Na época em que vivia em Porto Alegre e ainda não tinha lançado O Avesso da Pele (Companhia das Letras, 2020), Jeferson Tenório escreveu um artigo reivindicando espaço para escritores negros na Feira do Livro. De lá para cá, foi reconhecido nacionalmente, tornou-se colunista de portais, mudou-se para São Paulo e, nesta quinta-feira (2), às 18h, vai participar de um bate-papo ao lado de outro negro expoente da literatura contemporânea nacional, Itamar Vieira Junior, autor do sucesso de vendas Torto Arado (Todavia, 2019).
Se, no passado, os debates sobre raça e negritude ficavam à margem da programação de eventos culturais, agora a dupla que venceu o Prêmio Jabuti em 2020 e 2021 (antes Itamar, depois Tenório) proporcionará uma das atrações mais badaladas da 69ª Feira do Livro de Porto Alegre.
O encontro ocorre no Espaço Petrobras Carlos Urbim, na própria Praça da Alfândega, entre o Margs e o Memorial do RS, e será mediado por Nathallia Protazio, também uma escritora negra. Cada um deles dará autógrafos após o bate-papo, na Praça dos Autógrafos. Quem quiser acompanhar a conversa, é só chegar ao local, sem necessidade de inscrição prévia.
— É como se fosse uma primavera literária para a literatura negra. É realmente um fenômeno dos últimos 10 anos. E hoje vivemos um cenário como esse, repleto de escritores negros importantes, como Conceição Evaristo, Itamar Vieira Junior e Eliane Alves Cruz. Isso é fruto de uma luta histórica reivindicando espaço — sublinha Tenório.
Carioca que viveu em Porto Alegre por mais de três décadas, Tenório conseguiu, com O Avesso da Pele, fazer um drama delicado e impactante sobre racismo e violência policial. Ao repassar a vida de seu pai, morto em uma abordagem da polícia, Pedro, o protagonista, percebe que ao herdar a cor da pele, também herdou medo, limitações e inseguranças.
— As pessoas brancas que leem O Avesso da Pele se surpreendem com a sofisticação do racismo. Se dão conta que o racismo está em lugares que elas nem imaginavam. Agora essas pessoas entendem a importância de serem antirracistas — diz Tenório, sobre o impacto do livro.
Morando em São Paulo desde que se tornou sócio da editora gaúcha Diadorim, que transferiu parte de suas operações para a capital paulista a fim de ganhar mais espaço no mercado nacional, Tenório está debruçado sobre seu próximo livro, cuja história adiantou brevemente para GZH:
— Contará a trajetória de três estudantes negros em uma universidade federal. Se passará em algumas cidades, principalmente Porto Alegre.
Já com Torto Arado, Itamar Vieira Junior fez com que uma história sobre um povoado negro que ainda luta por um pedaço de terra mesmo após o fim da escravidão fosse um sucesso de vendas na Amazon em 2021. Seu romance de estreia venceu não só o Jabuti, mas também os prêmios Oceanos e Leya. Ele retorna a Porto Alegre após lançar seu segundo romance, Salvar o Fogo, em maio deste ano.
Nathallia, pernambucana radicada em Porto Alegre e autora da reunião de contos Pela Hora da Morte (Jandaíra, 2022), acredita que, mesmo faltando muito espaço a ser conquistado pela população negra, o caminho construído até aqui não deve ser invalidado.
— Quando pensamos mais no que falta do que no que alcançamos com nossos esforços coletivos, o pessimismo ou o cansaço tomam conta. Eu prefiro focar no festejo deste encontro entre Itamar, Tenório e eu, e tantos outros lindos momentos que são possíveis de serem vividos oriundos de muita luta. A revolução tem de ser também uma festa — celebra a escritora.
Nathallia faz um convite para conhecer a revista Meu Corpo Negro, uma reunião de textos em prosa, poesia e outros relatos de associados do Coletivo de Escritores Negros do Rio Grande do Sul, do qual é coordenador. A obra foi lançada nesta quarta-feira (1°) na Feira do Livro.
— Nós atuamos como um grupo descentralizado. Eu sou coordenadora editorial, mas existem outras frentes de trabalho. Damos visibilidade, produção e aprimoramento da escrita e publicação de negros.
SERVIÇO
- Bate-papo sobre literatura negra com os escritores Itamar Vieira Junior, Jeferson Tenório e Nathallia Protazio
- Quinta-feira (2), às 18h
- No Espaço Petrobras Carlos Urbim, na Praça da Alfândega
- Evento gratuito, sem necessidade de inscrição prévia