A sexta-feira (10) foi emblemática para a história das Nações Unidas e nesta esquina difícil da História que estamos atravessando com a pandemia. Maior autoridade da Organização Mundial da Saúde (OMS, órgão ligado à ONU), Tedros Adhanom Ghebreyesus chorou ao fazer um apelo ao mundo.
- A grande ameaça que enfrentamos agora não é o vírus em si, mas a ameaça é a falta de liderança e solidariedade em níveis globais e nacionais - disse, em Genebra.
- Esta é uma tragédia que... na verdade... está nos fazendo sentir falta de nossos amigos. Perdendo vidas... E não podemos enfrentar essa pandemia com um mundo dividido - acrescentou, para, em seguida, questionar:
- Por que é tão difícil para os humanos se unirem, para lutar contra o inimigo:
Entendo a emoção de Tedros, biólogo por formação, pesquisador reconhecido internacionalmente, doutor em saúde comunitária, chefe da maior autoridade sanitária do mundo, aquele que, pela profissão e pelo cargo que ocupa, deveria contribuir para trazer a solução para as dores do corpo da humanidade por meio da resposta da ciência. Está no limite. Sob intensa pressão - e desconfiança de alguns -, a OMS enfrenta o maior desafio de sua história. Não só pela pandemia, a maior em um século, mas pelo descrédito na organização, mensagem difundida por governos que questionam sua atuação. Os Estados Unidos do governo Donald Trump, por exemplo, deram início à retirada do organismo, o que, como já comentei aqui, tem um aspecto simbólico, de erosão do sistema multilateral erguido com liderança dos próprios americanos no pós-Segunda Guerra Mundial, e pelo aspecto prático - a perda de boa parte da receita, fundamental para programas internacionais liderados pela OMS nos grotões do mundo, em geral locais esquecidos pela maior parte dos governos.
Tedros é um homem forjado no sistema ONU, que desde 1948 conseguiu evitar uma nova guerra de proporções globais, mas, diante da pandemia, reage de forma lenta, por suas próprias limitações. A OMS é acusada de ter sido negligente - e por vezes permissiva demais - diante da China, que até hoje não deu explicações claras sobre a origem do vírus. A entidade coordena um esforço mundial de colaboração entre pesquisadores para que se encontre um tratamento ou uma vacina, mas a demora impacienta governos e populações.
A pandemia não dá trégua, mas é preciso ser confiante. Há sinais otimistas: nações que encararam a crise sem véus de ceticismo com relação à ciência estão reabrindo sua economia. A Europa dá sinais positivos. Em nível global, nos últimos dias, foram 170 mil casos novos confirmados de covid-19, uma queda em relação aos 200 mil do fim da semana anterior.
É difícil liderar nações em meio a polarizações. Imagine-se coordenar esforços globais diante de tantos interesses. A OMS sempre saiu criticada de crises epidêmicas - foi assim no H1N1 e, depois, no ebola. Será assim com o coronavírus. Nunca solidariedade e liderança foram coisas tão difíceis de alcançar e manter - e são a base da ordem internacional construída depois do conflito de 1945. Mas talvez nunca, desde então, sejam tão necessárias.