Dois dos maiores nomes de Hollywood encontraram-se pela primeira vez em O Pecado Mora ao Lado (The Seven Year Itch, 1955): o diretor e roteirista Billy Wilder (1906-2002) e a atriz Marilyn Monroe (1926-1962). O filme é a atração desta segunda-feira (12), às 19h, na Sala Redenção, no Campus Central da UFRGS, em Porto Alegre. A sessão tem entrada franca, mediante ordem de chegada (a capacidade é de 200 espectadores), e faz parte do Ciclo Comédia Romântica, realizado pelo Clube de Cinema de Porto Alegre — após a exibição, haverá debate com Paulo Casa Nova, diretor da entidade.
Wilder dirigiu 26 longas-metragens entre 1934 e 1981 e ganhou seis Oscar: melhor direção e melhor roteiro por Farrapo Humano (1945), melhor roteiro por Crepúsculo dos Deuses (1950), melhor filme, melhor direção e melhor roteiro original por Se meu Apartamento Falasse (1960). Concorreu a outras 15 estatuetas douradas e também recebeu prêmios nos festivais de Cannes e de Veneza.
Era um apaixonado pela palavra, pelos diálogos rápidos, pelo duplo sentido. Com um senso de humor cínico, algo ácido, algo amargo, associou seu nome às comédias, mas foi um cineasta muito versátil: cunhou clássicos em gêneros distintos, do policial noir (Pacto de Sangue) ao filme de tribunal (Testemunha de Acusação), passando pela aventura de guerra (Inferno Nº 17) e pelo drama com crítica social (A Montanha dos Sete Abutres). Seus personagens eram mundanos e ambíguos, às vezes cansados das rotinas (profissionais, domésticas etc) ou até moralmente torpes — gente como a gente. Lidavam com temas cotidianos que costumavam ficar escondidos sob a hipocrisia da sociedade, como adultério e incerteza sexual. Não por acaso, a farsa e o disfarce sempre estavam presentes em suas obras, ora explicitamente, ora de maneira mais sutil. Gostava de criaturas que representam, como se a existência fosse um eterno teatro. Como se todos nós fossemos um pouco Norma Desmond: meio perdidos, meio devaneantes, atuando para não sermos esquecidos, esperando pela redenção, esperando que alguém dê um close na nossa vidinha como naquela última cena de Crepúsculo dos Deuses.
Pois o mundo deu um close na vidinha de Norma Jeane Mortenson, que entrou para a história como Marilyn Monroe. Após o início como modelo pin-up, protagonizou ou foi coadjuvante em 20 e poucos filmes, como Os Homens Preferem as Loiras (1953), Torrentes de Paixão (1953) e Nunca Fui Santa (1956), sem jamais ter sido indicada ao Oscar. Na verdade, passou boa parte da sua curta trajetória tentando provar que era mais do que um símbolo sexual. Também foi uma atriz que soube reinventar a si mesma e que, nos tempos em que os grandes estúdios de Hollywood ainda impunham contratos draconianos a suas estrelas, lutou para ter controle sobre sua carreira, a ponto de criar sua própria produtora.
O Pecado Mora ao Lado foi a primeira parceria entre a atriz e o diretor. Na trama, um marido certinho (Tom Ewell) despacha esposa e filho para uma temporada de férias e cruza com uma nova vizinha. E que vizinha.
Da primeira à última cena, Marilyn Monroe faz despencar queixos, tanto posando de loira tonta e romântica quanto bancando o mulherão lascivo e ronronante capaz de levar o mais centrado dos homens a perder a cabeça. Foi o filme que a consolidou no topo do estrelato e apresentou uma das cenas mais memoráveis do cinema: Marilyn na calçada tendo a saia levantada pelo passar dos trens do metrô de Nova York.
Wilder e Marilyn voltariam a trabalhar juntos em Quanto Mais Quente Melhor (Some Like It Hot, 1959, atualmente disponível para aluguel em Amazon Prime Video, Google Play e You Tube). Após testemunharem um crime, dois músicos (Tony Curtis e Jack Lemmon) se disfarçam de mulher e ingressam numa orquestra feminina que tem como estrela a voluptuosa Sugar Kane — papel de Marilyn, que foi premiada com o Globo de Ouro e levou o cineasta à loucura no set, atrasando as filmagens e esquecendo as suas falas. Se o personagem de Curtis dá um jeito criativo de pegar a loira, o de Lemmon, resignado com sua nova condição, proporciona um dos mais surpreendentes desfechos de todos os tempos.
AVISO DE SPOILER PARA QUEM NUNCA VIU.
Na cena, Jack Lemmon, travestido de Daphne, tenta convencer o ricaço Osgood (Joe E. Brown) de que o casamento entre os dois não daria certo.
— Liguei para mamãe — diz Osgood. — Ela ficou tão feliz que chorou! Ela quer que você use seu vestido de noiva. É de renda branca.
— Osgood, não posso me casar no vestido da sua mãe. Ha ha. É que _ eu e ela, nós não fomos feitas do mesmo jeito.
— Nós podemos alterá-lo.
— Oh, não faça isso! Osgood, eu vou falar de uma vez. Não podemos nos casar de forma alguma.
— Por que não?
— Bem, em primeiro lugar, eu não sou loira de verdade.
— Não importa.
— Eu fumo! Eu fumo o tempo todo!
— Eu não ligo.
— Bem, eu tenho um péssimo passado. Há três anos eu moro com um saxofonista.
— Eu te perdoo.
— Nunca poderemos ter filhos!
— Podemos adotar alguns.
— Você não entende, Osgood! Eu sou um homem!
— Bem, ninguém é perfeito!