Ambos são tucanos, jovens e adoram política, cada um do seu jeito. Mas hoje, um abismo separa Eduardo Leite e Nelson Marchezan. Um abismo intransponível do ponto de vista político. Nelson Marchezan é candidato à reeleição. Eduardo Leite, não. Creio que ambos falam a verdade sobre seus futuros políticos nos próximos dois anos.
Não é pecado ser candidato. Ao contrário. Ambição, em tese, é positiva na política. Mas Leite e Marchezan funcionam de um jeito diferente nessa hora, condicionados por um momento histórico único, imprevisível e avassalador. No meio da maior crise recente da humanidade, o prefeito de Porto Alegre será julgado daqui a três meses pelas urnas. Esse olhar de curto prazo, compreensivelmente, pressiona Marchezan. Seu horizonte é influenciado por variáveis que se definem em 90 dias, tempo muito estreito para a dimensão do que estamos vivendo. Principalmente porque as decisões impopulares que devem ser tomadas agora fragilizam o gestor público, tornando-o alvo fácil da demagogia e dos interesses individuais.
Por isso, Marchezan deveria desistir de se candidatar à reeleição e se dedicar a combater a pandemia, contrariando interesses de curto prazo e pensando em um julgamento mais distante e mais relevante: o julgamento da História. Impossível fazer o que tem de ser feito e querer aplausos daqui a 90 dias. E, nesse meio tempo, ainda encarar um processo do impeachment aberto pela Câmara Municipal, um desperdício de energia no momento em que UTIs estão lotadas.
Marchezan e muitos outros prefeitos precisam descolar suas decisões do calor do momento e mirar mais longe. Eduardo Leite tem ainda dois anos a separá-lo da próxima eleição para governador, da qual prometeu não participar. Por isso, olha lá para frente, quando os ânimos em relação ao coronavírus tendem a estar mais acomodados e as cobranças serão filtradas por números mais consolidados.
Em uma linha de tempo pré-pandemia, quatro anos era um prazo razoável para organizar uma gestão e mostrar resultados concretos. Agora, diante dessa guinada monumental da História, causada por um vírus, ações e resultados deveriam ser regidos por um cronograma bem mais elástico. Tanto que, em casos de prefeitos de cidades populosas e com graves crises sanitárias, a eventual perda de uma eleição hoje pode, na verdade, ser uma vitória no futuro.