Chego a um posto de combustível próximo a Re'im, no deserto de Neguev. Estamos a cerca de quatro quilômetros da fronteira com a Faixa de Gaza. Mesmo esticando o olhar, não se enxerga a cerca que separa Israel do território palestino e que foi violada no fatídico 7 de outubro. Faz 30ºC. A Oeste, é como se estivéssemos, em linha reta, aproximadamente na metade da Faixa de Gaza.
Um tanque Merkava, dos anos 1970, mas ainda hoje o principal blindado das Forças de Defesa de Israel, circula por uma estrada normalmente usada para o tráfego civil. Olho para a esquerda e percebo que o veículo é apenas o primeiro de uma fileira de blindados que se aproxima, todos com a bandeira de Israel tremulando no alto.
O posto de combustível é uma espécie de ponto de encontro de jornalistas, militares e civis que, por vezes, aparecem ali para doar pequenos presentes aos soldados — água, carregadores de bateria e snacks. É ali também, na loja de conveniência, que os reservistas se abastecem antes de ir para o front. Uma jovem soldado pede cigarro, abre o freezer para pegar um sorvete e leva consigo refrigerantes. Outro compra vários pacotes de salgadinhos. Fazem piada entre si, dão risada enquanto carregam, rumo ao caixa, o fuzil junto ao peito ou a tiracolo.
— Soube que o Brasil nos apoiou — diz um militar, ao me identificar como brasileiro pela bandeira no colete, enquanto abasteço o veículo.
Em duas horas e meia de carro desde Tel Aviv, é perceptível como o número de automóveis vai escasseando à medida que nos aproximamos de Gaza. Beersheba, a grande cidade do Sul, é uma espécie de fronteira. Dali, quase nenhum civil passa. Mais de 20 vilarejos da região foram evacuados.
De tempos em tempos, surgem imensos estacionamentos improvisados ao longo da rodovia. Os carros ocupam o acostamento e os terrenos de deserto nos arredores nas proximidades das bases. Os soldados chegam em seus veículos particulares a suas unidades e se alistam na hora. Dali, saem para o front. Os carros ficam.
O Negev, o deserto onde estamos, é estratégico para Israel porque serve de fronteira natural com o sul de Gaza, o Egito e a Jordânia. Do carro, observa-se, de tempos em tempos, quase mimetizados com a paisagem, acampamentos militares no descampado. Alguns kibutzim da região também estão sendo usados como base de apoio avançadas. Comunidades agrícolas, como parte do esforço de guerra, abrigam os soldados, que passam a utilizar a estrutura do local.
No posto, percebo dois caminhões transportando as carcaças de blindados incinerados. Provavelmente, foram destruídos no ataque do dia 7 de outubro.
Por questões de segurança, a maioria dos militares não gosta de aparecer em fotos. As imagens podem identificar a localização das unidades ou seus rostos podem se tornar conhecidos pelo Hamas. Alguns poucos aceitam conversar.
— Por enquanto, as missões são simples. O campo está cheio de baterias de canhões espalhadas. Para onde atira, quem a gente está ajudando, ninguém sabe. Damos um tiro a cada 10 ou 20 minutos — diz um deles, explicando como cada um sabe de forma fragmentada sua função na Operação Espada de Ferro, como o governo denominou a resposta aos atentados terroristas.
Nas entrevistas, a história de 7 de outubro é tristemente a mesma: os soldados foram acordados por sirenes ou alertas em seus telefones. Correram para suas unidades, pois muitos estavam em casa durante um feriado. Muitos tiveram de viajar para as áreas ao redor da Faixa de Gaza nos próprios carros e entraram em ação de forma fragmentada, sem um esforço coordenado.
Os terroristas atacaram instalações militares desde o início, cegando os sensores de alta tecnologia de Israel por meio de drones, matando comandantes e invadindo bases como a de Sderot. Quando as unidades de reação rápida chegavam, muitas vezes eram superadas em número pelos inimigos. Os combates duraram mais de 40 horas — e até a quarta-feira , as forças israelenses admitiam ainda que poderia haver extremistas infiltrados no território do país.
Nas conversas com soldados de numerosas unidades, há um sentimento de confiança de que Israel vencerá este conflito.
— O exército está pronto. Agora, podemos dar um tiro leve, cumprir missões pequenas, mas amanhã podem ser missões muito maiores — diz um soldado.
Israel segue em grande parte a cartilha de conflitos anteriores contra o Hamas — tentar isolar Gaza e conduzir ataques generalizados. Mas a promessa do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é de eliminar de vez o grupo. Nesta quinta-feira (19), em visita às tropas, o ministro da Defesa, Yoav Galant, prometeu que seus soldados conhecerão "Gaza por dentro", o que reavivou a expectativa de uma incursão terrestre.
— Toda a força do exército sempre tem um plano B, C, D, e até o Z. A partir do momento que o plano A for comprometido, eles irão para o plano B e assim por diante — diz outro militar, usando a expressão em hebraico "cofre de planos" como metáfora.