O timing mostrou-se perfeito para a estreia de Guardiões da Galáxia: Volume 3, que entrou em cartaz mundialmente entre quarta (3) e sexta-feira (5). Não à toa, o 32º filme do Universo Cinematográfico Marvel já arrecadou US$ 282,1 milhões nas bilheterias, superando as expectativas em cerca de 10%.
Digo que o timing foi perfeito porque fui ver o longa-metragem escrito e dirigido por James Gunn no começo da tarde de sexta, poucas horas depois de a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarar o fim da emergência global causada pela covid-19. O anúncio foi encarado como um simbólico epílogo da pandemia de coronavírus, que matou pelo menos 7 milhões de pessoas em todo o mundo desde o início de 2020.
De certa forma, o encerramento da trilogia dos Guardiões da Galáxia também simboliza o fim da tragédia sanitária.
Por um lado, as situações retratadas e os sentimentos despertados aludem ao que vivemos ao longo desses mais de três anos. O filme começa justamente com um personagem, Peter Quill, o Senhor das Estrelas (Chris Pratt), não sabendo lidar com seu desgaste mental e emocional, e outro, Rocket Racoon (voz de Bradley Cooper), à beira da morte.
Então, Quill e todos os demais integrantes do grupo — uma relutante Gamora (Zoe Saldaña), o engraçado Drax (Dave Bautista), Groot (voz de Vin Diesel), Nebulosa (Karen Gillan) e Mantis (Pom Klementieff) — correm contra o tempo para tentar salvá-lo.
Na jornada, aparecerão palavras-chave no enfrentamento da covid-19, como empatia, solidariedade, cooperação (o que rende uma das melhores cenas de ação da Marvel nos últimos tempos, com cada herói ajudando o outro no combate a um exército de homens e monstros) e, claro, amor. Não necessariamente o amor romântico, mas aquela forte afeição, decorrente dos laços familiares ou das relações sociais, que nos impele a jamais abandonar uma pessoa e a sempre buscar um reencontro.
Já o vilão da trama, o Alto Evolucionário (interpretado pelo nigeriano Chukwudi Iwuji, que trabalhou com James Gunn na série Pacificador), encarna temores perenes e contemporâneos: é o cientista com complexo de Deus e sem escrúpulos, adepto da tortura e do genocídio. Sua figura remete à de políticos insensíveis e à de empresários megalomaníacos, e seus experimentos permitem pensar no debate sobre os limites da inteligência artificial.
Por outro lado, a energia positiva e as fartas doses de alegria de Guardiões da Galáxia: Volume 3 coincidem com este momento de recomeço da chamada vida normal — a segunda chance é um tema explícito do filme, vide um dos novos personagens, Adam Warlock (Will Poulter, de Midsommar e Dopesick).
Nesse sentido, a trilha sonora — sempre um tesouro nas aventuras da trupe de super-herói — mostra-se escolhida a dedo. A certa altura, toca This Is the Day (1983), clássico do The The em que Matt Johnson canta: "Este é o dia / Sua vida com certeza vai mudar / Este é o dia / Quando as coisas se encaixam".
A canção que embala os créditos finais é Badlands (1978), de Bruce Springsteen, com versos como "Eu acredito no amor que você me deu / Eu acredito na fé que pode me salvar / Eu acredito na esperança e eu rezo que algum dia / Possa me elevar acima disso" (as terras más do nome da música).
Um pouco antes, é a vez de Dog Days Are Over (2008), um hino da banda Florence and The Machine sobre resiliência — "os dias de cão acabaram", diz o título — e sobre como a retomada da felicidade passa por reforçar as conexões familiares (sejam biológicas, sejam sociais): "correr para sua mãe / correr para seu pai / correr para seus filhos / para suas irmãs e seus irmãos".