6 anos de Medicina e mais residência de pelo menos 3 anos em período integral. Procedimentos estéticos, quanto bem feitos, são seguros e devolvem qualidade de vida e autoestima aos pacientes. Complicações podem ocorrer sim, pois isso faz parte da Medicina, mas um profissional preparado será capaz de reconhcer prontamente e iniciar o tratamento adequado, minimizando a chance de sequelas.
Fernanda explica que um dos erros mais graves é injetar a substância dentro de um vaso ou de uma artéria da face, o que pode causar uma oclusão vascular.
— Isso é extremamente grave. Pode haver uma necrose na pele. Se o preenchedor migrar para a artéria da retina, o paciente pode ter cegueira. Também há a possibilidade de um AVC (acidente vascular cerebral) e até morte — explica. — Tenho uma grande preocupação com a população que está sendo exposta ao risco, que é difícil de contornar e solucionar depois. São os riscos iminentes de uma aplicação malconduzida.
Nos casos em que há cegueira, por exemplo, o efeito precisa ser revertido em uma hora.
— Procedimentos estéticos, quanto bem feitos, são seguros e devolvem qualidade de vida e autoestima aos pacientes. Complicações podem ocorrer, mas um profissional preparado será capaz de reconhecer prontamente e iniciar o tratamento adequado, minimizando a chance de sequelas — pondera.
Os procedimentos de harmonização facial não são recomendados para mulheres grávidas. A médica Analupe acrescenta que pacientes que doenças em atividade, têm histórico de reações alérgicas e doenças autoimunes também não devem fazer.
Mas, antes de qualquer procedimento, é preciso avaliar o caso de cada pessoa individualmente. Afinal, o que leva aquele paciente a querer modificar seu rosto?
— É preciso se atentar à questão psicológica. Avaliar por que a pessoa quer fazer. Se é para corrigir algo, o que está motivando. Será que ela tem que fazer mesmo? — questiona Analupe.
E se você não gostar do resultado?
Sim, é possível reverter os efeitos de uma harmonização facial - e essa foi a escolha de Lucas Lucco. Para isso, é necessário lançar mão de uma enzima, chamada hialuronidase, que é injetada na área previamente modificada e "dissolve" o preenchedor. Mas não é um procedimento tão rápido assim: são necessárias algumas sessões, a depender da quantidade de substância injetada na face. No caso do cantor, por exemplo, já foram realizadas quatro sessões.
— É um procedimento que precisa ser feito por médicos, pois há risco do paciente ter choque anafilático — lembra Fernanda. — É preciso ter medicações para reverter uma possível complicação no consultório, além de equipamentos como desfibrilador e oxigênio, como determina o Conselho de Medicina.
Os efeitos da harmonização facial costumam durar de 12 a 18 meses - porém, alguns procedimentos, como o preenchimento labial, costumam ter uma durabilidade menor.