Em cartaz a partir desta quinta-feira (22) em cinco cinemas de Porto Alegre — Cineflix Total (20h20min, em cópia dublada), Cinemark Barra (18h45min e 21h30min), Espaço Bourbon Country (16h50min e 20h), GNC Iguatemi (21h10min) e GNC Moinhos (19h) —, Sede Assassina (To Catch a Killer, 2023) é o primeiro filme feito na América do Norte pelo diretor argentino Damián Szifron, o mesmo de Relatos Selvagens (2014). Também é seu primeiro longa-metragem desde a comédia macabra que concorreu ao Oscar internacional, ganhou da Academia Britânica o Bafta de produção em língua não inglesa e tornou-se um fenômeno de público — na capital gaúcha, por exemplo, virou o recordista de semanas em exibição (37) no saudoso Cine Guion.
Pelo menos dois motivos justificaram esse longo intervalo de tempo entre um filme e o outro. Em 2018, Szifron, "por diferenças criativas", foi demitido da adaptação cinematográfica do seriado O Homem de Seis Bilhões de Dólares (1974-1978), um projeto do ator Mark Wahlberg que ainda não saiu do papel. Depois, em 2020, veio a pandemia de covid-19, que atrasou o início das filmagens de Sede Assassina, realizadas entre janeiro e março de 2021 em Montreal, no Canadá.
Mas a trama escrita pelo cineasta argentino de 47 anos com o roteirista estadunidense Jonathan Wakeham se passa em Baltimore, cidade do Estado de Maryland, nos EUA. É lá que, na impressionante sequência de abertura, 29 pessoas são mortas por um atirador durante diferentes comemorações de Ano-Novo — o matador aproveitava o estouro dos fogos de artifício para disfarçar seus disparos.
Não sabemos quem é o assassino, nem a polícia dispõe de muitas pistas, pois, como afirma o investigador-chefe do FBI (a polícia federal estadunidense), Lammark, esse assassino em massa contraria o senso comum: ele não quer ser capturado, tampouco reflete em suas vítimas suas motivações ideológicas, religiosas, sexuais, racistas etc. Lammark é interpretado com a intensidade e o estranho carisma característicos do ator australiano Ben Mendelsohn, vencedor do Emmy de coadjuvante pela série Bloodline (2015-2017), que aqui deixa de lado seus personagens perturbados, marginais ou vilanescos — vide Reino Animal (2010), O Homem da Máfia (2012) e Rogue One: Uma Aventura Star Wars (2016), além do já citado seriado.
Para ajudar na investigação, Lammark terá a seu lado o agente Jack Mackenzie (o inglês Jovan Adepo, indicado ao Emmy de coadjuvante pela minissérie Watchmen e presente no elenco de Babilônia) e, principalmente, a policial de Baltimore Eleanor, vivida pela estadunidense Shailene Woodley, de A Culpa É das Estrelas (2014) e A Última Carta de Amor (2021). Graças às nuances da interpretação da atriz — ok, e também a alguns diálogos mais expositivos —, o público percebe que Eleanor pode ser a melhor ou a pior pessoa para a missão.
Como de hábito no gênero, o trio enfrentará desafios extras, desde as pistas falsas até a exploração política do caso, e algumas ações do final desafiam a lógica narrativa. Mas Sede Assassina reúne elementos suficientes para envolver o espectador o tempo todo. Os ângulos inusitados da direção de fotografia assinada pelo argentino Javier Julia (de Relatos Selvagens e Argentina, 1985) são realçados pela edição cadenciada do próprio Damián Szifron, que costumeiramente quebra expectativas, e combinam muito bem com a trilha sonora de Carter Burwell. A exemplo do que vimos no seu título indicado ao Oscar internacional, o cineasta é um hábil diretor de elenco e sabe auscultar as entranhas da sociedade, trazendo à tona nossa dificuldade ou mesmo relutância em conviver — tanto uns com os outros quanto com a natureza —, em tolerar, em exercer a empatia. E ao mesmo tempo em que faz um filme sobre a caçada policial a um assassino em massa, Szifron não deixa de apontar a espetacularização da violência e a banalização da morte: por que queremos tanto sangue?