Adoro terror, mas acho que, justamente porque o gênero é subestimado (são raros os que disputam o Oscar, por exemplo, como O Exorcista e Corra!), alguns títulos acabam superestimados. É o caso do australiano Fale Comigo (Talk to Me, 2022), em cartaz nos cinemas de Porto Alegre desde o dia 17 de agosto.
Trata-se da estreia na direção dos gêmeos youtubers Danny Philippou e Michael Philippou, que ficaram famosos pelo RackaRacka, um canal de comédias de terror ao vivo. Seu primeiro longa-metragem vem sendo incensado como o melhor do gênero no ano — talvez porque a concorrência não esteja tão forte quanto a da temporada passada (Você Não Estará Só, Morte Morte Morte, Não! Não Olhe!, Sorria, Speak no Evil, Noites Brutais, X, Pearl...).
Fale Comigo começa com uma cena de impacto — descrevê-la seria privar o espectador desse impacto, mas dá para dizer que retrata como o hábito de estar sempre com o celular em punho, filmando tudo e a todos, mudou nossa relação com a realidade. A lente é como um anteparo, nos anestesia, nos dessensibiliza. Esta é a primeira grande ideia do filme.
A segunda grande ideia de Fale Comigo vem logo a seguir: a de comparar os rituais macabros a vícios e entorpecentes, como a pornografia ou as drogas. Solidão e urgência são características dos personagens, como expressa o título, praticamente uma súplica.
A protagonista é Mia (Sophie Wilde), 17 anos. Ela está lidando ainda com o luto pela morte de sua mãe, exatos dois anos atrás, e com o relacionamento distante com o pai. Certa noite, ela vai para a casa de sua melhor amiga, Jade (Alexandra Jensen), e o irmão mais novo dela, Riley (Joe Bird), para participar de uma invocação de espíritos organizada por outros dois jovens, Hayley e Joss. Basta segurar uma mão supostamente decepada e embalsamada, dizer "Fale comigo" e, depois, "Eu deixo você entrar". A conexão deve ser cortada em no máximo 90 segundos, para evitar problemas. Mas é claro algo dá errado nessa sessão.
A partir daí, Fale Comigo vira um filme genérico de possessão e trauma, ainda que os Philippou sejam eficientes em criar uma atmosfera lúgubre e não tenham pudores para lançar mão da violência — o trabalho de sonoplastia é admirável. Também é digno de nota o faro mercadológico: os gêmeos australianos revelam apenas o suficiente sobre a história da mão, dando margem para o surgimento de mais uma franquia de terror — previsão reforçada pela cena final do filme, que custou US$ 4,5 milhões e já ultrapassou a marca dos US$ 50 milhões nas bilheterias.