Morador de Porto Alegre, Rubens Golandski, 31 anos, vive em Israel desde 2009. Conquistou a cidadania israelense em 2012. Serviu às Forças de Defesa de Israel, participou de três operações militares, mas, agora, enfrenta sua primeira guerra.
Atualmente, Golandski trabalha na segurança da empresa de trem em Tel aviv. Como outros 300 mil reservistas, foi chamado pelo governo para a guerra. Da fronteira com a Faixa de Gaza, ele conversou com GZH, falando do orgulho de ajudar a proteger o país. Leia os principais trechos.
Como você soube da convocação?
Eu via que todos os meus amigos estavam sendo convocados. Fui verificar meu status, e eu estava na reserva da reserva. Só seria convocado nas próximas três levas. Conheço a galera do pelotão, o capitão do batalhão foi meu tenente na época de exército, conheço praticamente todo mundo. Consegui as permissões e vim direto para cá. Cheguei aqui não fazem nem três dias.
Por que você queria ficar na primeira leva?
Em Israel, quando você entra na reserva, fica como soldado da ativa, só que vens de treinar uma ou duas vezes por ano. Uma vez por ano você fica um mês em alguma fronteira do país. Quando saí do exército, fui ao Brasil ver minha família. Fiquei dois anos e meio no Brasil. Daí, viram que eu não estava participando dos treinamentos.
Você realmente queria estar aí?
Claro! Eu quis estar aqui. A questão é que, se eu esperasse a convocação oficial, provavelmente seria colocado em outras regiões do exército. Sou sargento da artilharia. Aqui, estou como ajudante de sargento. Faço todas as funções do canhão e, na falta do sargento, sou o substituto. Estou em campo fazendo o que tiver de fazer: carregador, ajudo a fazer as munições. A artilharia é muito importante em Israel. Nas guerras, além da infantaria, a artilharia e os tanquistas são os que mais estão em campo. Em épocas de guerra, os que mais trabalham atirando na Faixa de Gaza são a artilharia e a força aérea.
Que tipo de armamento você usa?
É um canhão de 150 milímetros, que foi usado na Guerra do Vietnã. Ele foi trazido para Israel desde as primeiras guerras, depois da independência. E Israel usava antigamente aqueles canhões "d", d-120, d-150, normalmente carregados por tratores. Agora, a gente trocou. Quem olhar de longe, acha que é tanque de guerra, porque, na parte debaixo, há a lagarta.
Essa é a sua primeira guerra?
É a primeira guerra oficial e a quarta operação militar. Na época do exército, peguei a de 2013, como recruta, em 2014 participei como sargento, e, em 2015, teve mais uma operação. Em 2016, saí do exército. Essa aqui é primeira guerra oficial, declarada. A última guerra que Israel havia declarado tinha sido 2006, a segunda Guerra do Líbano. Essa aqui, oficialmente, é a primeira guerra.
Como você está se sentindo?
Estou bem. Era uma época muito difícil em Israel, politicamente falando. Infelizmente, essa polarização chegou aqui também. Então, o povo daqui começou uma discussão política muito grande. O lado ruim da guerra são os mortos e feridos. Nessa guerra, houve um ataque surpresa, ainda não se sabe como foi possível ocorrer. Mas, como se fala em hebraico: "O que foi, foi..." O importante é o presente. O que foi não tem como mudar. O presente e o futuro há como tentar mudar. Por um lado, a gente está em guerra e isso é muito ruim. Por outro, o povo está muito unido. Isso uniu o povo. Moro em Israel desde 2009, mas só fui entender o que significa realmente morar em Israel depois que saí do exército, quando comecei a trabalhar, a pagar minhas contas, a falar o idioma da maneira correta. O cara só começa a entender o que é Israel depois de oito, 10 anos aqui.
Você já avisou sua família no Rio Grande do Sul de que está no front?
Avisei minha irmã. Minha mãe demorou um pouco para saber. Ligo para elas todos os dias, converso. O cara fica apreensivo. Fica meio que com medo do que possa acontecer. Mas é uma sensação de pertencer a um povo, de fazer parte do exército, é quase uma obrigação moral de vir aqui para proteger as pessoas. O sentimento é de coragem e de determinação, de realmente estar pronto para o que der e vier. Por isso, fiz de tudo para vir para cá, para onde estou, onde me sinto mais profissional, onde posso dar 100%.
Neste momento, ajudando Israel, você se sente realmente cidadão, diante de tudo o que ocorreu?
Exato. Não tem como descrever. Só Israel tem isso. Você pode ir para os EUA, viver o típico sonho americano: você trabalha, mas não vai se sentir pertencente ao povo. Será mais um brasileiro que mora nos EUA. A sensação de pertencer a um povo, nenhum outro país tem. Vir aqui a ponto de querer arriscar sua vida para defender a terra que não é nem sua... Sou um brasileiro que mora aqui. É uma sensação de pertencer a um povo. E quando falo isso não é com base religiosa. Nao faço isso porque Deus mandou ou pediu. Não acredito nisso. É uma base de pertencimento, união, amor à pátria, à bandeira. Quando a gente vê um judeu nessa situação é como se fosse um irmão. Essa é a sensação. No Brasil, as únicas pessoas que têm essa sensação são as pessoas que têm um clubes de futebol, gremistas "doentes". Mas nem se compara, é questão de pertencer a um povo.
Como tem sido a sua rotina?
Sou da artilharia do exército. Fora as armas normais que a gente usa, também usamos os canhões. Nossa rotina é em volta dos canhões. Tem a parte de guerra, de combate, e a parte do dia a dia. No dia a dia, arrumamos as munições, deixamos tudo certinho de acordo com os lotes, os tipos e números. A gente conserta os canhões, tudo o que tem de ser feito em relação a motor, óleo, gasolina, deixa 100%. Ficamos no campo 24 horas. Todo mundo conhece a artilharia como as "raposas do deserto". Realmente, a gente chegou aqui desde o primeiro dia. O relato dos meus amigos, aqueles que chegaram primeiro, é de quando ainda havia inimigos no campo. Não posso falar onde estamos. Mas estou em frente a um dos lugares mais atingidos (pelos ataques terroristas) de Israel. Estou a poucos metros dessa comunidade, que muito foi afetada. Estou a poucos quilômetros de uma base onde praticamente todos os soldados morreram. Quando chegaram aqui, os relatos que me foram dados é de que metade do pelotão estava fechado, trabalhando como uma infantaria, guardando o acampamento para qualquer ataque surpresa, de algum terrorista que estivesse ainda em campo. O resto estava atirando quantidades absurdas em direção à Faixa de Gaza, dando apoio à artilharia e apoio às forças que estavam na frente, cuidando da parte da abertura da fronteira. Estou a cinco quilômetros de uma das principais aberturas da (cerca) da fronteira. A 300 metros daqui mataram um inimigo que estava tentando se camuflar com a cor do chão.
Caso venha a ordem política para entrar em Gaza, você está preparado?
Não posso dar detalhes, mas aqui onde eu estou há muita força. Realmente, nunca vi tanta gente reunida em um lugar. A gente tem equipamentos no próprio canhão, tecnologia pela qual a gente consegue ter noção das coisas que estão acontecendo ao nosso redor. Tu deves ter escutado alguns "bum" ao fundo durante nossa conversa (barulhos de explosão foram ouvidos em meio à entrevista). Estamos prontos para o que der e vier. A artilharia é a "raposa do deserto". Se mandarem a gente ficar aqui três, quatro, cinco meses, estaremos prontos. Tem comida, água, equipamento. Há uma parte que falo com orgulho: é uma das melhores logísticas. Ontem (terça-feira), teve um ataque muito forte contra o centro do país. Muitos dos mísseis que foram para Tel Aviv passaram por cima da minha cabeça. Eu os vi passando. A gente está em prontidão máxima. É um telefonema, uma ordem para atirar, e a gente está pronto para quantas balas de canhão forem necessárias.