A boa alimentação e a pressa são duas coisas que não devem andar juntas. Na correria do dia a dia, muitas pessoas esquecem que cozinhar e comer podem ser fontes de prazer e, sobretudo, de saúde. É exatamente a partir dessa premissa que surge o movimento Slow Food, há mais de três décadas. Criada pelo jornalista Carlo Petrini, na Itália, a associação internacional sem fins lucrativos opõe-se ao conceito de fast-food e defende o prazer gastronômico e um ritmo de vida diferente.
– O Slow Food defende e difunde o conceito da ecogastronomia, reconhecendo as fortes conexões entre o prato e o planeta. Para o movimento, nossas escolhas à mesa interferem nas condições do meio ambiente, na biodiversidade, nas tradições na economia – explica Ivane Favero, uma das fundadoras do Slow Food na serra gaúcha.
Com presença em 160 países, o movimento carrega o lema "bom, limpo e justo". No Rio Grande do Sul, existem 20 comunidades que compartilham os conceitos do Slow Food através de mesas redondas, hortas escolares e a troca de experiências entre produtores, cozinheiros e consumidores.
A proposta que se contrapõe ao fast-food defende que o alimento seja de boa qualidade, fresco e saudável, que venha de uma produção limpa, que não ameace o meio ambiente e a fertilidade do solo, e que os agricultores e produtores tenham condições dignas de trabalho com uma justa remuneração. Além disso, a alimentação deve ser de qualidade e, antes de tudo, um direito humano do qual ninguém deveria ser privado.
– O que escolhemos comer, enquanto indivíduos e sociedade, nos torna cúmplices de uma forma de produzir e distribuir, que apoiamos e permitimos com nossas ações e nossos recursos. Comer é um ato político, e é responsabilidade de todos compreender e exercer o direito de participar ativamente nas tomadas de decisões e na mobilização da nossa capacidade intelectual e produtiva. A comida precisa ser significativa, ser fonte de prazer e comprometida com a responsabilidade socioambiental – afirma Ivane.
O Slow Food apoia a agricultura familiar em pequena escala, o extrativismo sustentável dos povos tradicionais e indígenas, a pesca artesanal e a pequena criação de animais.
RESTAURANTES NO ESTADO
No Brasil, o movimento ganhou força há mais de 10 anos e segue ganhando muitos adeptos. No Rio Grande do Sul, temos alguns exemplos de restaurantes que seguem os preceitos do Slow Food, como o Mandarinier, em Porto Alegre, o Valle Rústico, em Garibaldi, e o Restaurante Colheita, em Pinto Bandeira.
O chef Rodrigo Bellora é o proprietário do Valle Rústico e também é o líder do Slow Food na serra gaúcha. De acordo com ele, o cliente percebe o movimento ao provar o prato, mas é preciso passar o conceito através de pesquisa e do cuidado com o alimento, algo que seja simples de entender.
– Sempre buscamos falar sobre a origem de todos os ingredientes e a relação com os produtores, entregando o melhor de cada alimento na época certa. O nosso menu degustação é confiança, e isso permite que possamos fazer alterações quase que diárias, sendo fiéis ao conceito Slow Food na utilização dos alimentos frescos sempre – afirma o chef.
Nós conversamos também com o chef Giordano Tarso, nome à frente do Colheita, que apresenta uma gastronomia sazonal, campestre e gaúcha para a Serra. O lugar, especializado em carnes e charcutaria, instiga a confiança dos clientes ao oferecer um “menu não-menu” com almoço em estilo degustação.
Os ingredientes são, em sua maioria, orgânicos e de produção hiperlocal - ou seja, cultivados pela própria equipe ou comprados de produtores vizinhos. O cardápio é renovado toda semana, trazendo o frescor dos ingredientes que estão em abundância no momento.
De acordo com o chef, no Estado, existe a compreensão sobre o valor por trás dos ingredientes nativos, mas essa ideia ainda pode, e deve, ser difundida para além dos pequenos grupos e associações ecológicas:
– Sempre teremos a necessidade de ampliar ainda mais esse debate, porque a alimentação é uma atividade inerente a todos nós. Quando não refletimos sobre nossas escolhas, alguém tomará decisões por nós. Qualquer pessoa pode se tornar um membro Slow Food agora mesmo e começar ou ampliar seu aprendizado sobre os sistemas alimentares de forma coletiva – explica.
No restaurante, uma parte importante do que é servido nos pratos, como legumes, temperos, frutas e saladas, são plantações próprias. O restante, como as carnes, farinhas e alguns outros ingredientes, que não são possíveis de produzir no local, vêm de pequenos produtores, em sua maioria com certificação orgânica. A carta de vinhos, por exemplo, prioriza bebidas de Pinto Bandeira e, com algumas exceções, de Bento Gonçalves e Garibaldi.
– Existem dois momentos em que nossos clientes podem observar os preceitos Slow Food dentro do Colheita. Em nossa proposta de menu e no ritmo do nosso serviço. Do ponto de vista do que é servido, os pratos são sempre criados a partir da disponibilidade de ingredientes, nunca ao contrário. Eu costumo observar nossa despensa e horta, respeitando a sazonalidade e o ritmo da natureza. Por exemplo, tubérculos na safra de tubérculos; frutas amarelas nas suas safras; tomate na época do tomate, e assim por diante. Não existe a compra de pré-preparos, como molhos, massas, caldos. Toda nossa comida parte de ingredientes primários. Além disso, desde o princípio do restaurante, não vendemos água nem refrigerantes, por exemplo. – explica o chef.
Sobre o serviço, Giordano ressalta que o modelo do Colheita é um menu-degustação com pratos surpresas e que exigem do cliente, pelo menos, duas horas do seu tempo. Ou seja, uma experiência hiperlocal e longe da pressa. No momento, devido às medidas de combate ao coronavírus, o restaurante está fechado para atendimento presencial, mas trabalhando com delivery - o menu está sendo divulgado no Instagram.
COLHEITA BUTIQUE SAZONAL
Rua Sete de Setembro, 1.471, no Centro, em Pinto Bandeira
Fone: (54) 98126-8293
@restaurantecolheita
VALLE RÚSTICO
Via Marcilio Dias, em Garibaldi
Fone: (54) 3067-1163
@vallerustico
MANDARINIER
Rua Alberto Torres, 228, no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre
Fone: (51) 3517-7703
@mandarinier