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A literatura negra foi o centro do debate na Feira do Livro de Porto Alegre na tarde desta segunda-feira (30). O público pôde acompanhar o encontro Teias Literárias Negras: Entrelaçando Narrativas e Culturas, realizado no Auditório Barbosa Lessa, no Espaço Força e Luz (Rua dos Andradas, 1.223), no Centro Histórico.
Com mediação de Luiz Mauricio Azevedo, os autores Fátima Farias, Lilian Rocha e Ronald Augusto compartilharam com os presentes aspectos de suas narrativas, revelando as vozes e perspectivas que, por muitas vezes, foram marginalizadas. Eles abordaram temas como ancestralidade, identidade e resiliência. O escritor Jorge Fróes também participaria da conversa, mas não compareceu.
— A Feira do Livro é um evento que me formou — disse o mediador ao receber os convidados no palco.
Autora de livros como A Vida Pulsa: Poesias e Reflexões (2013), Negra Soul (2016), Menina de Tranças (2018), Agò (2022) e Rochedos Também Choram (2023), Lilian Rocha relatou que participa do máximo de eventos que consegue para marcar presença como uma escritora negra.
— A arte é vida. E a vida pulsa e só se faz pelo movimento — refletiu, dizendo que sempre observa quantas pessoas negras estão nos locais para os quais é convidada.
— A maioria (das pessoas) ainda continua nas (livrarias) pequenas com fanzine debaixo do braço — completou, em relação aos demais escritores negros.
A poeta Fátima Farias, que atua como compositora, produtora e articuladora cultural, contou que a música teve muita influência em sua escrita.
— O que me inspirou mais nas poesias foram os refrões — contou Fátima, salientando que a música era muito presente em sua casa, especialmente por conta de seu pai. — Me inspirava nas letras das músicas, que tinham muita poesia.
Segundo ela, os livros eram muito caros e ela costumava ler gibis na juventude. Em 2023, publicou Santas de Casa, livro de memórias em prosa poética.
— Minha mãe dizia que poesias eram bobagens. Meu pai dizia que eram arte — lembrou ela, que também abordou a questão das cotas na educação e do racismo estrutural em sua fala.
"A literatura brasileira é branca"
Autor de mais de 15 obras, Ronald Augusto atua como poeta e crítico. Em 2023, lançou E mais não digo, uma compilação de textos e comentários sobre temas variados. Em suas colocações no bate-papo, defendeu a literatura como um espaço de liberdade de criação e imersão da linguagem. Também afirmou que a literatura não salva, "tanto que não possui bula", e nem muda o caráter das pessoas.
— Eu não gostaria de tomar um café com Jorge Luis Borges ou Guimarães Rosa (chamados de racistas por Ronald). Mas eu gosto de ler seus livros — argumentou.
Ele ainda questionou o espaço dado a autores negros em eventos, como a própria Feira do Livro.
— A gente precisa dar um pé na porta, às vezes. Porque o sistema é retranqueiro e conservador — criticou ele. — A literatura brasileira é branca. Nossa produção nunca é vista.
No evento, acompanhado por cerca de 40 pessoas, foram lidos trechos das obras de cada um dos três autores que participaram da discussão.
Mais sobre a Feira do Livro
Com o tema "Quem lê, sabe o caminho", a edição deste ano da Feira do Livro de Porto Alegre, que tem o escritor e diretor de cinema Tabajara Ruas como patrono, conta com 69 bancas expositoras, 630 sessões de autógrafos e 155 palestras. O evento, que ocorre na Praça da Alfândega, é gratuito e reúne visitantes de variados lugares. Atrações paralelas são propostas em prédios e instituições culturais nas imediações do evento.
As atividades começam às 10h e encerram às 20h. A unificação do horário é uma novidade em comparação aos anos anteriores. O evento segue de forma ininterrupta até 15 de novembro.