Os primeiros cem dias de governo Lula tiveram ameaça golpista, revogação de medidas do ex-presidente Jair Bolsonaro e uma política externa voltada à reconstrução de pontes.
No plano econômico, o arcabouço fiscal está prestes a ser enviado ao Congresso, e a reforma fiscal se aproxima como o grande próximo desafio. A seguir, a coluna avalia 10 pontos sobre o período.
1 BOLAS FORAS
Em muitos momentos, Lula esqueceu que a eleição terminou e, ainda no palanque, soltou sua verborragia. Em entrevista ao site 247, ignorou a liturgia do cargo e disse que, na prisão, só pensava em "foder com o Moro". No dia seguinte, sugeriu que o plano para matar o ex-juiz e senador, descoberto pela Polícia Federal, seria uma armação.
2 FIXAÇÃO
O presidente elegeu Roberto Campos Neto o "inimigo do povo". Raras foram as semanas em que Lula não criticou o presidente do Banco Central, a quem atribui a responsabilidade pela alta taxa de juro - segundo o presidente, culpada por boa parte dos males do país.
3 CATARSE
Os atos golpistas do dia 8 foram o maior teste de estresse da democracia brasileira desde 1964. Lula acelerou a "desbolsonarização" do governo, em particular no Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Em relação às Forças Armadas, vem apostando em um dueto - respeito às instituições e aceno com verbas -, tendo o ministro da Defesa, Múcio Monteiro, como o grande "pacificador".
4 POLÍTICA EXTERNA
Lula vem cumprindo a promessa de reposicionar o país como partícipe do cenário internacional. Um dos lemas dos primeiros cem dias é "O Brasil voltou". O presidente apostou primeiro em reconstruir pontes com os vizinhos, Argentina e Uruguai. Depois, visitou o principal aliado político no continente, os Estados Unidos. Agora, corteja o maior parceiro comercial, a China. As ambições passam por peso geopolítico e busca por investimentos.
5 NORMALIDADE
Apesar da polarização política, que segue, e de muitas vezes o presidente utilizar a tática de manter o país cindido, há, em Brasília, um clima de retorno à normalidade política: o governo concede entrevistas a jornalistas, presta esclarecimentos à opinião pública e recebe diferentes setores da sociedade para diálogo.
6 COSTURA
Ainda pairam dúvidas sobre a eficiência da nova regra fiscal, mas a negociação feita pelo ministro Fernando Haddad, da Fazenda, foi um arranjo político que permitiu aos principais atores - PT e aliados, boa parte do Congresso e mercado - uma deglutição, sem maiores problemas, do projeto.
7 DESAFIO
Ainda que se imagine debates sobre o arcabouço fiscal, que podem, no Congresso, desconfigurar o plano inicial, o próprio governo admite que o maior desafio será a reforma fiscal, prevista para o segundo semestre.
8 PRATELEIRA
Boa parte dos projetos apresentados nos primeiros cem dias foram versões reeditadas de iniciativas de governos petistas anteriores que Lula acredita terem dado certo, como o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida e o Mais Médicos. Com ajustes.
9 REVOGAÇÃO
Os primeiros cem dias também foram marcados por uma estratégia do governo de anular o máximo possível de medidas adotadas por Jair Bolsonaro, como o decreto que permitia garimpo em terras indígenas, atos que davam andamento a privatizações e suspensão de registro de novos armamentos para Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs), entre outras.
10 CALCANHAR DE AQUILES
Dois ministros do União Brasil, Juscelino Filho, das Comunicações, e Daniela Carneiro, do Turismo, foram responsáveis pelas primeiras crises: o primeiro pelas viagens em aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) e diárias para assuntos pessoais, além da suspeita de uso do orçamento secreto para questões privadas; a segunda por relações com milicianos no Rio de Janeiro. Lula aceitou as explicações dos subordinados e não considera as denúncias suficientemente graves para demiti-los.