Nos últimos dias, pelo menos cinco filmes badalados de 2023 chegaram às plataformas de streaming, como Barbie, que estreia nesta sexta-feira (15) na HBO Max.
Esses títulos ou eram muito aguardados, ou fizeram muito sucesso nas bilheterias, ou conquistaram a crítica, ou têm aparecido com força nas premiações prévias ao Oscar — ou conseguiram ser tudo isso simultaneamente.
Confira a lista e onde assistir a cada longa-metragem:
Assassinos da Lua das Flores (2023)
De Martin Scorsese. Pela primeira vez em um longa-metragem, depois do curta The Audition (2015), o diretor reúne os dois atores com quem mais trabalhou. É a 10ª colaboração de Robert De Niro, que deu início à longeva parceria há 50 anos, com Caminhos Perigosos. E a sexta de Leonardo DiCaprio, que contracenara com De Niro há 30 anos, em O Despertar de um Homem (1993), de Michael Caton-Jones. A exemplo de Os Bons Companheiros (1990), Cassino (1995), Gangues de Nova York (2002), Os Infiltrados (2006) e O Irlandês (2019), trata-se de um policial que permite traçar um painel histórico dos Estados Unidos e examinar a violência endêmica de sua sociedade. Em foco, desta vez, estão a ganância e o racismo que levaram homens brancos a exterminar indígenas Osage, no Estado do Oklahoma, na década de 1920 - a investigação das mortes ajudou a consolidar o FBI, a polícia federal estadunidense, que tinha surgido naqueles tempos. Esse povo nativo tinha sido expulso de suas terras para uma região rochosa e infértil, mas eles acabaram descobrindo petróleo (como Scorsese reconstitui com seu característico uso da câmera lenta) e enriquecendo (como o diretor mostra mimetizando os cinejornais daquela época). Os Osage ousaram prosperar, despertando o ódio e a cobiça, como aconteceu com a rica comunidade negra de Tulsa, no mesmo Oklahoma, massacrada em 1921 por uma multidão branca (esse episódio também é referido em Assassinos da Lua das Flores).
Na trama de três horas e 26 minutos escrita por Scorsese e Eric Roth a partir do homônimo livro-reportagem de David Grann, DiCaprio interpreta Ernest Burkhardt, ex-soldado que é acolhido pelo tio, William Hale (De Niro, em uma atuação monumental), o Rei, um sujeito de duas caras: posa de amigo dos Osage, mas na verdade só está interessado em se apossar da sua fortuna. Ernest vai se casar com uma indígena, Mollie (Lily Gladstone, o coração do filme), mas, como os típicos personagens scorsesianos, viverá sob o tormento, sublinhado pela música de Robbie Robertson. Tem o corpo e a alma cindidos — "Quase amo dinheiro tanto quanto amo minha mulher", admite. Não há mistério sobre para onde a trama vai, e inclusive há um pouco de reiteração na parte que antecede o epílogo — mas esse epílogo, que conta com a participação do próprio diretor, é absolutamente surpreendente. Com um misto de criatividade e autocrítica, Scorsese aponta tanto para a dessensibilização das pessoas perante os crimes que ajudaram a formar o país quanto para a espetacularização da violência.
Assassinos da Lua das Flores foi eleito o melhor do ano pela National Board of Review, ganhou os prêmios de filme e atriz (Lily Gladstone) da associação de críticos de Nova York, entrou no top 10 do American Film Institute, recebeu 12 indicações ao Critics' Choice Awards e sete ao Globo de Ouro. Nas bilheterias, estacionou nos US$ 155 milhões. (Disponível para aluguel no Amazon Prime Video, na Apple TV, no Google Play e no YouTube)
Asteroid City (2023)
De Wes Anderson. Não fez sucesso de bilheteria (US$ 53 milhões) e quase foi ignorado nas premiações prévias, mas entra na seleção porque o diretor é um dos mais cultuados do cinema contemporâneo. Em seu 11º longa-metragem, Anderson reúne praticamente todas as suas marcas. Do roteiro que assume ser tudo uma encenação — letreiros anunciam a divisão do filme em três atos e a numeração das cenas - à alternância entre verborragia e silêncio. Do esmero na construção cenográfica, na confecção dos figurinos e na escolha de uma paleta de cores nostálgicas à obsessão pela centralização e pela simetria nos planos. Dos personagens de nomes excêntricos (o diretor de teatro Schubert Green, as meninas trigêmeas Andrômeda, Cassiopeia e Pandora) às crianças flagradas em um complicado momento familiar. E há, claro, o elenco estrelado: aos habituais Jason Schwartzmann, Edward Norton, Adrien Brody e Tilda Swinton, por exemplo, se juntam Scarlett Johansson, Tom Hanks, Margot Robbie e Steve Carell. A ausência ilustre é a de Bill Murray — à época das filmagens, o ator havia testado positivo para covid-19 e precisou abandonar o projeto.
A pandemia, aliás, é referenciada, mas não diretamente, afinal, este é um filme de Wes Anderson: suas casas de bonecas são montadas no passado. Asteroid City se passa em 1955. O cenário é a homônima cidadezinha de 87 habitantes situada no meio do deserto dos EUA, próximo a um campo de testes de bomba atômica, e duplamente fictícia: inexistente no mundo real, é uma criação do dramaturgo Conrad Earp (papel de Edward Norton), como nos conta, na abertura em deslumbrante preto e branco, o apresentador de TV encarnado por Bryan Cranston. Na colorida representação de sua peça, o protagonista é Augie Steenbeck, um fotógrafo de guerra interpretado por Jason Schwartzman. Ele acaba de chegar, acompanhado do filho adolescente, Woodrow (Jake Ryan), que vai participar de uma convenção de prodígios da astronomia, e das já citadas Andrômeda, Cassiopeia e Pandora — encantadoras e irreverentes, vividas pelas trigêmeas Ella Faris, Wilan Faris e Graacie Faris. Também é convidada do mesmo evento Dinah (Grace Edwards), filha da atriz Midge Campbell (Scarlett Johnasson). Praticamente todos os personagens ficam hospedados nas cabanas administradas pelo gerente encarnado por Steve Carell. A aparição de um extraterrestre força o general Gibson (Jeffrey Wright) a impor uma quarentena.
Se parece spoiler essa última informação, não se preocupe: ainda há muito por acontecer em Asteroid City. Ou não. Em vez de dar dinamismo, o grande número de paradas, trocas e personagens na narrativa acaba acentuando o distanciamento. Torna frio um filme aparentemente quente (pela ambientação e pelas cores), deixa com menos vida um filme que é justamente sobre a morte. As típicas idiossincrasias e digressões de Wes Anderson podem acabar tirando o foco do grande tema: o luto e como a arte pode nos ajudar a suportar a inevitável finitude. (Disponível para aluguel no Amazon Prime Video, na Apple TV, no Google Play e no YouTube)
Barbie (2023)
De Greta Gerwig. É mais um avanço na carreira da cineasta estadunidense, que começou no cinema alternativo e de baixíssimo custo (Nights and Weekends, longa-metragem de 2008 que ela estrelou e codirigiu, tinha US$ 15 mil de orçamento), tornou-se uma das raríssimas mulheres indicadas ao Oscar de direção por Lady Bird: A Hora de Voar (2016) e assinou Adoráveis Mulheres (2019), que disputou a estatueta dourada de melhor filme. Agora, Gerwig entrou para o time das superproduções: bancado pela Warner, Barbie custou US$ 145 milhões e virou o campeão de bilheteria da temporada, com US$ 1,44 bilhão arrecadados.
Mas Barbie é um raro tipo de superprodução: não tem um herói masculino e, mais do que isso, tem um discurso feminista. E ainda que traga o logotipo da Mattel nos créditos de abertura, nem a empresa fabricante da boneca escapa das críticas nesta sátira escrita pela diretora com o seu companheiro, o cineasta Noah Baumbach. Ao entrar numa crise existencial, começando a pensar em morte e em celulite, a protagonista vivida por Margot Robbie descobre que precisa ir para o mundo real, para encontrar a criança que brinca com ela. O Ken (Ryan Gosling) apaixonado por ela vai junto, e aí os dois percebem que, do lado de cá, há um patriarcado: são os homens que mandam e as mulheres são constantemente assediadas e menosprezadas.
O filme recebeu 18 indicações ao Critics' Choice Awards e nove ao Globo de Ouro, além de entrar na lista dos 10 melhores do ano segundo o American Film Institute e a National Board of Review. (HBO Max)
Indiana Jones e a Relíquia do Destino (2023)
De James Mangold. A crítica não morreu de amores, nem mesmo o público — a bilheteria de US$ 381,5 milhões representa menos da metade da atingida pelo filme anterior da franquia, em 2008. Mas, puxa, esta é a despedida do herói encarnado por Harrison Ford — que, na primeira parte da trama, surge jovem novamente graças à computação gráfica (os efeitos não são perfeitos, mas funcionam). Tinha de entrar na lista de cinco filmaços.
Como boa parte de A Relíquia do Destino se passa em 1969, a figura do caçador de tesouros já não é tão romantizada. Não chega a virar assunto de uma discussão mais politizada, mas rende um comentário jocoso de Helena Shaw, personagem de Phoebe Waller-Bridge. "Você roubou (o artefato)!", protesta Indiana Jones ao vilão nazista Jürgen Voller (Mads Mikkelsen). "E depois você o roubou", retruca o alemão. "E depois eu roubei", diz Helena, para em seguida arrematar: "O nome disso é capitalismo".
O filme empolga no início, ambientado na Segunda Guerra Mundial, mas dá um tremendo sono no meio. No final, uma guinada de rumo é capaz de provocar uma agradável vertigem naqueles espectadores que vão ao cinema para escapar do mundo real e viver a fantasia do impossível. (Disney+)
Oppenheimer (2023)
De Christopher Nolan. Ambição é o que não falta a Nolan e ao protagonista deste épico com três horas de duração (a maior na carreira do diretor), orçamento de US$ 100 milhões e mais de 70 atores no elenco que reconstitui a turbulenta trajetória do físico estadunidense considerado o pai da bomba atômica: J. Robert Oppenheimer (1906-1967), brilhantemente interpretado pelo irlandês Cillian Murphy, em sua sexta colaboração com o cineasta, depois da trilogia do Batman (2005-2012), de A Origem (2010) e de Dunkirk (2017).
Apesar de ser uma cinebiografia ambientada no passado (com três tempos narrativos, como de costume na filmografia do cineasta), Oppenheimer tem a ambição de falar da humanidade como um todo e de dilemas muito contemporâneos. Por um lado, seu protagonista nos lembra como somos complexos e contraditórios: Oppenheimer é egocêntrico, mas também é atormentado por dúvidas e inseguranças (será que a bomba vai trazer a paz — mesmo que pelo medo — que ele imagina?); é um cientista, mas também é um sujeito passional (o que vai render a primeira cena de sexo em um filme de Nolan); é um gênio, mas também é ingênuo ("Como esse homem que viu tanta coisa pôde ser tão cego?", afirma um personagem). Por outro lado, o diretor disse esperar que seu filme sirva de alerta para as empresas de tecnologia: "Quando falo com os principais pesquisadores no campo da inteligência artificial (IA), eles dizem que estão em seu momento Oppenheimer. Eles estão olhando para a história para tentar responder: 'Quais são as responsabilidades dos cientistas que desenvolvem novas tecnologias que podem ter consequências não intencionais?'."
Presente nas listas do American Film Institute e da National Board of Review, Oppenheimer ganhou os prêmios de melhor diretor e melhor fotografia dos críticos de Nova York e concorre em 13 categorias do Critics' Choice e oito do Globo de Ouro. Nas bilheterias, foi o terceiro título com maior arrecadação: US$ 951,3 milhões. (Disponível para aluguel no Amazon Prime Video, na Apple TV, no Google Play e no YouTube)