Quinta-feira é o dia das estreias no cinema. Nesta semana, as principais atrações são Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, uma das sensações estadunidenses de 2022, e o início da edição gaúcha do 13º Festival Varilux, dedicada a filmes franceses inéditos.
Mas nem só de novidade vive a programação cinematográfica. Encerrando a mostra Cinema Europeu Contemporâneo, o Cine Farol Santander recoloca em cartaz o belo e triste drama russo Uma Mulher Alta (2019).
Confira, abaixo, os 10 melhores filmes para ver nas salas de Porto Alegre (e onde ver).
O Acontecimento (2021)
De Audrey Diwan. Na França de 1963, Anne (Anamaria Vartolomei), uma estudante promissora, engravida. Em nome de seu futuro, ela decide abortar, desafiando a lei em uma jornada solitária. Sessões no Cine Grand Café: 30/6, às 16h30min, e 5/7, às 16h30min. Sessões no Espaço Bourbon Country: 27/6, às 16h20min, e 29/6, às 21h.
Por que ver: recebeu o Leão de Ouro de melhor filme e o prêmio da crítica no Festival de Veneza, em 2021, e ganhou o troféu César de atriz revelação.
Contratempos (2021)
De Eric Gravel. O filme acompanha a saga de Julie (Laure Calamy), que luta sozinha para criar seus dois filhos pequenos no subúrbio e manter seu emprego em Paris, como camareira-chefe em um hotel. Quando ela finalmente consegue uma entrevista para um cargo correspondente a seu currículo e as suas aspirações, eclode uma greve geral, paralisando o transporte. Sessões no Cine Grand Café: 26/6, às 16h40min, 29/6, às 19h, e 6/7, às 21h25min. Sessões no Espaço Bourbon Country: 25/6, às 16h20min, e 28/6, às 18h40min.
Por que ver: ganhador dos troféus de melhor direção e melhor atriz na mostra Horizontes do Festival de Veneza, o filme é muito eficiente em mostrar um problema universal — o da precarização do trabalho — por uma perspectiva individual e muito envolvente ao intrincar os dramas pessoais de Julie aos contratempos coletivos. À segurança e à sensibilidade da direção de Gravel, soma-se o notável desempenho de Calamy, que dosa confiança, fragilidade, perspicácia e um pouco de desatino.
O Destino de Haffmann (2021)
De Fred Cavayé. Na Paris de 1941, durante a ocupação alemã, François Mercier (Gilles Lellouche) é um homem comum que sonha em ter um filho com a esposa, Blanche (Sara Giraudeau). Ele trabalha para um talentoso joalheiro, o Sr. Haffmann (Daniel Auteuil) — que é judeu. O recrudescimento da perseguição nazista força a partida da família de Haffmann e um rearranjo das relações de poder na joalheria, com consequências cada vez mais complicadas. Sessões no Cine Grand Café: 23/6, às 18h20min, 2/7, às 21h30min, e 5/7, às 14h30min. Sessões no Espaço Bourbon Country: 24/6, às 18h40min, e 27/6, às 21h.
Por que ver: se a origem teatral engessa um pouco o filme do ponto de vista formal, por outro lado, permite que o trio de atores se destaque em uma trama sobre o duelo ganância versus integridade no contexto de uma ferida francesa não cicatrizada — a do colaboracionismo na Segunda Guerra Mundial.
Golias (2022)
De Frédéric Tellier. Intercala e entrelaça os rumos de três personagens. France (Emmanuelle Bercot) é uma professora de educação física durante o dia, mantém outro emprego à noite e é uma ativista contra o uso de agrotóxicos, que fizeram adoecer seu marido e pai de sua filha. Patrick Fameau (Gilles Lellouche) é um solitário advogado parisiense que se tornou especialista em direito ambiental. Mathias (Pierre Niney) é um brilhante lobista que trabalha em prol dos interesses dos produtores de diesel e da indústria agroquímica. Sessões no Cine Grand Café: 25/6, às 21h20min, 1/7, às 14h30min, e 3/7, às 17h55min. Sessões no Espaço Bourbon Country: 24/6, às 21h.
Por que ver: Golias retrata um debate cada vez mais quente, o dos agrotóxicos, defendidos por uns em nome da produtividade e da rentabilidade, condenados por outros por causa dos riscos à saúde e ao ambiente. Com paciência, vai construindo uma atmosfera sufocante, marcada pelas imagens contrastantes da elite e da classe trabalhadora e por alguns acontecimentos inesperados, ainda que o quadro geral seja claro. Vale destacar as atuações do trio principal, sobretudo a de Niney (vencedor do César de melhor ator por Yves Saint-Laurent). É impressionante como seu personagem consegue dobrar verdades sem sequer piscar.
Ilusões Perdidas (2021)
De Xavier Giannoli. Por coincidência, no dia da abertura do Festival Varilux de Cinema Francês de 2022, estreia em Porto Alegre este filme que participou da mostra no ano passado. Inspirado no homônimo romance de Honoré de Balzac publicado originalmente em 1837, tem como protagonista Lucien de Rubempré (Benjamin Voisin), um jovem poeta pobre, na França do século 19, que alimenta grandes sonhos. Ele abandona a cidadezinha onde mora e a gráfica de família e se muda para Paris, onde descobrirá um mundo regido pela aparência e ganância. Em cartaz a partir desta quinta-feira (23) no Espaço Bourbon Country.
Por que ver: chega carregado de prêmios e de elogios. Ganhou sete categorias no César: melhor filme, ator revelação (Voisin), ator coadjuvante (Vincent Lacoste), roteiro adaptado, fotografia, design de produção e figurinos. Eu ainda não vi, mas meu amigo Marcelo Perrone, ex-crítico de cinema de ZH, disse o seguinte sobre Ilusões Perdidas: "Impressiona a sintonia da trama com os dias atuais. Na jornada do protagonista, o filme toca fundo na luta de classes e na indústria das fake news. Rejeitado na corte, ele tenta fazer carreira como jornalista. A imprensa da época é alimentada por intrigas e fofocas escritas a favor de quem pagar mais".
O Mundo de Ontem (2022)
De Diastème. Elisabeth de Raincy (papel de Léa Drucker), presidente da República, optou por não disputar a reeleição. Três dias antes do primeiro turno, ela fica sabendo por seu secretário-geral, Franck L'Herbier (Denis Podalydès), que um escândalo do Exterior atrapalhará sua sucessão por um nome de seu partido e dará a vitória ao candidato de extrema-direita, xenófobo de carteirinha. Sessões no Cine Grand Café: 25/6, às 15h, 1/7, às 19h30min, e 5/7, às 20h40min. Sessões no Espaço Bourbon Country: 24/6, às 14h.
Por que ver: o filme toma emprestado o título da autobiografia publicada por Stefan Zweig à época da Segunda Guerra, mas seu tema é atualíssimo — e não só na França. Os bastidores podem não ser tão movimentados quanto os da série House of Cards, mas, em diálogos afiados, o filme pergunta: quais são os limites na política? O que pode e não pode em nome de um suposto bem maior? É possível vencer sem sujar as mãos?
O Próximo Passo (2022)
De Cédric Klapisch. Elise (Marion Barbeau), uma jovem e elogiada bailarina clássica, machuca-se em uma apresentação após flagrar a traição do namorado. Apesar dos especialistas dizerem que ela não conseguirá mais atuar, ela vai batalhar para se recuperar, procurando novos rumos no mundo da dança contemporânea. Sessões no Cine Grand Café: 26/6, às 18h35min, 1/7, às 21h25min, 2/7, às 16h40min, e 6/7, às 15h. Sessões no Espaço Bourbon Country: 25/6, às 18h45min.
Por que ver: Klapisch é o realizador de O Albergue Espanhol (2002) e Bonecas Russas (2005). Sucesso de público na França — já soma mais de 1 milhão de espectadores —, O Próximo Passo tem sido apontado por críticos como um de seus melhores trabalhos, se não o melhor. Embora perca o foco de vez em quando e não desenvolva bem todos os personagens e conflitos, o diretor, quando se concentra no corpo dos atores e dos dançarinos, oferece momentos ora radiantes, ora comoventes, ora engraçados, ora sublimes (vide a surpreendente cena da dança no vento). E é um filme que vem bem a calhar, com seu espírito otimista e a busca de Elise por "uma segunda vida".
Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo (2022)
De Dan Kwan e Daniel Scheinert. A dupla Daniels conta a história de uma imigrante chinesa, Evelyn Wang (Michelle Yeoh), que convive com algumas pressões: a auditoria que a receita federal (a cargo da personagem de Jamie Lee Curtis) faz sobre sua lavanderia, um casamento em crise, a busca pela aprovação do pai e a relação com uma filha que vem se distanciando. Para piorar as coisas, Evelyn descobre sua existência em infinitos universos paralelos e precisa acessar as experiências e habilidades de suas contrapartes para combater a ameaça de um ser maligno. Em cartaz a partir desta quinta-feira (23) nos cinemas.
Por que ver: embora no fundo seja meio meloso, é também o filme mais maluco da temporada. Onde mais se vê pessoas que têm salsichas no lugar dos dedos? Onde mais se vê — e se ouve! — rochas filosofando à beira de um penhasco? Onde mais uma pochete e um dildo anal serão peças fundamentais em impressionantes cenas de ação? Aliás, em que título de ação vamos encontrar referências tão surpreendentes quanto àquelas a Amor à Flor da Pele (2000), romance já clássico de Wong Kar-wai ambientado na Hong Kong da década de 1960, e a Ratatouille (2007), a oscarizada animação da Pixar sobre a aliança firmada entre um rato cozinheiro e um jovem auxiliar em um famoso restaurante em Paris?
Um Herói (2021)
De Asghar Farhadi. O diretor é iraniano e a história se passa no Irã, mas Um Herói entrou na seleção do Festival Varilux porque a produtora e distribuidora, a Memento Films, é da França. Na trama, Rahim (Amir Jadidi) está na prisão devido a uma dívida que não conseguiu pagar. Durante uma licença de dois dias, ele tenta convencer o seu credor a retirar a sua queixa mediante o pagamento de parte da quantia. Mas as coisas não correm de acordo com o plano… Sessões no Cine Grand Café: 28/6, às 18h40min, e 1/7, às 16h55min. Sessões no Espaço Bourbon Country: 27/6, às 18h25min.
Por que ver: com dois Oscar de melhor filme internacional no currículo — A Separação (2011), também vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim, e O Apartamento (2016) —, Farhadi é hábil em lançar mão dos códigos do suspense, do policial e do drama de tribunal para refletir sobre a sociedade contemporânea em seu país e retratar conflitos familiares. Em Um Herói, o cineasta apresenta uma história kafkiana, mas com um protagonista ambíguo. Aliás, seus personagens não são mocinhos nem vilões, mas pessoas que, diante das circunstâncias, do azar, da pressão ou das oportunidades, podem conquistar ou falhar. Nós, como espectadores, somos instigados a nos posicionar em situações complexas nas quais todos os envolvidos têm um pouco de razão — logo, injustiças são frequentes, ainda mais em um mundo ultramidático e apressado como o atual.
Uma Mulher Alta (2019)
De Kantemir Balagov. Na Leningrado dos últimos meses de 1945, a taciturna Ilya, a Grandona (personagem interpretada por Viktoria Miroshnichenko) é uma jovem ex-combatente acometida por um transtorno de estresse pós-traumático. Ela trabalha em um hospital para veteranos da Segunda Guerra Mundial na companhia de outra mulher que lutou contra os alemães, a radiante Masha (Vasilisa Perelygina), que deseja gerar um filho como forma de se afastar da morte. Sessões no Cine Farol Santander, de quinta (23) a quarta (29), sempre às 15h.
Por que ver: antes de encarar Uma Mulher Alta, cabe ao espectador examinar bem seu estado de espírito e sua disposição. É um filme de ritmo vagaroso (o que contribui para sua duração de duas horas e 17 minutos) e triste, muito triste. Mas também é pleno de força e oferece momentos sublimes. Não à toa, Balagov ganhou o troféu de melhor direção na mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes.