O ano de 1999 foi especial para quem adora filmes com reviravoltas na trama — ou plot twists, como chamam em Hollywood e também pegou por aqui. São daquela temporada três viradas bombásticas e inesquecíveis: a de Clube da Luta, exibido pela primeira vez no Festival de Veneza, em 10 de setembro, a de O Sexto Sentido, que estreou nos EUA no dia 6 de agosto, e a de O Suspeito da Rua Arlington, lançado em 19 de março, no Reino Unido.
Para justificar, alerto que haverá spoilers no texto abaixo (mas devidamente sinalizados).
Dirigido por David Fincher e baseado no romance homônimo do ex-mecânico Chuck Palahniuk, Clube da Luta (Fight Club, 1999) está disponível na Netflix e no Star+. Neste que é um dos mais cultuados filmes da década, Edward Norton e Brad Pitt encarnam personagens antológicos na delirante jornada do sujeito que encontra na celebração da violência uma válvula de escape para sua vidinha modorrenta. Trata-se de um olhar crítico para a sociedade estadunidense, consumista e desinteressada dos valores morais, e de um retrato dos homens que se sentem emasculados nos novos tempos.
Norton encarna o anônimo protagonista e narrador da história. Um bem-sucedido empregado de escritório, ele sofre de insônia crônica e frequenta grupos de autoajuda para pacientes terminais, onde chora e extravasa suas frustações. Encontra algum sentido ao conhecer Tyler Durden (Pitt), um tipo com ideias anarquistas e individualistas que propõe o embate físico como via para recuperar o vigor existencial e a virilidade. Juntos, criam um grupo de brigas clandestinas.
SPOILER SOBRE O PLOT TWIST:
Como sugere o título da canção da banda Pixies (Where Is my Mind?) empregada na trilha sonora, não existe Tyler Durden, ele é só um produto da dupla personalidade do protagonista, que espelha a derrocada humana citada por Fincher ao falar sobre os personagens de Clube da Luta: "Fomos desenhados para sermos caçadores e vivemos numa sociedade de consumidores. Não há nada mais para matar, nada para lutar, nada para vir, nada para lutar".
Em cartaz no Star+, O Sexto Sentido (The Sixth Sense, 1999) é, ainda hoje, o maior sucesso comercial do cineasta M. Night Shyamalan: faturou US$ 672,8 milhões nas bilheterias. Também é o único de seus títulos a ter competido no Oscar de melhor filme — e o único pelo qual Shyamalan disputou a premiação da Academia de Hollywood, nas categorias de direção e roteiro original.
Indicado ao Oscar de ator coadjuvante, Haley Joel Osment interpreta o garoto Cole, que diz ver pessoas mortas e é filho de uma mãe solteira (Toni Collette, concorrente à estatueta de atriz coadjuvante). Bruce Willis faz o papel de Malcolm Crowe, psicólogo infantil que vem socorrer o menino, tentando se livrar do peso de não ter conseguido ajudar um paciente em situação semelhante alguns anos antes.
SPOILER SOBRE O PLOT TWIST:
O grande prazer de rever O Sexto Sentido é observar as muitas pistas espalhadas nas cenas e nos diálogos: o psicólogo está morto, por isso que o guri consegue vê-lo.
O terceiro filme está, infelizmente, à espera de um resgate do limbo digital (mas foi lançado em DVD no Brasil). Com direção de Mark Pellington, O Suspeito da Rua Arlington (Arlington Road, 1999) fecha uma espécie de trilogia informal decorrente do atentado terrorista de Oklahoma City, em 1995, quando uma bomba detonada por radicais de direita matou 168 pessoas. O vilão interno já havia sido tema de Teoria da Conspiração (1997), de Richard Donner, e Inimigo do Estado (1998), de Tony Scott.
Jeff Bridges interpreta o professor de história Michael Faraday, cuja esposa, uma agente do FBI, foi morta por um grupo da extrema direita. Por isso, ele se tornou um sujeito obcecado por terrorismo doméstico — e desconfiado ao extremo. Quando seus novos vizinhos (o casal formado por Tim Robbins e Joan Cusack) começam a tomar atitudes estranhas, Faraday entra em alerta: estará ele diante de uma conspiração ou tudo não passa de paranoia sua?
SPOILER SOBRE O PLOT TWIST:
É bastante engenhoso o final do filme. Sim, o professor universitário estava correto, os vizinhos eram mesmo terroristas. Mas a grande virada é que os personagens de Robbins e Cusack fazem o protagonista entrar para a história como o vilão.