Sai de cena Bill de Blasio, que, em várias ocasiões cutucou o presidente Jair Bolsonaro. Entra Eric Adams, segundo prefeito negro de Nova York, eleito na terça-feira (2). E a mais cosmopolita das metrópoles mundiais segue nas mãos dos democratas.
De Blasio, que deixará o Executivo em 1º de janeiro, virou uma espécie de algoz de Bolsonaro nos Estados Unidos, em parte porque o brasileiro emulava o republicano Donald Trump, seu arqui-inimigo, em parte porque as atitudes do presidente brasileiro contradizem a cartilha da boa convivência em fóruns internacionais.
Para ficarmos nas mais famosas críticas, o democrata ironizou Bolsonaro em sua conta no Twitter, com um link apontando os locais de vacinação contra o coronavírus, às vésperas de sua chegada para a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) este ano. Em entrevista coletiva, afirmou:
- Precisamos mandar uma mensagem a todos os líderes mundiais, principalmente a Bolsonaro, do Brasil, de que se você pretende vir aqui, precisa ser vacinado. Se você não quer ser vacinado, não se incomode em vir, porque todos devem estar seguros juntos.
As críticas não são de agora. Em maio de 2019, Bill de Blasio comemorou a desistência do presidente brasileiro de participar de um evento em Nova York no qual seria homenageado como Personalidade do Ano da Câmara de Comércio Brasil-EUA. No Twitter, o prefeito disse: "Jair Bolsonaro acabou de aprender, da maneira mais difícil, que os nova-iorquinos não fecham os olhos para o opressão. Nós denunciamos sua intolerância. Ele fugiu. Não é uma surpresa - os valentões não aguentam um soco. Bolsonaro, seu ódio não é bem-vindo aqui".
No cargo desde 2013, quando rompeu duas décadas de ausência da legenda do comando da maior cidade americana, De Blasio pertence à ala mais à esquerda do Partido Democrata - embora seja criticado por esse grupo por ter feito pouco para cumprir promessas em relação aos mais pobres e imigrantes. Os conservadores não perdoam seu apoio ao movimento sandinista, na Nicarágua, no passado - aos 26 anos, chegou a viajar ao país centro-americano para ajudar a distribuir comida e medicamentos, durante o conflito entre a guerrilha e os chamados Contras, resistência armada apoiada pelo governo do então presidente americano Ronald Reagan (republicano).
Eric Adams, que assumirá a prefeitura em 1º de janeiro, está posicionado mais ao centro do partido e, de certa forma, guarda semelhanças com Bolsonaro. Não é incomum criticar o parceiro de partido e atual prefeito. Pragmatismo, para ele. Traição para os aliados de De Blasio, já que o prefeito atual apoiou o correligionário. Sua performance com os aliados diz muito sobre como Adams construiu sua trajetória: ele chegou a se registrar como republicano em 1997, apresenta-se como "machão", que não leva desaforo para casa, algo que ajuda a compreender o saco de gatos ideológico do partido. Nascido no Brooklyn, onde é atual subprefeito, está filiado aos democratas desde 2001. Em 2006, ele foi eleito para o Senado estadual. Para chegar ao comando da cidade na terça-feira (2), aglutinou uma coalizão diversa de eleitores, da conservadora e branca Staten Island, com apoio da elite do setor imobiliário, a bairros com predominância de latinos e negros, como Queens e Bronx. Tem sido pouco transparente com relação a sua vida pessoal: midiático, parece mais preocupado com a versão de sua história do que com dados empíricos. Como ex-capitão da polícia de Nova York, focou a campanha na segurança pública (o que guarda alguma semelhança com Bolsonaro), prometendo combater a criminalidade de forma mais contundente. A cidade, que já viveu a política de tolerância zero de Rudolph Giuliani (republicano), volta a testemunhar o aumento dos crimes violentos pela primeira vez em três décadas.