O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Quando se fala em moda, as primeiras coisas que vêm na cabeça são os grande desfiles em Paris, as capas de revista famosas e os tapetes vermelhos em grande eventos hollywoodianos. Mas, se engana quem acha que a moda não pode se relacionar com a política. Ela pode influenciar na imagem que os políticos querem passar para o seu eleitorado.
— A moda é parte da cultura, é parte do comportamento, é o jeito que a gente se expressa. Então, é óbvio que ela está também ligada à política — explica a pesquisadora de Moda e Gênero, Thais Farage.
Ela explica que há estudos da antropologia que mostram que o jeito como as pessoas se vestem, acaba mudando o seu comportamento.
— Por exemplo: se você usa um sapato de salto muito alto, você anda diferente, senta diferente, adota outra postura. Quando um homem veste um terno, não está só comunicando para fora como ele está se mostrando para as pessoas. Também é como ele se sente vestindo o terno, como ele se comporta.
Dentre as mensagens em que a roupa acaba se comunicando com a população, há trajes que aproximam ou distanciam de determinados grupos. Contudo, Thais lembra que cada pessoa tem a sua característica e às vezes não é possível adotar qualquer estilo.
— A função da roupa não é fantasiar ninguém. Acho que é ajudar com que a comunicação seja feita do melhor jeito possível. A parte de uma estratégia não pode ser fake. Tem de fazer sentido com quem é a pessoa. Ninguém consegue carregar um negócio muito falso durante muito tempo.
Como o estilo mudou a política no passado
Conforme Thais, há casos que se pode elencar mudanças de estilos e que acabaram influenciando candidatos e a população. Um dos exemplos que lembra é o caso do presidente Lula na eleição de 2002.
— Ele passa a usar os ternos mais alinhados, faz uma barba mais certinha e isso muda a imagem e ajuda com que ele ganha a primeira eleição, sem sombra de dúvida. Acho que esse é um caso icônico no Brasil, porque acho que falamos muito pouco das roupas masculinas.
Thais lembra também de casos mais atuais, como o ex-presidente Jair Bolsonaro.
— Bolsonaro talvez tenha inaugurado um estilo mais despojado, com ternos mais largos, um tamanho não necessariamente ajustado e ele nunca foi criticado. Acho que todo mundo entendeu que isso era uma estratégia de aproximação popular. Sempre teve um pouco desse discurso "eu não sou político" e quando ele usa uma roupa que de fato destoa dos outros , ele reafirma isso.
Contudo, a pesquisadora também lembra que no caso do mundo político feminino essa relação é mais analisada pela população.
— Podemos falar, por exemplo, da trajetória da Marta Suplicy, o quanto foi atacada pelas roupas. Sempre foi chamada de perua. Sempre sofreu muito machismo, mas isso se manteve como uma característica importante de quem ela é.
Ela também afirma que atualmente, no caso das mulheres, há uma revolução na forma em que as mulheres estão se vestindo.
— As mulheres têm reivindicado mais autonomia no vestir. Acho que quando falamos de Brasil é impossível não citar Erika Hilton e Aniele Franco. Elas têm diretamente questionado essa ditadura. Aniele consegue colocar símbolos da própria cultura. A Erika Hilton também tem essa marca superfeminina que, de maneira geral, não é uma escolha que as mulheres costumam fazer e ela tá muito confortável nesse exercícios.
E como continua desenhando o presente
Thais acredita que atualmente o mundo está mudando rapidamente e a classe política ainda está um pouco perdida sobre como se portar.
— Todo mundo um pouco mais perdido e percebendo que as coisas precisam ser mudadas. Todo mundo percebeu a postura bolsonarista de roupas mais desgrenhadas para se aproximar das pessoas, o boné do Marçal o quanto que isso também tem funcionado. A camisa do Brasil virou símbolo da direita e o vermelho virou da esquerda. Percebemos como essas mudanças fazem diferença e todo mundo está um pouco patinando tentando encontrar quais são os seus símbolos.
Contudo, a pesquisadora também destaca exemplos atuais, como a utilização de tênis por candidatas no Brasil e nos Estados Unidos.
— Imagina uma mulher fazendo campanha, ela tem uma agenda extensa durante o dia, vai em comunidades, dá entrevistas. É muito natural que nesse momento do mundo as mulheres não topam mais estar desconfortáveis e o tênis de fato é uma solução excelente. A própria Kamala Harris é conhecida por usar All Star. Ela já fez a campanha de vice assim.
Também lembra de acessórios que políticos adotam para chamar a atenção do eleitorado e serem lembrados durante o pleito, como o boné de Marçal, em São Paulo.
— Os políticos têm buscado cada vez mais símbolos que representam, porque é um lugar fácil de reproduzir. Estamos vivendo um momento da economia de atenção, então toda vez que puder ter um símbolo que chame para conversar, isso ganha espaço, ganha atenção.
A pesquisadora acredita que a função da roupa, em geral, tem servido para gerar conversa, aproximação e pertencimento, podendo ser encarada como uma vantagem para os candidatos que souberem utilizar a ferramenta.
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