Nas ruas de Buenos Aires, só os raros outdoors com as fotos dos candidatos indicam que haverá eleição neste domingo (22). Não são permitidos carros de som, como no Brasil, as pesquisas são proibidas na reta final da campanha e até os comentários nas notícias sobre a eleição estão vedados.
Na tarde deste sábado (21), turistas tiravam fotos em frente à Casa Rosada como num dia qualquer, com apenas uma grade de proteção em torno do prédio. No Obelisco, tradicional ponto de encontro em momentos de protesto ou de comemoração, o trânsito fluía normalmente na Avenida 9 de Julio, que os argentinos se orgulham de ser a mais larga do mundo. No calçadão da Calle Florida, brasileiros aproveitavam o câmbio favorável para se esbaldar nas compras.
Apesar dessa falta de visibilidade da eleição, não há quem esteja indiferente à disputa travada pela sucessão de Alberto Fernandez. Eleitores que optaram por não votar nas primárias, que tiveram uma abstenção de mais de 30%, agora dizem que vão votar para impedir a vitória daquele que consideram a pior opção. Porque empolgar mesmo, só Javier Milei empolga a chamada “nueva derecha”, formada majoritariamente por jovens.
Fernández sumiu da campanha para não prejudicar seu candidato, Sergio Massa, mas paira como uma sombra sobre seu ex-ministro da Fazenda. Foi excluído das fotos, não participou de comícios e se faz de morto porque sabe do tamanho da sua impopularidade.
Mesmo com esse fardo sobre os ombros, Massa aparecia nas últimas pesquisas como o mais provável adversário do excêntrico Milei, vencedor das primárias e líder de quase todas as pesquisas. Por fora corre Patrícia Bullrich, representante da direita clássica, apoiada pelo ex-presidente Maurício Macri, que perdeu a última eleição para Fernández.
Desde 14 de outubro não são divulgadas novas sondagens, porque a lei proíbe. Esse detalhe faz aumentar a incerteza sobre o resultado da disputa deste domingo, que deve ser conhecido por volta das 22h. Isso, naturalmente, se a apuração parcial dos votos mostrar uma tendência clara sobre quem vai para o segundo turno ou se um deles fizer mais de 45% dos votos. A outra hipótese para não haver segundo turno, pela legislação argentina, é o primeiro fazer mais de 40% dos votos e a distância para o segundo ficar acima de 10 pontos percentuais.
Em seu comício de encerramento da campanha, Milei lotou um estádio de futebol e passou o tempo todo falando em vencer na “primera vuelta”. Um vídeo em que mistura esse mantra com palavrões como “la puta que lo parió” viralizou na internet, compartilhado pelos apoiadores como fato positivo e pelos adversários com o alerta de que representa o despreparo do fenômeno eleitoral das primárias.
A estratégia de Massa é uma velha conhecida dos brasileiros: semear o medo. O peronista terminou a campanha alertando que se Milei for vencedor as políticas sociais serão abolidas e a pobreza, que hoje afeta 40% dos argentinos, vai aumentar. A ele o governo credita a disparada do dólar, que hoje vale mais de mil pesos na cotação oficial.
Patrícia se apresenta como alternativa entre o governo atual, que fracassou na tentativa de controlar a inflação, perdeu o controle da política monetária e fez o peso virar pó, e as ideias extravagantes de Milei.
Relembrando, o economista com pose de roqueiro quer dolarizar a economia, apesar de a Argentina não ter lastro e de experiência semelhante ter dado errado no governo de Carlos Menem. Ameaça, também, abandonar o Mercosul, diz que não vai negociar com o governo do presidente Lula e que romperá com a China, um dos poucos países que ainda concedem crédito à Argentina e um dos maiores compradores dos seus produtos.