Bebida símbolo do Rio Grande do Sul, vinhos e espumantes, são destaque nas ceias de Natal e Ano Novo. Entre um brinde e outro, o país tem apreciado cada vez mais o néctar extraído dos vinhedos da Serra gaúcha.
O reconhecimento da qualidade, por sua vez, está diretamente relacionado ao trabalho do enólogo. Ele é o profissional responsável por acompanhar os vinhedos e assinar rótulos, incluindo a gerência de vinícolas, treinamento para degustações, condução do produto no mercado e até mobilizar ações do setor do turismo.
A capacidade sensorial de analisar o vinho pelo aroma tem ajudado a popularizar a imagem do profissional que gira a taça, aguça os sentidos e dá nota à bebida. No entanto, essa é uma das últimas etapas de um processo que tem muito estudo envolvido.
A primeira de sete escolas do país que atualmente ensinam a arte de elaborar bebidas a partir da uva está no campus de Bento Gonçalves do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS). Desde 1962, mais de 1,2 mil profissionais foram formados em um curso que evoluiu conforme a necessidade do mercado.
Professor de viticultura, o engenheiro agrônomo Leonardo Cury aponta uma grande demanda por enólogos devido à abertura de projetos que incluem cultivo da uva e elaboração de bebidas no centro-oeste e nordeste do país.
— No Rio de Janeiro há mais de cem projetos, Espírito Santo e Goiás também estão no mapa. O enólogo é um profissional bem completo que precisa ter noções de química, fisiologia vegetal, física e economia, mas tem que botar a mão na massa, durante a vindima o pessoal nem dorme direito — enfatiza.
Elaboração, envase e comercialização
Para André Donatti, enólogo do ano eleito pela Associação Brasileira de Enologia (ABE), e formado em Bento Gonçalves, em 1999, ainda há muito o que explorar da profissão para além da parte técnica. Relacionamento com o cliente, gestão e treinamento de pessoal que oferece degustações em vinícolas estão entre as funções que podem ser exercidas:
— Tem um leque grande, na Vinícola Campestre (onde atua há 18 anos, em Vacaria) somos em nove enólogos e cada um desempenha uma função. Trabalhamos em diversas áreas, todas lincadas ao vinho, da elaboração até o envase e comercialização. Acompanhar o vinhedo, por exemplo, é muito importante, porque, se tivermos uma uva de qualidade, faremos vinhos de excelência.
Gestão e normas de qualidade
A UCS lançou em 2023 o curso superior de Tecnologia em Viticultura e Enologia, que, além de capacitar para a elaboração da bebida, trata de temas como a precificação do produto depois de pronto.
Para a coordenadora do curso, Bruna Dachery, enólogos precisam ser capazes de implementar uma vinícola do zero:
— É um profissional que trabalha no campo e na vinícola, que sai da universidade com conhecimento sobre gestão e normas de qualidade. Não é só produzir vinho, precisamos entender toda a dinâmica do mercado para vender e o obter lucro.
Saiba mais
- O curso da UCS fica junto à Escola de Gastronomia, em Flores da Cunha, e tem currículo dividido.
- Cerca de 60% das aulas são feitas em Flores, 30% em Caxias e outros 20% na modalidade de EaD.
Laboratório exclusivo para análise de vinhos em Caxias
Há 22 anos, amostras de todo o país chegam ao Laboratório de Referência Enológica Evanir da Silva (Laren), em Caxias do Sul, para serem atestadas as normas de qualidade exigidas para a elaboração de vinhos, espumantes e sucos. As bebidas devem atender padrões de identidade e qualidade como teor alcoólico, acidez total e quantidade de açúcar.
Embora seja composto atualmente por biólogos, engenheiros agrônomos e estudantes de biomedicina, as análises poderiam, segundo o responsável técnico, Plínio Manosso, tranquilamente serem feitas por enólogos.
— Hoje é um trabalho feito por outros profissionais, o enólogo tem o vinho para produzir e precisa fazer da forma correta, se não a fiscalização, a partir de denúncias ou suspeitas, vai mandar para cá. Se não houver qualidade, vira vinagre — diz Manosso.
Laboratório oficial da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi) para análises físico-químicas de vinhos e derivados da uva e do vinho no país, o Laren é a evolução do Laboratório de Enologia de Caxias do Sul.
Foi criado para dar condições para o produto brasileiro competir com os vizinhos do Mercosul e coibir fraudes comuns no passado, como a utilização acima do permitido de açúcar de cana no vinho.
— Identificamos aqui a quantidade de álcool obtido a partir da fermentação do açúcar da uva e do açúcar de cana. No Brasil é permitido, quando a uva não amadurece, corrigir em até 3% com açúcar de cana. Antes de 2001, não conseguíamos afirmar analiticamente se havia mais ou menos açúcar no vinho, então alguns exageravam e facilitavam a prática de fraudes.