No último final de semana, feriado de 20 de setembro no Rio Grande do Sul, tive o imenso prazer de conhecer um dos lugares mais incríveis que já fui na serra gaúcha. O Parador Hampel, que fica em São Francisco de Paula, é considerado o hotel mais antigo da região, com mais de 120 anos de história, e é daqueles lugares completos. Por isso, antes de começar a relatar a minha experiência por lá, já aviso que quem ainda não conhece, por favor, coloque na lista dos próximos destinos e, de preferência, reserve o final de semana para aproveitar cada cantinho do lugar, vale a pena.
A hospedagem centenária oferece as mais variadas experiências gastronômicas, tudo em meio à exuberante natureza em que está localizada. Hospitalidade, gastronomia e lazer unidos à tranquilidade dos 21 hectares de área nativa preservada são alguns dos pilares do Parador. Antes de mais nada, logo na entrada, uma placa te convida a desacelerar, respirar e contemplar. Um dos maiores lemas do Hampel é não ter pressa, é realmente um espaço para relaxar e, claro, para comer e beber bem.
Falando em comer e beber bem, no final de semana que eu fui, estava rolando um dos maiores festivais de gastronomia do Brasil, o Mesa Ao Vivo RS, realizado pela revista Prazeres da Mesa, que reuniu mais de 46 chefs e pessoas ligadas ao setor para compartilharem suas experiências e receitas em bate-papos transmitidos para o Brasil todo. Entre os nomes presentes estavam Jimmy Ogro, Morena Leite, Vico Crocco, Carlos Kristensen, Marcelo Schambeck, Rodrigo Bellora, Rafael Jacobi e Ricardo Dornelles. Foram dois dias intensos de muita gastronomia, revisitando a história e a comida da região dos Campos de Cima da Serra. Por conta do evento, vale ressaltar que algumas das experiências gastronômicas que eu vou relatar aqui não estão no menu regular do Hampel, já outras são fixas no final de semana.
Ainda falando sobre o lugar, o jeito gaúcho e serrano de bem receber é outra marca registrada do hotel. Desde a chegada na recepção, você já se sente na casa da nona. A estrutura é totalmente sem frescura, mas ao mesmo tempo cheia de charme. É tudo bem rústico, o casarão de madeira onde são servidas as refeições te faz viajar no tempo com itens de decoração antigos, mantendo as origens do lugar. Dá para sentir a história em cada cantinho do espaço. Tanto os ambientes internos quanto os externos são repletos de cadeiras com pelego, que são um convite a se sentar e passar horas por ali. Se estiver frio, não se preocupe que têm várias lareiras e fogueiras espalhadas.
Bom, já que estamos aqui para falar de comida boa, vamos ao que interessa. Todos os menus da casa têm a assinatura do chef Marcos Livi, que é um pesquisador e apaixonado pela gastronomia gaúcha, e está a frente do Grupo Bah, que, além do Parador Hampel, engloba os empreendimentos Veríssimo, Quintana, Distrito Urbano, Brique, C6 Burger, Napoli Centrale e Box Bioma Pampa, todos em São Paulo. Por ser um grande incentivador da culinária sulista, os cardápios e pratos servidos não poderiam ser diferentes, todos valorizam ingredientes e produtores locais e, muito do que é usado na cozinha, é produzido por lá mesmo. Ah, todas as refeições são abertas para o público que não está hospedado no hotel, por isso, é imprescindível fazer reserva antes de ir.
Chegamos no sábado pela manhã e, para abrir com chave de ouro o feriadão, o primeiro almoço que nos esperava era o clássico Alemão do Hampel. Nada mais, nada menos do que um banquete de comida alemã, com tudo o que tem de direito. Como falei há pouco, algumas refeições foram adaptadas por conta do Mesa Ao Vivo, como é o caso do almoço alemão, que foi servido em uma versão reduzida.
Tradicionalmente, o menu Floresta Negra, como é chamado homenageando um restaurante de Porto Alegre que levava o mesmo nome, é servido todo o sábado em 4 etapas: da abertura à entrada, passando pelos pratos principais e chegando à sobremesa, totalizando em 30 pratos. A proposta do almoço é te levar ao velho mundo sem sair da serra gaúcha. O Alemão do Hampel custa R$ 120 por pessoa.
Tudo é servido no centro da mesa para compartilhar mesmo e é reposto quantas vezes você desejar. E, antes que começássemos os trabalhos, Livi explicou como funcionaria o serviço e que a proposta não era para comermos todas as etapas, uma atrás da outra, a ideia é provar os snacks da entrada e dar um tempinho fazendo uma das trilhas da propriedade, depois voltar para os principais e, antes da sobremesa, dar mais uma volta pelo lago e contemplar as belezas do lugar. Não precisa ter pressa para nada, você pode aproveitar o almoço durante o dia todo. Por isso, volto a dizer, não vá para o Hampel com horário para ir embora.
A entrada do banquete já chegou chegando: linguiça bock, weisswurst branca, salsicha Frankfurt, pretzels, pães alemães, cuca, croquete de linguiça Blumenau e uma bandeja com mostardas, molhos, patê de fígado, picles e creem. Só por essa entrada, já tivemos uma noção do que estaria por vir – e olha que essa é a versão reduzida do almoço, com 15 pratos.
Depois de uma caminhadinha e alguns chopes para harmonizar com o típico almoço alemão, pedimos os principais. Mas não pense que você vai escolher um ou dois do cardápio, vem todos à mesa. Foram sete pratos principais – no menu normal são oito – e difícil foi escolher o favorito. Um dos mais inusitados em sabor foi a beterraba defumada com mel, queijo e amêndoas, uma mistura surpreendente. Mas o shinitzel com batata defumada e creme de maionese eu repetiria milhares de vezes – se não tivesse tantos outros para provar. Além desses, tinha barriga de porco com purê de maçã verde e farofa, salada de batata, bucho, goulash com knodel e frango caipira na cerveja com purê de ervilha e vagem.
Ufa! Só aí já estávamos súper satisfeitas, mas, pular a sobremesa não era uma opção, então, depois de mais uma volta pela propriedade, voltamos para o doce. Ah, uma coisa importante é que a mesa fica reservada para ti o dia todo, você pode sair e fazer as trilhas das cachoeiras, que são imperdíveis, e ninguém irá ocupar a sua mesa.
Para a última etapa, três pratos lindos e com doces supertradicionais. Como boa alemoa que sou, fui de primeira no doce de abóbora com queijo colonial, que na primeira garfada me lembrou do que a minha vó faz. A minha mãe que ama um merengue, foi na pavlova, uma sobremesa feita com merengues e coberta com calda de maracujá e frutas. Já o sonho de doce de leite nós tivemos que repartir, porque estava uma delícia.
Depois de mais alguns chopes, fim do nosso almoço, hora de dar uma descansada por que a noite prometia mais orgias gastronômicas.
Para o jantar, tivemos uma típica noite de comida de galpão. Tudo feito no fogão a lenha e em panelas de barro ou de ferro. O sistema aqui era de buffet e essa é uma das refeições que não está no cardápio normalmente. Claro que tivemos que provar um pouco de cada prato. Tinha arroz com linguiça, purê de moranga, feijão, farofas, legumes assados, morcilha com queijo, caldo verde, carnes e várias outras opções de dar água na boca.
Resolvemos sentar do lado de fora e como uma típica noite da serra, estava friozinho, mas as fogueiras aqueciam a noite e, claro, um bom vinhozinho para acompanhar.
No buffet de sobremesas, encontramos doce de batata doce com nata, doce de abóbora, bolinho de chuva com doce de leite e frutas caramelizadas na chapa, feitas na hora. Que bela noite de sábado!
Agora, eu preciso de um parágrafo especial para o café da manhã. Vale a pena acordar uma horinha mais cedo e aproveitar a primeira refeição do dia sem pressa. O café é servido no casarão de madeira e o buffet fica dentro da cozinha aberta. A vontade era de provar um pouquinho de cada coisa, mas começamos pelas frutas, para dar uma equilibrada.
O café preto é passado em um filtro de pano e vem na mesa fresquinho. Depois, partimos para os pães e frios e, para nossa sorte, estavam os croissants estavam recém saindo do forno e os pães de queijo. Eu não sei vocês, mas um bom café da manhã de hotel, para mim, não pode faltar ovos mexidos. E por lá não tem nada de omelete já pronta no buffet, ela é feitinha na hora, você escolhe quantos ovos e quais os ingredientes que quer colocar junto. E logo vem na mesa quentinha e no ponto, com o ovo ainda cremoso. Uma delícia.
Eu não sou muito de doce pela manhã – exceto pelas chimias de figo e de goiaba que eu passei no croissant e no pãozinho de queijo e estavam maravilhosas –, mas a minha mãe provou a nega maluca e adorou. É tanta coisa boa em um café da manhã que eu até me enrolei aqui e já estou no terceiro parágrafo falando sobre ele. Por favor, mesmo que as próximas refeições sejam boas, não pulem o café do Hampel, é uma maravilha à parte.
Depois desse café incrível, precisávamos de uma caminhada um pouco mais longa, já que o almoço seria uma bela feijoada. Fomos conhecer duas das três cachoeiras que ficam dentro da propriedade. As trilhas são superacessíveis e não muito longas, não deixe de ir! É aquele momento de respirar fundo o ar puro e aproveitar para molhar os pés na água e dar aquela energizada.
Como eu comentei, o almoço que nos esperava era uma feijoada daquelas com tudo que se tem direito. Ela também não está no menu regular do Hampel, mas em datas especiais ela aparece e vale completamente a fama que tem. Os petistos já começavam com um caldinho de feijão, bolinho de feijoada, torresmo, bolinho de aipim, pastel de moranga e, claro, uma boa caipirinha para abrir o apetite. Costela, charque, pé, rabo, orelha, lombo, paio, calabresa são algumas das carnes que tinham para provar. E, para acompanhar tudo isso, laranja, farofa, couve, moranga caramelada e arroz não poderia faltar. É para sair com o botãozinho da calça aberto.
Se você acha que acabou por aqui, ainda tinha sobremesa que ficou por conta de um pudim incrível, supercremoso e lisinho, do jeito que tem que ser, uma torta de limão e um queijinho colonial com doce de leite. É, minha gente, um final de semana no Hampel não é para brincadeira, não.
Depois de mais uma tarde de Mesa Ao Vivo RS, com chefs incríveis compartilhando seus conhecimentos, o jantar foi uma mistura de México e Estados Unidos. Dessa vez, decidimos comer no espaço interno, já que estava mais friozinho e com o tempo se armando para chuva, mas as comidas estavam sendo servidas lá fora. Eram cinco estações, começando pelas buschettas de brisket, depois pelos tacos e quesadilhas. Na quarta estação, uma massa com frango e, por fim, a estrela da noite: o hambúrguer, que estava muito suculento e saboroso. O famoso simples e bem feito.
Para fechar, um docinho não poderia faltar. A sobremesa era um brownie tostado na chapa do fogão a lenha e, por cima, uma caldinha de morango. Se eu que não sou muito fã de chocolate, achei espetacular, vocês imaginam como estava. E esqueci de comentar ainda que, para embalar a noite, tinha uma banda de blues tocando ao vivo. Música boa, comida e bebida boas, não poderia ter combinação melhor pra uma noite de domingo.
Se vocês acham que no último dia, segunda-feira, iríamos pegar leve, estão mais do que enganados. Como comentei lá no início, fomos no feriado de 20 de setembro, então o melhor ainda estava por vir. Todos os domingos, no Parador Hampel, acontece o A Ferro e Fogo, um projeto criado pelo chef Marcos Livi que reúne diversos assadores unindo técnica, rusticidade e paixão pelo fogo. Neste ano, o projeto completou cinco anos e, excepcionalmente, ocorreu na segunda, em homenagem ao feriado dos gaúchos.
Em torno da brasa e do fogo, 19 assadores se somaram a Livi em uma festa campestre, mostrando técnicas de fogo ancestrais e modernas, em carnes diversas, e celebrando magnificamente a cultura gaúcha da brasa e do fogo. É um espetáculo à parte. Se você não puder ficar hospedado no Parador durante um final de semana, vá para o A Ferro e Fogo em um domingo. A experiência completa custa R$ 198 por pessoa e você pode comer à vontade em todas as estações, incluindo bebidas não alcoólicas e chope artesanal.
De frente para o lago, em um cenário de tirar o fôlego ao ar livre, estavam as oito estações comandadas por chefs apaixonados pelo que fazem. Debaixo de grandes araucárias e outras árvores, se encontravam pequenas ilhas de aço, altamente bem boladas no estilo mais rústico possível, cada uma com um cenário diferente. Como o Livi mesmo diz, mais do que um almoço, é uma grande celebração para viver uma experiência única em contato com a natureza.
Em cada estação que passávamos era uma explosão de sabores diferentes. Entre algumas das várias opções, tinha costelão com farofa de pinhão e vinagrete de butiá, pernil de cordeiro defumado, barriga de porco na brasa com maionese de caju e vinagrete de pimentões, pato laqueado, saladas com PANCs – as plantas alimentícias não convencionais –, e uma ilha de legumes na brasa supercolorida. É um verdadeiro oásis para os apaixonados pela cultura do fogo e da brasa.
E, quando você acha que acabou, a estação das sobremesas está lá te esperando com muitas delícias impossíveis de resistir. Tinha abóbora caramelada, pêra tostada com calda de vinho, pastel de maçã e canela e palha italiana. É opção para todos os gostos mesmo.
Que baita final de semana em um verdadeiro paraíso! Que venham os 10 anos do A Ferro e Fogo e mais 100 do Parador Hampel. A única sensação que ficou é a de que já estou querendo voltar para ter outras experiências gastronômicas incríveis como essas. Obrigada, chef Livi e equipe do Hampel!
PARADOR HAMPEL
Rua Boca da Serra, 445 - Indianópolis, em São Francisco de Paula
Fone: (54) 3244-1363
@paradorhampel