A menos de um ano da eleição em que buscará o segundo mandato, o presidente Donald Trump jogou sua mais alta cartada em política externa em três anos de governo ao ordenar a eliminação do major-general Qassem Soleimani, número 2 do regime iraniano e um dos cérebros da busca dos aiatolás pela hegemonia do Oriente Médio. Por tabela, o americano colocou em risco aliados dos Estados Unidos na região e na Europa.
A “vingança severa” prometida pelo Irã virá cedo ou tarde. A incerteza sobre que tipo de resposta será essa é o que mais provoca temor.
Quatro cenários são possíveis: o primeiro deles consistiria em o Irã lançar mão de sua rede de grupos, milícias e organizações espalhadas por países da região para atacar cidades em Israel e na Arábia Saudita, principais parceiros americanos na vizinhança. Células do libanês Hezbollah e do palestino Hamas conseguiriam executar com rapidez atentados nessas nações sem grande investimento financeiro ou logístico. Na avaliação dos aiatolás, o Hezbollah, um partido político legalizado no Líbano, mas, na prática um Estado dentro do Estado e uma organização terrorista, deu tão certo como método de exercer influência externa, que o próprio Soleimani era responsável nos últimos anos por criar milícias semelhantes no Iraque, na Síria e no Iêmen. Esses grupos ainda estão longe de representarem a força política e militar que a milícia libanesa dispõe, mas já exibem poder de fogo considerável.
Não está claro se o Irã responderá de forma imediata ou se levará dias. Isso nos leva a uma segunda hipótese: como forma de abalar o mercado do petróleo, o país pode coordenar ataques contra petroleiros no Estreito de Ormuz, único acesso ao Golfo Pérsico por mar, local estratégico por onde passa um quinto da produção mundial do combustível. Ações de sabotagem que levassem ao fechamento da passagem provocariam danos à economia global.
Não seria novidade. Em 2019, o Irã atacou vários navios nas costas da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos. Também é suspeito de estar por trás da ação com drones contra instalações petrolíferas sauditas.
A terceira opção seria a temida regionalização do conflito, com ataques diretos de suas forças armadas ou pelas mãos do Hezbollah a Israel e Arábia Saudita — o que levaria a uma reação armada desses países e ao envolvimento externo de Estados Unidos e Rússia. Os mais alarmistas veem nessa possibilidade a eclosão de uma III Guerra Mundial em razão do jogo de alianças.
A quarta hipótese seria a escolha de alvos em cidades europeias ou americanas. Na sexta-feira, o prefeito da traumatizada Nova York, Bill de Blasio, ordenou à polícia que permaneça "vigilante" e proteja instalações-chave da metrópole "diante de qualquer tentativa do Irã e de seus aliados terroristas de adotar represálias contra os EUA".
A Casa Branca argumenta que a eliminação do general Suleimani tem o objetivo de interromper uma guerra, e não de começar uma. Segundo o governo, o comandante iraniano estava planejando ataques iminentes aos americanos. A curto prazo, até pode ser verdade. Mas, com potencial de escancarar a caixa de horrores do Oriente Médio, a médio e longo prazos, o mundo ficou menos seguro desde que Trump decidiu apertar o botão da guerra.