Um dos principais pensadores do debate público hoje no Brasil, o neurocientista, biólogo, especialista em substâncias psicoativas e defensor de uma urgente preservação da Amazônia, Sidarta Ribeiro acredita que um futuro mais saudável para a humanidade só será possível quando a competição entre fortes e fracos for superada e o conhecimento de povos ancestrais for valorizado. Ele esteve na Feira do Livro de Porto Alegre na noite desta segunda-feira (30), em bate-papo no Espaço Força e Luz.
A competição e a violência que, no passado, serviram para fazer com que o homo sapiens sobrevivesse são valores que, hoje, na avaliação de Ribeiro, precisam ser superados, já que a humanidade não vive mais em escassez. Pelo contrário: há abundância, só que não é compartilhada.
— Nossos ancestrais foram competitivos e violentos porque havia escassez. Imagina, 50 mil anos atrás, um clã numeroso de homo sapiens dividindo espaço com várias outras espécies de humanos que não existem mais, e a gente resolve que a pouca comida que tem, nós teremos de dividir pela metade e doar para os neandertais ali ao lado. Não era adaptativo fazer isso. A vontade de compartilhar sempre existiu, mas para o círculo íntimo.
Ele também disse que o capitalismo e a ciência, duas das principais forças que moveram a história da humanidade nos últimos 500 anos, não podem resolver problemas éticos e morais que lançam as pessoas em intrincadas questões existenciais.
— A gente não vai encontrar uma bússola moral na ciência, ainda que sem a ciência a gente não saia da confusão. A gente não vai encontrar uma bússola moral no capitalismo, ainda que sem o capital a gente não vá sair do problema. O capitalismo está baseado na ideia competição, de um lado o mais forte e, do outro, o mais fraco. E a ciência também é competitiva, porque trabalha quase sempre a favor do capital. Tem milhares de pessoas fazendo pesquisas sobre como reduzir o impacto ambiental das ações humanas, mas também tem milhares de pessoas pesquisando pesticidas, explosivos e armas — disse.
Na avaliação de Ribeiro, são os saberes de povos antigos, muitos deles vivendo na Amazônia, que podem ajudar a sociedade a persistir pelas próximas décadas vivendo de forma saudável, já que são comunidades baseadas em trocas coletivas.
— Se quisermos ter qualidade de vida, saúde, ar respirável e regime de chuva nem excessivo, nem faltante, precisamos ter uma Amazônia em pé. Temos que olhar para essas culturas ancestrais, mas não de cima para baixo. E sem mistificar, achando que nesses povos estão as pessoas mais sábias. Tem conflito em qualquer lugar. Agora, com certeza, em comunidades indígenas, existem aprendizados coletivos e trocas horizontais que não existem no dia a dia das cidades. Nas cidades, as pessoas correm atrás de tempo, de sobreviver.... Como essa angústia é resolvida? Televisão, pílulas e muito conflito.
Após o encontro, Sidarta Ribeiro autografou seus livros O Oráculo da Noite: A História e a Ciência do Sonho (2019), Sonho Manifesto (2022) e Limiar (2020), todos lançados pela Companhia das Letras.