No maravilhoso filme "O Informante" ("The Insider", com Al Pacino), há um diálogo épico para os adeptos do bom jornalismo.
Don Hewitt, editor-chefe do programa "60 Minutos", que preferiu proteger os interesses da CBS em detrimento da defesa do interesse público, afirma que todo o imbróglio envolvendo a omissão da emissora de TV em um caso de saúde pública (assista ao filme, não darei spoiler) será esquecido em 15 minutos. Ao que o âncora do programa, Mike Wallace, retruca:
- Não, isso acontece com a fama. Você tem 15 minutos de fama. A infâmia dura um pouco mais.
Donald Rumsfeld, que morreu na quarta-feira (30) aos 88 anos, deveria ter aprendido essa lição. Ele trabalhou com quatro presidentes, foi embaixador na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), no governo de Richard Nixon, depois, chefe de Gabinete da Casa Branca de Gerald Ford e secretário de Defesa de Ronald Reagan. Fez fortuna como executivo de empresas farmacêuticas, eletrônicas e de biotecnologia, era descrito como perspicaz e inteligente, tinha planos de modernizar o aparato militar americano e enxugar a burocracia do Pentágono. Mas seu nome ficará para sempre registrado no hall da infâmia de Washington pelo último trabalho no serviço público americano: sua segunda passagem pela Defesa, no governo George W. Bush, quando, junto com o vice-presidente Dick Cheney, e outros falcões arquitetou a invasão do Iraque, uma guerra que custou US$ 700 bilhões e cobrou a vida de 4,4 mil militares dos EUA (sobre baixas iraquianas, entre civis e soldados, é praticamente impossível definir algum número confiável, mas estão na casa dos milhares).
O conflito no Afeganistão para derrubar o Talibã e desentocar Osama bin Laden das montanhas de Tora-Bora, também foi uma missão cumprida por Rumsfeld, em resposta ao horror do 11 de setembro de 2001. Essa campanha era legítima e ganhou o apoio da maioria dos países da comunidade internacional. Mas estender a Guerra ao Terror ao Iraque, suposto integrante de um "eixo do mal" (com Irã e Coreia do Norte), narrativa construída por Rumsfeld e cia, era meramente a continuidade de um plano de mudança de regime que tinha como interesse real o controle do ritmo da produção de petróleo naquele naco de terra do Oriente Médio.
E assim foi organizada a invasão do Iraque, baseada em alegações falsas de que Saddam Hussein dispunha de armas de destruição em massa nunca encontradas. Quase 20 anos depois, o país ainda não está pacificado - e não se pode nem considerar que a guerra, que Rumsfeld certa vez previu que não duraria mais do que cinco meses, acabou. O atoleiro segue, ainda há militares americanos no terreno, e a cada mês, o conflito sectário, herança da aventura de Rumsfeld, Bush e Cheney, ceifa vidas de civis iraquianos em atentados terroristas.
A infâmia, como diria Wallace, dura um pouco mais do que 15 minutos.