Por essa ninguém esperava: em cartaz no Star+ desde sexta-feira (5), O Predador: A Caçada (Prey, 2022), sétimo título de uma franquia que não costuma capturar os críticos, está sendo considerado um dos melhores filmes do ano. No site agregador Rotten Tomatoes, por exemplo, tem 93% de avaliações positivas, contra os 80% do original, lançado em 1987, os 32% de Predador 2 (1990), os 22% de Alien vs. Predador (2004), os 12% de Alien vs. Predador 2 (2007), os 65% de Predadores (2010) e os 33% de O Predador (2018).
Mistura de três gêneros — ação, ficção científica e terror —, a franquia gira em torno não de um herói, mas do vilão das histórias. Criado pelos roteiristas Jim Thomas e John Thomas, o personagem veio ao mundo pelas mãos do diretor John McTiernan, que depois realizaria os igualmente bem-sucedidos Duro de Matar (1988) e Caçada ao Outubro Vermelho (1990).
O protagonista de O Predador — também disponível na plataforma Star+ — é Arnold Schwarzenegger, já um astro de Hollywood após títulos como Conan, o Bárbaro (1982), O Exterminador do Futuro (1984) e Comando para Matar (1985). Ele interpreta um militar encarregado pelo governo dos Estados Unidos de liderar uma equipe para resgatar políticos presos na Guatemala. No país da América Central, o esquadrão descobre que está sendo caçado por uma criatura alienígena brutal, com força sobre-humana e uma incrível capacidade de camuflagem, entre outros recursos biotecnológicos.
Predador: A Caçada foi escrito por Patrick Aison e dirigido por Dan Trachtenberg, realizador do filme Rua Cloverfield, 10 (2016) e do episódio Playtest (2016) da série Black Mirror. É o que os estadunidenses chamam de prequel, ou seja, uma obra ambientada em uma época anterior à da trama original.
A história se passa em 1719, em território dos EUA então ocupado pelos indígenas comanches. A personagem principal é encarnada por Amber Midthunder, 25 anos, a Kerry Loudermilk da série Legião (2017-2019). Trata-se de Naru, a irmã caçula de Taabe, papel de Dakota Beavers, um estreante promissor.
Naru foi treinada para ser uma curadora — e sabe tudo sobre ervas medicinais —, mas o que deseja é ser uma caçadora como Taabe. Ele reconhece o talento da irmã e concorda que ela se junte a uma expedição dedicada a caçar um leão da montanha que atacou um membro da tribo.
A essa altura, já sabemos que animais selvagens não serão os únicos perigos enfrentados por Naru e Taabe — cedo observamos uma nave espacial desembarcar um Predador (vivido pelo ex-jogador de basquete Dane DiLiegro, 2m06cm de altura), que logo dá início a missão de identificar, capturar, matar e colecionar os crânios dos predadores da região (incluindo os humanos).
Pela brutalidade, pela ambientação em florestas e rios e até por elementos do enredo, O Predador: A Caçada faz lembrar de Apocalypto (2006), filme em que Mel Gibson reconstituiu o ocaso da civilização maia ao contar a história de um jovem, Pata de Jaguar, que deixa de ser caça e vira caçador a fim de salvar sua família. A propósito, a ideia inicial de Dan Trachtenberg era que os diálogos fossem todos em comanche (o estúdio 20th Century vetou), o que ampliaria a aproximação com o título dirigido por Gibson, todo falado em iucateque, um idioma ancestral da América Central.
Embora se possa antecipar passos e destinos, O Predador: A Caçada guarda algumas surpresas no desenrolar da trama e tem trunfos que, combinados, o colocam em um patamar bem alto.
Ainda que a computação gráfica deixe a desejar na fluidez de alguns animais, os trabalhos de direção, fotografia, edição, design de produção, som e música tornam o filme muito eficiente na criação de tensão, sustos (eu dei pelo menos dois saltos para trás, um deles acompanhado por um gritinho) e cenas de ação. Para tanto, contribui a sobriedade - praticamente não há momentos de alívio cômico -, mas não faltam sangue nem violência: eviscerações, perfurações e mutilações fazem parte do menu.
Amber Midthunter é extremamente cativante na pele da protagonista, uma herdeira espiritual da Katniss Everdeen da saga Jogos Vorazes (2012-2015) — outra garota que precisa amadurecer enquanto luta pela sobrevivência, alternando brio e fragilidade, esperteza e mancada — e das recentes heroínas inseridas em contextos masculinos, como a personagem de Charlize Theron em Mad Max: Estrada Fúria (2015).
O roteiro não descuida do desenvolvimento de personagens e de outros conflitos dramáticos (para além do prato principal: a caçada do Predador/a resistência ao Predador), inclusive acenando para o comentário político ao introduzir o tema do colonialismo. E merece palmas por não tirar soluções da cartola: todas já haviam aparecido em situações, cenários e objetos apresentados anteriormente, premiando o espectador atento.