Além dos humoristas que representam os descendentes italianos, há um nicho de comediantes que enveredam para o lado do salsichão e do chucrute da colônia, com trocas da letra "B" pelo "P". O paranaense Cleiton Geovani Kurtz, morto em 2015, ficou conhecido pelo personagem alemão Willmutt (morto em 2015 após um acidente de trânsito), que passava trotes telefônicos com sotaque carregado. Outro humorista que se destacou foi o Alemão Von Mitsen, personagem radiofônico criado por Olidio Volpato.
Desde 2010, Diego Horbach interpreta Albino Wallsmaia. Natural de Quinze de Novembro, noroeste do Estado, ele tem 31 anos e passou por diferentes ocupações antes de virar humorista – entregou jornal, trabalhou em farmácia e estofaria...
— Trabalhava com meu pai, às vezes, como servente de pedreiro. Fui também trabalhar com um chiqueirão de porco ainda. Eu fazia o parto das porcas — relata.
Ao ouvir do repórter uma expressão "que legal!", ele rebate:
— Legal nada, eu passava o dia rapando chiqueiro. O cara fedia a estrume de porco (risos).
Entre sua infância e adolescência, Diego participava de peças teatrais dirigidas por sua irmã, Patrícia Horbach. Ele criou o personagem Albino para passar trotes, estilo Willmutt, como uma brincadeira entre amigos. Com a repercussão, começou a trabalhar em programas de rádio e a fazer apresentações. A inspiração para o personagem sempre esteve ao seu redor:
— Meus familiares e também os habitantes daqui da região que têm dificuldade com a língua portuguesa. Vou a uma festa de comunidade, e aí é só ficar reparando nas figuras aqui. Acho que 70% é de origem alemã. Minha avó e minha mãe aprenderam alemão antes do português.
Albino Wallsmaia é um senhor com "78 anos bem vividos". Em seu show, conta sua história de vida – infância, juventude, a época que foi para cidade, como conheceu a esposa e seus problemas da terceira idade.
— As pessoas se veem nele, se identificam. Muitos conhecem alguém assim, no seu jeito de falar, nas expressões usadas — aponta.
Em 2012, ele foi selecionado entre humoristas de todo o país para participar do quadro Jogo da Comédia, do Domingão do Faustão, do qual foi o vencedor. De lá para cá, também iniciou a produção de vídeos para a web, abordando uma visão do colono alemão diante do mundo contemporâneo. Essas gravações ele realiza solitariamente.
— Tenho uma lente cinquentinha (50mm) que ajusto na mão. É difícil encontrar alguém para ajudar. Tem de se virar. Aprendi fazendo, pois não tinha noção de edição ou posicionamento de câmera. Se você olhar os primeiros vídeos, tá louco! (risos). Muito Ruim. Cada dia aprendo um pouco.
Esse trabalho na web já o levou para outros Estados da Região Sul chegando até o Centro-Oeste.
— Muitos conheciam meu trabalho lá em Sinop (MT), por exemplo, por causa do WhatsApp — sublinha.
Mirando o Brasil
Outro humorista que representa o colono alemão é Lucas Pereira, 46 anos, com Seu Aníbal. Natural de Ibirubá, noroeste gaúcho, ele vive em São Miguel do Oeste (SC) há 18 anos, onde trabalha como comunicador da Rede Peperi. Lucas criou o personagem quando integrava a Rádio Atlântida, em Cruz Alta, e o levou para o programa Talk Show.
— Seu Aníbal é uma homenagem ao colono e ao idoso. É um humor que consegue chegar a todas as faixas etárias, as crianças adoram. Tem uma personalidade mal-humorada. Ele xinga bastante. Reclama quando dizem que a terceira idade é a melhor idade. Para ele não é: era melhor quando era mais novo — explana.
Lucas também é autor de outros personagens relacionados ao Rio Grande do Sul: Jimi, que ele descreve como um porto-alegrense caricato — "meio Charles Master, saca" —, um gaudério e Armando, uma sátira de locutor de rádio. Mas seu maior hit é Aníbal. Tanto que, em 2016, começou a produzir vídeos do personagem. Suas gravações ocorrem por meio de parcerias com produtoras na chácara de um amigo. Ele também faz shows encarnando o personagem.
— Seu Aníbal veste uma roupa que é típica do colono: camisa vermelha, calça marrom e sandália de couro. Você encontra vários assim por aqui. Meu pai se veste desse jeito. É uma maneira de a gente se identificar. Todo mundo resgata coisas da família com o personagem, principalmente gente que está morando em uma cidade maior, lembra um pouco das suas origens — analisa Lucas.
O humorista acredita que esse humor colono pode ganhar o país.
— São muitas cidades onde temos reconhecimento e conseguimos fazer shows. Assim como os comediantes do Nordeste conseguem emplacar fazendo um humor típico, e as pessoas entendem mesmo sendo proveniente de um universo bem deles, talvez a gente consiga nosso espaço maior falando das nossas coisas. Até por ser uma característica nossa, talvez gere uma curiosidade — opina.
Piadas no DNA
Com 58 anos, todos vividos em Lajeado (RS), Mauricio Pflugseder é aposentado. Formado em violão clássico, ele foi músico por 32 anos. É compositor tanto em português quanto na língua alemã. Desde 2008, Mauricio também é o Alemão de Lageode, que conta causos em dialeto "hunsrückisch".
— Sou de uma família de contadores de piada, meu pai e avô eram. Eu costumava contar causos para para os amigos, e eles passaram a me incentivar a gravar um CD — lembra o humorista.
Depois do primeiro registro em CD, vieram mais 10, totalizando 11, além de três DVD's de shows. Também lançou um livro intitulado Causos da Colônia, com edições em alemão e português.
— Me visto de um alemão colono que conta as histórias de seu passado. É um personagem que resgata e mantém um pouco viva a história da colonização alemã contando causos de caça e pesca, do cotidiano, que aconteceram ou não na vida dos colonos alemães — especifica.
As apresentações de Mauricio costumam ser realizadas no dialeto. Quando o contratante pede, ele faz um português com sotaque:
— Um causo contado em alemão se torna mais engraçado. Muitas piadas traduzidas perdem a graça. Para quem entende alemão, dá mais liga — destaca. — O meu humor é de família. Não é apelativo, não tem pornografia, não tem palavrão, nada de homofobia. É mais leve e bem aceito. É como se o personagem fosse a graça o objeto da piada.