A resposta curta para a pergunta do título é: muito dificilmente.
Isso porque a decisão da Suprema Corte do Colorado que o impede Donald Trump concorrer no ano que vem vale apenas para aquele Estado. O ex-presidente irá recorrer à mais alta instância do país, a Suprema Corte do país, onde construiu, ao longo de seu mandato, uma maioria conservadora ao indicar três magistrados: Neil Gorsuch, Brett Kavanaugh e Amy Coney Barrett. Somados aos outros três, John Roberts, Clarence Thomas e Samuel Alito, indicados por George W. Bush, engrossam essa lista.
Os outros três juízes são Sonia Sotomayor e Elena Kagan, indicados por Barack Obama, e Ketanji Brown Jackson, por Joe Biden. Claro que não há alinhamento direto entre o voto pela cassação e a orientação ideológica dos juízes, mas é muito provável que eles derrubem a decisão do tribunal estadual. Caso eles mantenham a decisão do Colorado, aí sim, Trump não poderá concorrer.
Essa é a resposta curta. Quer entender mais? Segue o raciocínio.
Nos Estados Unidos, é muito difícil que um cidadão se torne inelegível. Não há um órgão centralizador, uma Justiça Eleitoral, como no Brasil. Além disso, não há, também como em nosso país, uma legislação, com a Lei da Ficha Limpa, que proíbe de concorrer pessoas condenadas, com mandato cassado ou tendo renunciado para evitar cassação. Assim, nem o fato de Trump ser o primeiro ex-presidente indiciado criminalmente da história americana - no caso da compra do silêncio da estrela do cinema pornô, Stormy Daniels - barra sua candidatura à reeleição no ano que vem.
Mas há uma exceção e é a ela que opositores se apegam para tentar barrar o ex-presidente de voltar ao Salão Oval. É a 14ª Emenda à Constituição, que proíbe que civis ou militares ocupem cargos públicos se tiverem se envolvido em insurreição ou rebelião. É um dos crimes mais graves contra a ordem democrática, no entendimento da Justiça americana.
É esse o argumento que baseia a decisão dos juízes do Colorado para impedir Trump de concorrer no Estado às primárias republicanas, previstas para março do ano que vem. A ação contra Trump foi apresentada pelo grupo Cidadãos pela Responsabilidade e Ética em Washington (Crew, na sigla em inglês).
Em dezembro do ano passado, o comitê da Câmara dos Deputados que investigou os ataques ao Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, recomendou que o Departamento de Justiça indicie Trump por "incentivar, assistir ou auxiliar" os atos daquele dia - interpretados como uma insurreição ou rebelião. Então presidente em fim de mandato e que havia sido derrotado por Biden, Trump incitou seus apoiadores a ocuparem Washington, conforme gravações e mensagens em redes sociais. Nos bastidores, tentou que seu vice, Mike Pence, que era também o presidente do Senado, responsável por ratificar o resultado do colégio eleitoral, no qual Biden vencera, não levasse adiante o processo.
O Colorado é um Estado com histórico conservador, mas candidatos democratas têm vencido lá nas últimas quatro eleições - 2008 e 2012 (Obama), 2016 (Hillary Clinton) e 2020 (Biden). Hoje, é um dos chamados "swing states", os Estados-pêndulo da disputa, ou seja, aqueles que ora votam em um partido, ora em outro.
Recorrer à 14ª Emenda parece ser a última estratégia dos críticos de Trump para tentar barrá-lo de disputar a eleição de novembro, na qual tem grandes chances de vencer. A decisão da Justiça do Colorado pode abrir precedente para outros tribunais fazerem o mesmo, ainda que, em Estados como New Hampshire, Michigan e Minnesota, ações desse tipo não tenham prosperado.