James Mattis, fuzileiro naval conhecido entre os colegas de farda como "Cachorro Louco" (Mad Dog), é o último da tríade de generais a apear da Casa Branca trumpiana. Antes, John Kelly, chefe de Gabinete, e H. R. McMaster, assessor de Segurança Nacional, já haviam deixado o governo.
Forjados na dureza do front e adeptos do rigor estratégico antes de qualquer missão, os altos oficiais americanos que se juntaram à administração Donald Trump em janeiro de 2017 não aguentaram o comandante-em-chefe temperamental, que costuma tomar decisões sem consultá-los, anunciando-as à nação pelo Twitter antes mesmo de informar seus assessores.
As divergências entre Mattis e Trump são antigas. Há meses havia rumores de sua saída. Mas o anúncio da retirada dos cerca de 2 mil soldados dos EUA do território da Síria, feito por Trump na quarta-feira, foi a gota d'água para o general, ex-comandante da 1ª Divisão dos marines no conflito do Iraque. O militar provavelmente já havia escrito sua carta de renúncia e a encaminhado ao Salão Oval antes mesmo do segundo petardo explodir sobre os falcões da Casa Branca: a decisão do presidente, ventilada na noite de quinta-feira, de reduzir pela metade a presença militar no Afeganistão.
Não é preciso ter o conhecimento de Mattis e sua experiência para compreender o tamanho do erro estratégico americano de recuar no campo de batalha asiático: retirar tropas da Síria e do Afeganistão significa abrir o flanco para tradicionais inimigos dos Estados Unidos, entregando o Oriente Médio em uma bandeja para a Rússia.
Mais: a saída abre o flanco para o expansionismo da influência do Irã xiita e dá aos terroristas do Estado Islâmico e ao Talibã o gostinho de que colocaram o "Grande Satã" para correr. Efeito colateral: a sensação de que os EUA abandonam aliados, como Israel e Arábia Saudita, e deixam os curdos vulneráveis à mão de ferro do sultão turco Recep Tayyip Erdogan.
Esses são os temores imediatos em Washington, em especial do próprio Partido Republicano, sobre os impactos da saída americana no Oriente Médio. Para o mundo, há outros temores. A permanência de Mattis, depois da saída dos generais John Kelly e H. R. McMaster e do ex-secretário de Estado Rex Tillerson, davam a sensação de que alguém com a cabeça no lugar havia ficado no Situation Room (a "sala de situação" da Casa Branca, onde são tomadas — ou eram até Trump — as principais decisões que afetam os EUA e o planeta).
A ponderação dos generais já freou um conflito entre os EUA e a China no explosivo Mar do Sul da China, mantinha a Rússia a uma distância tolerável e evitava o colapso no Oriente Médio e possíveis crises globais.
— Há muita preocupação, como nunca vi em toda a minha vida — disse Adam Kinzinger, político republicano de Illinois à rede CNN.
No Twitter, o senador e estrela da nova geração do partido Marco Rubio advertiu que a carta de demissão de Mattis deixou "muito claro que estamos caminhando para uma série de graves erros de política que colocarão em risco nossa nação, prejudicarão nossas alianças e fortalecerão nossos adversários".
Os mais temerosos afirmam que a retirada das tropas abre caminho para um novo 11 de Setembro.
A sensação na Avenida Pensilvânia, 1.600, o endereço da Casa Branca, em Washington, é incertezas. O último a sair apaga a luz.