Em uma reviravolta, a COP28, em Dubai, entrou para a história como a primeira conferência climática das Nações Unidas que admite, em seu documento final, a necessidade de uma transição energética dos combustíveis fósseis para fontes de energia limpa.
O novo rascunho apresentado pela presidência da COP por volta das 7h da manhã no Oriente Médio (meia-noite, em Brasília) foi bem mais forte do que o esboço de segunda-feira (11), que gerou críticas de ambientalistas e de mais de cem governos, entre eles o do Brasil, por não citar como imperativa a eliminação do uso de recursos como petróleo, gás natural e carvão. O texto falava apenas em "redução gradual" - e, mesmo assim, como uma espécie de opção aos países. O documento foi aprovado pelas 198 nações presentes na COP28 em sessão plenária.
O texto apela por uma “transição, afastando-se dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de uma forma justa, ordenada e equitativa de modo a atingir o net zero até 2050, de acordo com a ciência”.
O documento não contém o termo "eliminação" (phase-out, em inglês, utilizado na conferência), como desejavam os ativistas e alguns países, como o Brasil e a União Europeia. A expressão usada é "transição, afastando-se" ("transitioning away from", mais especificamente, em inglês). Ainda que mais branda do que o "phase-out", ela vem acompanhada de um parágrafo que torna o texto mais empoderado, propondo que os países "contribuam com os esforços globais tomando ações".
Além de não citar eliminação dos combustíveis fósseis, o texto anterior abria um cardápio opções, o que foi entendido pelos críticos como apenas sugestões às nações sobre como lidar com as mudanças climáticas - algo que não dava a dimensão da urgência que o mundo está vivendo, com a intensificação dos eventos extremos, como tempestades, enxurradas e estiagens, por exemplo. O termo "poderia", que aparecia naquele rascunho dava a impressão de ser apenas um menu de opções para os governos lidarem com o aquecimento do planeta. Agora, o documento final traz um "apelo a todas as partes".
A divulgação de um texto mais frouxo, na segunda-feira (11), pode ter sido uma estratégia da presidência da COP28, exercida pelo país anfitrião, os Emirados Árabes Unidos. Como a régua estava muito baixa, agora, qualquer mudança pode ser vista como avanço. Ainda assim, quando se olha a história das conferência da ONU, essa será uma grande evolução, classificada por muitos como "o início do fim da era do petróleo".
A COP28 não tinha mandato para tratar sobre combustíveis fósseis. O tema foi ganhando destaque nos discursos dos chefes de Estado e de Governo, no dia 30, e devido a polêmicas, como o fato de os Emirados Árabes Unidos, um dos grandes produtores de petróleo do mundo, sediarem uma conferência climática - sem falar de seu presidente, Sultan Al Jaber, diretor da estatal petrolífera do país, a Abu Dhabi National Oil Company (Adnoc). O sucesso do evento internacional em seu país passou a ser medido pela régua de como os recursos fósseis seriam tratados (ou não) no documento final.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, comemorou o resultado do documento.
- O compromisso que estamos assumindo aqui redireciona nossas ambições, mas também nossas responsabilidades - afirmou. - Nossa próxima tarefa é alinhar os meios de implementação necessários assegurando fundamental premissa da transição justa. É fundamental que os países desenvolvidos tomem a dianteira na transição rumo ao fim dos combustíveis fósseis e assegurem os meios necessários para os países em desenvolvimento poderem implementar as ações de mitigação e adaptação.
O que está no documento
Estabelece o 1,5ºC com limite para a elevação da temperatura média do planeta na comparação com o período pré-Revolução Industrial.
Apela para "transição, afastando-se dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos, de uma forma justa, ordenada e equitativa".
Estabelece 2050 como prazo para neutralidade em carbono.
Insta os países para que "contribuam com os esforços globais tomando ações".
Fala em combustíveis de transição como essenciais e coloca gás natural como possibilidade. Embora seja um combustível fóssil, esse recurso é menos poluidor do que os demais.
Sugere triplicar a energia limpa e dobrar eficiência energética até 2030. Mas não quantifica. É apenas uma recomendação.
Reconhece que os custos das energias renováveis estão caindo rapidamente, o que pode ser entendido como uma recomendação para priorizá-las no lugar de outras tecnologias de baixo carbono.